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    Heitor Scalambrini Costa

    Professor da Universidade Federal de Pernambuco

    30 artigos

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    Celpe: Prêmio a ineficiência

    Nas tarifas elétricas neste ano os consumidores já tiveram dois reajustes para aumentar o caixa das concessionárias. O primeiro referente às bandeiras tarifárias, e o segundo o reajuste extraordinário concedido pela Aneel. E agora, no caso da Celpe, novo

    Nas tarifas elétricas neste ano os consumidores já tiveram dois reajustes para aumentar o caixa das concessionárias. O primeiro referente às bandeiras tarifárias, e o segundo o reajuste extraordinário concedido pela Aneel. E agora, no caso da Celpe, novo (Foto: Heitor Scalambrini Costa)

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    O esperado aconteceu. Mais uma vez as empresas distribuidoras de energia elétrica conseguiram o que desejavam. A Diretoria da Agencia Nacional de Energia Elétrica (Aneel) deliberou a Revisão Tarifária Extraordinária (RTE) de 58 concessionárias de distribuição (27/2). O efeito médio que incidirá nas contas de energia será de 23,4%, e os índices definidos para cada distribuidora estão valendo desde o primeiro dia útil de março (2/3). Também as bandeiras tarifárias criadas para aumentar as receitas das distribuidoras tiveram um aumento considerável em seus valores. No caso da bandeira vermelha, que valerá ao longo de 2015, passou de R$ 3,00 para R$ 5,50 para cada 100 kWh/mês consumido. Um aumento de 83%.

    Já é de praxe o posicionamento sistemático da Aneel, autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia, em defender os interesses das distribuidoras. A finalidade da Agência seria a de regular e fiscalizar a geração, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica segundo a legislação e as diretrizes do governo Federal. Mas o que se verifica é uma relação promiscua entre esta Agencia e as distribuidoras, que vem de longa data e já tem sido amplamente divulgada na imprensa.

    Em nome de clausulas draconianas existentes nos contratos de concessão, os famigerados contratos de privatização, se inaugurou no Brasil, na área de energia, o capitalismo sem risco. As empresas nunca perdem, ao contrário dos consumidores e da população. Em nome do equilíbrio econômico-financeiro das empresas, tudo é “legal”, dentro das normas impostas em gabinetes fechados. Para reativar a memória, tais contratos foram supervisionados/redigidos na Advocacia- Geral da União no Governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), sendo seu titular o jurista e magistrado Gilmar Mendes. Tais contratos, considerados “juridicamente perfeitos”, significam que mesmo o consumidor ganhando em instâncias inferiores, a reclamação ou a causa contra as distribuidoras, ao chegar ao Supremo Tribunal Federal, são derrotados, sendo sempre dado ganho de causa às empresas distribuidoras.

    O que chama a atenção e causa indignação nestes aumentos nas tarifas elétricas é o contrassenso. Nos últimos anos a qualidade dos serviços de distribuição vem se deteriorando. Os indicadores de continuidade, nos seus aspectos de duração equivalente de interrupção por unidade consumidora (DEC- indica o número de horas em média que um consumidor fica sem energia elétrica durante um período, geralmente o mês ou o ano) e frequência equivalente de interrupção por unidade consumidora (FEC- indica quantas vezes, em média, houve interrupção na unidade consumidora), estabelecidos pela própria Agência mostram claramente a deterioração da qualidade dos serviços oferecidos.  

    Como exemplo ilustrativo, vejamos o caso da Companhia Energética de Pernambuco (Celpe), que detém a concessão para distribuição de energia elétrica em todos os municípios do Estado de Pernambuco, regulado pelo Contrato de Concessão n° 26, firmado em 30 de março de 2000, com vigência até 30 de março de 2030. O Grupo Neoenergia, na distribuição de energia, controla as distribuidoras Coelba (Bahia) e Cosern (Rio Grande do Norte), além da própria Celpe (Pernambuco).

    Desde o ano de 2000 é publicado o Índice Aneel de Satisfação do Consumidor – IASC, resultado de pesquisa junto ao consumidor residencial que a Agência realiza todo ano, para avaliar o grau de satisfação dos consumidores residenciais com os serviços prestados pelas distribuidoras de energia elétrica. A pesquisa abrange a área de concessão das distribuidoras no País, sendo realizadas em torno de 19.500 entrevistas.

    Na tabela abaixo é mostrada a evolução desde o ano 2000, o IASC da Celpe, da média das distribuidoras no Brasil, e como referencia internacional, comparado com o valor médio das empresas distribuidoras de energia elétrica dos Estados Unidos da América (EUA).

    Ano

    2000

    2001

    2002

    2003

    2004

    2005

    2006

    2007

    2008

    2009

    2010

    20111

    2012

    2013

    20142

    Celpe

    62,2

    62,6

    65,5

    65,4

    60,9

    55,3

    61,5

    61,7

    65,3

    64,3

    63,4

    ---

    61,7

    53,9

    57,4

    Brasil

    62,8

    62,2

    64,5

    63,6

    58,9

    61,4

    60,5

    65,4

    62,6

    66,7

    64,4

    ---

    61,5

    60,4

    67,7

    EUA

    ---

    ---

    69,0

    73,0

    72,0

    73,0

    72,0

    73,0

    74,0

    74,0

    74,0

    ---

    76,7

    77,4

    76,0

     

    Fonte: Agencia Nacional de Energia Elétrica (Aneel)
    Resultado do IASC não foi divulgado.       2 Relatório divulgado em novembro.

    A tabela mostra que na opinião dos consumidores não houve uma crescente satisfação com relação a qualidade do serviço. As promessas da privatização em relação à melhoria da qualidade dos serviços não foram alcançadas, pelo contrário, os serviços prestados, conforme este índice se deteriorou ao longo dos últimos 14 anos. E se compararmos com os EUA ai sim fica mais evidente a baixa qualidade do serviço elétrico prestado ao povo pernambucano.

    O ranking da continuidade do serviço elétrico fornecido pelas distribuidoras, elaborado pela Agencia Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) é publicado anualmente desde 2011, constituindo um instrumento que deveria incentivar as concessionárias a buscarem a melhoria contínua da qualidade do serviço oferecido aos seus consumidores.

    Na tabela a seguir são apresentados os valores dos índices DEC e FEC, apurados e estipulados pela Aneel.

     

    Ano

    Índices

    DEC (horas)

    FEC (interrupções)

    Apurado

    Estipulado*

    Apurado

    Estipulado*

    2011

    16,79 (18º lugar)

    18,56

    6,83 (8º lugar)

    15,80

    2012

    19,31 (23º lugar)

    17,41

    8,06 (13º lugar)

    13,96

    2013

    22,04 (25º lugar)

    12,41

    8,31 (14º lugar)

    16,66

     

    É nítida a queda continua destes indicadores ao longo dos últimos anos, resultando no decréscimo na classificação da Companhia no ranking nacional.

    A tabela abaixo mostra o Indicador de Desempenho Global de Continuidade- DGC, e as respectivas colocações da Celpe no ranking desde que começou a ser divulgado. Nos anos 2011, ficou em 4º lugar entre 33 concessionárias; e em 2012 e 2013 ficou classificada em 16º e 24º lugar entre 35 concessionárias.

     

    Ano

    DGC

    Classificação

    2011

    0,67

    4º lugar (entre 33 distribuidoras > 1TWh)

    2012

    0,84

    16º lugar (entre 35 distribuidoras > 1TWh)

    2013

    0,99

    24º lugar (entre 35 distribuidoras > 1TWh)

     

    Verifica-se um decaimento vertiginoso do desempenho da empresa de 2011 a 2013.

    Por outro lado os indicadores econômicos e financeiros da Celpe apontam para resultados grandiosos, uma evolução crescente no Ebidta (lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização), mesmo diante da crise.

    Ebtidta (R$ milhões)

    2000

    2001

    2002

    2003

    2004

    2005

    2006

    2007

    2008

    2009

    2010

    2011

    2012

    2013

    2014

    169,1

    256,8

    160,3

    250,1

    265,3

    388,4

    430,3

    584,1

    692,2

    911,5

    723,5

    568,8

    224,0

    366,4

    463,7

     

    Com relação ao lucro líquido os ganhos foram extraordinários no período analisado. Somente os lucros nos primeiros 8 anos da privatização foram superiores ao valor leiloado e pago pela empresa (R$ 1,8 bilhões).

    Lucro líquido (R$ milhões)

    2000

    2001

    2002

    2003

    2004

    2005

    2006

    2007

    2008

    2009

    2010

    2011

    2012

    2013

    2014

    50,4

    135,6

    12,9

    97,9

    76,7

    134,8

    217,8

    311,5

    466,3

    586,9

    448,3

    283,4

    -29,3

    106,8

    129,9

     

    Do ponto de vista econômico e financeiro se constata que a empresa vai muito bem. Todavia seus clientes sofrem com as sucessivas interrupções no fornecimento de energia.

    Outra informação interessante a ser destacada é sobre o levantamento realizado pela Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia Elétrica (Abradee), sobre a segurança. Nas 63 distribuidoras do país, acidentes com fios da rede elétrica mataram 317 pessoas em 2013, e acidentaram 841.

    A tabela a seguir mostra no Brasil de 2001 a 2013 os acidentes e as mortes causados pela fiação elétrica. A análise dos números dos últimos treze anos (de 2001 a 2013) indica no período uma média anual de 924 pessoas acidentadas, e de 322 mortes.

    2001

    2002

    2003

    2004

    2005

    2006

    2007

    2008

    2009

    2010

    2011

    2012

    2013

    1046

    1020

    1033

    1057

    923

    907

    942

    925

    815

    817

    856

    830

    841

    341

    357

    350

    334

    316

    306

    327

    329

    295

    305

    315

    297

    317

     

    Em Pernambuco a Agência Reguladora do Estado de Pernambuco (ARPE), apontou que em 2012 houve 31 óbitos por choque em rede elétrica, em vias públicas, uma média de quase três por mês. As ocorrências renderam à Companhia Energética de Pernambuco (Celpe) multa de R$ 3,1 milhões. A evolução dos óbitos (em Pernambuco) causados por choque elétrico na fiação da Celpe pode ser vista na tabela a seguir.

    2008

    2009

    2010

    2011

    2012

    2013

    2014 |*

    18

    18

    16

    31

    18

    13

    3

    *| Até fevereiro

    Desta breve analise da empresa Celpe desde sua privatização, evidencia a deterioração ao longo dos anos dos serviços prestados a população pernambucana. Daí os aumentos nas tarifas serem uma recompensa a ineficiência. Ou seja, um estímulo governamental para que quanto pior seja o serviço prestado, melhor seja remunerado.

    Portanto, precisamos de respostas/explicações a esta situação esdrúxula. Não se pode admitir que a empresa reajuste suas tarifas, mantendo a qualidade dos serviços aquém do estipulado pela própria Aneel.

    Nas tarifas elétricas neste ano os consumidores já tiveram dois reajustes para aumentar o caixa das concessionárias. O primeiro referente às bandeiras tarifárias, e o segundo o reajuste extraordinário concedido pela Aneel. E agora, no caso da Celpe, novo reajuste no final de abril, correspondendo ao promovido anualmente. É muito para o consumidor que sofre com a péssima qualidade do serviço prestado pela Companhia. Como pode as tarifas aumentar tanto e a qualidade dos serviços diminuírem tanto?

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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