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    Joaquim de Carvalho

    Colunista do 247, foi subeditor de Veja e repórter do Jornal Nacional, entre outros veículos. Ganhou os prêmios Esso (equipe, 1992), Vladimir Herzog e Jornalismo Social (revista Imprensa). E-mail: joaquim@brasil247.com.br

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    Certidão do TRF-4 confirma: tribunal blindou Moro e Gabriela Hardt

    Documento, obtido pelo Museu da Lava Jato, do Instituto Defesa da Classe Trabalhadora, mostra que todas as reclamações contra eles foram arquivadas

    Gabriela Hardt, Sérgio Moro e Polícia Federal (Foto: ABR | Reprodução | Agência Senado)

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    Uma certidão obtida pelo Museu da Lava Jato confirma o que os juristas já diziam: Sergio Moro e a juíza substituta Gabriela Hardt foram sistematicamente blindados pela corregedoria do Tribunal Regional Federal da 4a. Região (TRF-4).

    O Museu da Lava Jato, criado pelo Instituto Defesa da Classe Trabalhadora (Declatra), protocolou requerimento na corregedoria para saber quantas representações administrativas de cunho disciplinar contra os dois foram protocoladas na corregedoria entre 2014 e 2022.

    O Museu da Lava Jato perguntou ainda quantas dessas representações resultaram em investigação preliminar e/ou sindicâncias. E, dessas representações, quantas resultaram em processos administrativos.

    Em resposta, a corregedora Vânia Hack de Almeida determinou a expedição de uma certidão. O documento não surpreende quem acompanha a Lava Jato desde o início. Moro, que deixou a magistratura em novembro de 2018 para servir ao governo Bolsonaro, recebeu onze reclamações disciplinares, e todas foram arquivadas.

    "Após a oitiva do reclamado, foram as reclamações arquivadas por não ter sido identificada falha funcional ou por versarem exclusivamente sobre questão jurisdicional consoante o que dispõe a Consolidação Normativa da Corregedoria Regional da Justiça Federal da 4ª Região (Provimento nº 62/2017)", informa a certidão.

    A corregedoria não forneceu a lista das reclamações, alegando sigilo. Mas é público que, em setembro de 2016, a Corte Especial do TRF-4 julgou uma reclamação apresentada por um grupo de juristas que pedia o afastamento de Moro por não respeitar os limites da lei.

    Entre os fatos relatados pelos juristas, estava autorização dada por Moro para grampear o escritório dos advogados de Lula, entre eles Cristiano Zanin, a divulgação de interceptações telefônicas que envolviam a presidente da república e o uso de supostas provas da Suíça enviadas por meio clandestino.

    No julgamento desta reclamação, a corte especial consagrou o que juristas como Pedro Serrano definem como a instalação de tribunal de exceção em Curitiba. O desembargador federal Rômulo Pizzolatti, relator do caso, não viu nenhum indício de infração disciplinar.

    “É sabido que os processos e investigações criminais decorrentes da chamada operação 'lava jato', sob a direção do magistrado representado, constituem caso inédito (único, excepcional) no Direito brasileiro. Em tais condições, neles haverá situações inéditas, que escaparão ao regramento genérico, destinado aos casos comuns”, afirmou.

    O voto de Rômulo foi aprovado por outros 12 desembargadores. Um faltou. O único a votar contra foi o desembargador Rogério Favreto, que, em razão de sua posição independente, também foi perseguido.

    Na época, o corregedor era Celso Kipper e o juiz auxiliar da Corregedoria era Marcelo Malucelli, pai do socio e genro de Moro.

    Entre 2020 e 2022, na gestão do desembargador Cândido Leal como corregedor, o juiz auxiliar foi Loraci Flores de Lima

    Loraci é irmão do delegado da Polícia Federal Luciano Flores de Lima, um dos mais ativos na operação Lava Jato. Foi Luciano quem, pessoalmente, comandou a operação de condução coercitiva de Lula, em março de 2016.

    Loraci também era o responsável pelo inquérito onde foram realizadas as escutas telefônicas do escritório dos advogados de Lula e o grampo telefônico com a conversa privada de Marisa Letícia, que acabou divulgada ao público.

    Outro grampo divulgado à época foi feito fora do horário autorizado e mostrava uma conversa de Lula com a então presidente Dilma Rousseff. O TRF-4 considerou "incensurável" a decisão de Moro de tornar público o conteúdo dessas interceptações.

    Por 13 votos a 1, a corte considerou que somente depois desse episódio, com a repreensão do STF, é que a magistratura brasileira teve “orientação clara e segura a respeito dos limites do sigilo das comunicações telefônicas”.

    No final do ano passado, o juiz Loraci Flores de Lima foi promovido a desembargador por Jair Bolsonaro e, no TRF-4, continuou a blindar Moro e os juízes Luiz Bonat (também promovido a desembargador) e Gabriela Hardt.

    Recentemente, contrariando decisão do ministro Dias Toffoli, Loraci Flores relatou a ação em que todos os atos do juiz Eduardo Appio relacionados à Lava Jato foram anulados. O autor da ação contra Appio, por suposta suspeição, foi o Ministério Público Federal em Curitiba.

    Dias Toffoli cassou essa decisão e, num duro despacho, apontou que Loraci é contumaz violador das decisões do STF.

    "Esses gravíssimos fatos já seriam suficientes para a anulação integral da decisão proferida na exceção de suspeição, mas não é só. Como visto, constata-se que o relator da exceção de suspeição descumpriu frontal, consciente e voluntariamente reiteradas decisões desta Suprema Corte", escreveu.

    Dias Toffoli também apontou que, no julgamento de exceção de suspeição, Loraci e os demais magistrados envolvidos na Lava Jato praticam dois pesos e duas medidas.

    "Note-se, a esse respeito, não terem sido poucas as exceções de suspeição das defesas de acusados que pesaram sobre o então juiz Sérgio Moro e sobre a juíza substituta da 13ª Vara Federal Criminal. Todas, no entanto, foram rechaçadas pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região pela ausência das hipóteses do art. 254 do CPP, em posicionamento jurídico diametralmente oposto ao que se observa na presente hipótese."

    Por uma dessas hipóteses, o próprio Loraci Flores de Lima não poderia julgar nenhum caso caso relacionado à Lava Jato, inclusive pedido do Ministério Público Federal para afastar Eduardo Appio, já que ele é irmão do delegado Luciano Flores de Lima.

    Importante registrar que as exceções de suspeição são diferentes das reclamações disciplinares. O que o Museu da Lava Jato obteve foi informações sobre as reclamações disciplinares. Mas, tanto no caso da suspeição quanto das reclamações, o que fica claro é que o TRF-4 protegeu Moro e Gabriela Hardt.

    No TRF-4, as normas do Direito parecem não ser as mesmas que vigoram no restante do País. Gabriela Hardt também teve todas as reclamações contra ela arquivadas. 

    "Gabriela Hardt - no período delimitado foram identificadas duas reclamações autuadas, dentre as quais tramitou sem sigilo a correspondente ao SEI nº 0002471-32.2019.4.04.8000. Após a oitiva da reclamada, foi a representação arquivada por versar exclusivamente sobre questão jurisdicional consoante o que dispõe a Consolidação Normativa da Corregedoria Regional da Justiça Federal da 4ª Região (Provimento nº 62/2017)", diz a certidão.

    O Conselho Nacional de Justiça abriu há cerca de duas semanas investigação contra Sergio Moro e Gabriela Hardt, e também contra os desembargadores  Loraci Flores de Lima, João Pedro Gebran Neto e Marcelo Malucelli.

    A Corregedoria Nacional de Justiça considerou que houve “gestão caótica” de recursos provenientes de acordos de colaboração e de leniência firmados com empresas pelo Ministério Público Federal e homologados pela 13ª Vara.

    Também encontrou indícios de irregularidades na atuação dos três desembargadores do TRF-4, relacionados a essa "gestão caótica".

    A investigação do CNJ só foi possível graças a uma representação do juiz Eduardo Appio, feita depois que ele encontrou irregularidades na Vara que havia assumido em fevereiro deste ano. Em maio, quatro dias depois de encaminhar a representação, o TRF-4 o afastou. Ou seja, o único punido até agora foi o autor da denúncia.

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    A seguir, a nota do Museu da Lava Jato, que é presidido pelo advogado e professor universitário Wilson Ramos Filho:

    Nota pública do MLJ

    O Museu da Lavajato vem a público, em sua função apartidaria e sem qualquer finalidade economica - mas sempre no objetivo de registrar para as gerações futuras tudo o que ocorreu ao longo dos 10 ultimos anos, informar que:

    1. Obteve, nos termos da Lei de Transparência, duas certidoes emitidas pela Corregedoria Regional da Justiça Federal da 4 Região, as quais narram que um total de 11 (onze) pedidos de instauração de investigação e processo disciplinar em face das condutas do ex juiz federal Sergio Moro foram sumariamente arquivadas no âmbito do TRF da 4 Região;

    2. Na mesma oportunidade, a Corregedoria do TRF4 certificou, também a pedido do Museu da Lavajato, que 2 (duas) representacoes disciplinares também foram arquivadas em face da juíza federal substituta da 13.ª vara federal de Curitiba, Gabriela Hardt.

    3. O Museu da Lavajato, com o sentido de manter um registro histórico das ilegalidades praticadas por Sergio Moro e Gabriela Hardt, envidara esforços no sentido de obter mais informações junto à Corregedoria Nacional de Justiça, órgão que tem a incumbência legal de rever o arquivamento sumário de representações disciplinares destes dois juízes que estiveram à frente da Operação Lavajato nos últimos 9 anos.

    O Museu da Lavajato informa, ainda, que se mantém firme e fiel aos seus propósitos de bem registrar, para as futuras gerações, ações, omissões e conluios que resultaram na derrogação dis direitos fundamentais de dezenas de cidadãos brasileiros, além de interferir (diretamente) no resultado das eleições de 2018, bem como na ilegal deposição de uma Presidenta legitimamente eleita.

    Museu da Lava Jato

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    A seguir, a íntegra dos documentos do TRF-4: 


     

     

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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