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    Pedro Benedito Maciel Neto

    Pedro Benedito Maciel Neto é advogado, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, Ed. Komedi, 2007.

    155 artigos

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    Combate aos juros e aos privilégios morais

    Tarefa dos socialistas

    Cédulas de real (Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
    “Os socialistas brasileiros devem pensar e propor o desenvolvimento soberano do Brasil, a partir das suas grandes potencialidades e das suas imensas riquezas naturais, humanas e culturais. Mas, nunca devem esquecer a sua grande missão: desenvolver e implantar políticas públicas que diminuam as grandes desigualdades sociais existentes em nosso País" - Carlos Siqueira

    A elite nacional, capitaneada pela elite financeira, o tal “mercado”, condena a economia brasileira a um círculo vicioso da quase estagnação, assim decreta o professor Bresser-Pereira. Paralelamente, os representantes dessa elite são vigilantes na defesa e ampliação dos privilégios daqueles que vão garantir que toda crueldade seja normalizada.

    Vamos ao argumento.

    As famílias brasileiras pagam muitos juros; foram 284,1 bilhões de reais em juros só nos seis primeiros meses de 2022, montante que representou 12,69% da renda dos lares no período; na comparação com 2020, o valor foi 18% maior, enquanto no comparativo com 2021 a variação foi de 9,9%.

    O Brasil é o país que mais paga juros de dívida no mundo, aponta estudo. Com dívida bruta de 84,67% do Produto Interno Bruto (PIB) e juros básicos em 11,5%, o Brasil é o país que mais paga encargos no mundo, com uma taxa de 5,97% do PIB. É bom lembrar que em 2003 Lula pegou o dólar subindo; inflação em 9,5%, desemprego em 12%; sem reservas cambiais; PIB ridículo e relação dívida x PIB alta (a dívida bruta em 72% do PIB e a dívida líquida em 60%). 

    Apesar disso, as “viúvas do PSDB” seguem repetindo que Lula pegou um país arrumado; como? Estávamos sem reservas, com inflação e desemprego alto e pendurados no FMI. Apesar dessas dificuldades, Lula entregou para Dilma a Dívida Bruta x PIB em 52% do PIB e a Dívida Líquida em 39%, com reservas altíssimas, inflação na meta, PIB em alta e com o FMI pago.

    Antes dos ataques e movimentos que levaram ao golpe de 2016, Dilma tinha uma dívida bruta em 62% do PIB e a Dívida Líquida estava em 34,9%. 

    Ou seja, tanto Lula quanto Dilma foram zelosos na questão fiscal, apesar da propaganda desinformativa que o pessoal que não dorme faz. 

    Foram perfeitos? Evidentemente que não, afinal “a perfeição é uma meta”, como escreveu Gilberto Gil. Contudo, o pobre entrou no orçamento da União pela primeira vez na história do país e o “mercado industrial” passou a ter vez e voz.

    Vamos voltar ao assunto.

    Há um grupo de servidores "privilegiados" que, segundo Bresser-Pereira, recebem salários e aposentadorias excessivamente altas, muitas vezes acima até do teto constitucional, ou seja, acima dos salários dos ministros do STF, isso tem que acabar (há estudo que aponta gastos superiores a 20 bilhões de reais, entre 2018 e 2024, com o pagamento de remunerações acima do teto constitucional, só para os integrantes do Poder Judiciário e do Ministério Público, isso não pode ser considerado “direito adquirido”. É privilégio imoral, à luz do artigo 37 da CF).

    Por que é um tabu debater essa imoralidade travestida de direitos adquiridos?

    Justiça seja feita, em relação ao combate aos super-salários o governo apresentou a PEC 45/2024, com objetivo de moralizar a farra patrocinada pelas corporações, mas foi feita mudança pelos parlamentares  na parte que tratava dos super-salários.

    A proposta, como enviada pelo governo, previa que uma lei complementar tratasse das verbas que poderiam ficar fora do teto remuneratório, que hoje é de R$ 44 mil mensais, valor do subsídio dos ministros do Supremo Tribunal Federal; com a versão aprovada no Congresso, essas brechas ao teto podem ser tratadas em lei ordinária, que requer um quórum menor para a aprovação, ou seja, será mais fácil dar legalidade à imoralidade dos “penduricalhos” nos salários.

    Parto dessa ideia para afirmar que o grande problema do Brasil não é, como pretendem nos fazer crer, a (a) corrupção (que deve ser repudiada e combatida), o grande problema é a captura do patrimônio das famílias e do patrimônio público pelo (b) mercado financeiro e pelos (c) altos salários dos servidores públicos. Está na hora de pensarmos sobre isso com responsabilidade (só o Poder Judiciário custa 1,2% do PIB).

    O que fazer? Parece simples dizer que temos de: (a) combater a corrupção; (b) colocar freio na ganância do mercado financeiro e (c) realizar uma reforma administrativa que moralize e dê eficiência ao serviço público.

    Mas não é nada simples. Na realidade, é muito complexo, porque há milhares de interesses a serem alvejados e que são fortemente protegidos.

    Sobre o combate à corrupção - Na última década, o combate à corrupção foi apresentado pela mídia e por diversos atores políticos como a principal ou única agenda nacional, em torno da qual o Governo Federal deveria e seria obrigado a mover-se.

    Essa falácia, somada à incapacidade de a esquerda responder com honestidade às críticas que a ela foram dirigidas desde o Mensalão, passando pelo Petrolão, levou Bolsonaro à Presidência da República. Logo ele, um defensor confesso de privilégios.

    O combate à corrupção deve estar contido nas ações cidadãs, nas ações de governo e de Estado, é trabalho de todas as estruturas e instituições públicas e privadas do país. 

    Cabe a cada um dos cidadãos denunciar, combater os efeitos e eliminar as causas e, para isso, se faz necessário entender as raízes da corrupção. Não podemos temer enfrentar o tema. Curiosamente, o discurso de combate à corrupção, apoiado pelos maiores veículos de comunicação do Brasil, não foi abraçado, assumido ou protagonizado pela esquerda brasileira na forma adequada. Por quê? 

    Isso é curioso porque o combate à corrupção nunca foi bandeira dos setores conservadores, salvo episodicamente e de forma oportunista (vide a campanha contra Getúlio entre 1950 e 1954) e distorcida (até porque há uma contradição lógica entre os valores do sistema capitalista, onde o que vigora são os interesses individuais e imediatos, e outro sistema que respeite os Direitos Humanos, em contraposição ao sistema capitalista liberal). 

    Então por que a esquerda não foi protagonista desse movimento de combate à corrupção, se foi nos governos Lula 1 e 2 e Dilma que a legislação mais se avançou nessa quadra? Talvez porque alguns de seus quadros envolveram-se em denúncias, o que a colocou na defensiva nesses episódios. Ficar na defensiva foi um erro tático. 

    Assumir o combate à corrupção, separando a luta genuína do indesejado moralismo lacerdista, teria sido fundamental, pois só a esquerda poderia ter feito isso, só os setores democráticos podem fazer isso, mas ainda dá tempo, talvez Lula 3, através do ministério da Justiça e da CGU .

    Na última década, nossos líderes transformaram-se em reféns do mesmo discurso moralista e da mesma tática usada para alçar Collor ao cenário nacional como o "caçador de marajás", discurso que elegeu Bolsonaro. Eis aí o objetivo oculto desta retórica rasa e frágil.

    Nosso papel é enfrentar as estruturas hipócritas e corruptas, que se apropriaram da bandeira de combate à corrupção, que deveria ser dos partidos políticos, da imprensa livre, dos intelectuais, estudantes e às centrais sindicais; esse papel é sempre da sociedade, sendo a excessiva institucionalização um erro grave; demais, faltou debate político. 

    A falta de debate político fez com que setores da sociedade, especialmente a classe média, fossem cooptados por um discurso moralista que identificou a corrupção com a esquerda, "e não fizemos nada", nossos líderes talvez estivessem preocupados demais com as próximas eleições e com os novos amigos do mundo corporativo. 

    O mercado financeiro - O problema maior não é a corrupção ou a ganância dos políticos e dos lobistas; o maior problema é o capitalismo, que é fundamentalmente corrupto e corruptor. Temos que dar alguns passos à frente e voltar trabalhar para mudar o mundo, ao invés de trabalhar apenas para vencer as próximas eleições.

    O que tem de ser denunciado e combatido é um sistema econômico que corrompe; um sistema que financia falsos debates e crises.

    Combate aos privilégios - Temos de combater a corrupção estrutural e sistêmica, combater privilégios, travestidos de direitos adquiridos.
    É imperativo denunciarmos esses privilégios num país em que em 2022 33,8 milhões de pessoas recebem até um (1) salário-mínimo, ou seja, 36% do total dos trabalhadores ocupados; é tarefa dos socialistas denunciar esses privilégios num Brasil em que, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a renda média do brasileiro, apesar de, sob Lula, ter voltado a crescer, é de apenas R$ 3.137,00, pouco mais de 8% do teto constitucional, sendo que sabemos que há casos em que servidores recebem 1 milhão de reais por mês, tudo “legal” (e imoral).

    Conclusão - Temos uma longa caminhada pela frente, pois "outros outubros virão" e temos de estar reconciliados com nossos sonhos e em dia com a leitura do “Que fazer?” do nosso amigo Vladimir, bem como da parte do “manifesto” do Carlos e do Frederico, onde eles dizem que “o resultado das nossas lutas não é a vitória imediata, mas a união cada vez maior dos trabalhadores. Ela [a união dos trabalhadores] é promovida através dos crescentes meios de comunicação desenvolvidos pela grande indústria e coloca em contato com outros trabalhadores de diferentes localidades”.

    Feliz 2025 e ao trabalho.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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