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    Jose Carlos de Assis

    Economista, doutor em Engenharia de Produção pela Coppe-UFRJ, professor de Economia Internacional da UEPB

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    Consciência humana

    Os movimentos identitários só se apresentam como aspectos positivos do processo civilizatório quando não se superpõem a valores nacionais

    (Foto: Arquivo/ABr)

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    A democracia, que tanto se orgulha de suas conquistas no mundo ocidental, está sendo vítima de uma de suas principais consequências: o crescimento expressivo dos grupos identitários, os quais, na mesma medida em que se afirmam em termos de valores ou características comuns, fragmentam as sociedades politicamente. Mais do que isso, perde-se, em favor da afirmação de particularidades individuais, a própria consciência de humanidade.

    É claro que expressões identitárias que conquistam reconhecimento público, como de movimentos religiosos, de negros, de mulheres, de índígenas e de diferentes nacionalidades, entre outras, são justas correções históricas de injustiças seculares cometidas por forças dominantes contra esses grupos. Entretanto, quando, no plano interno, elas se colocam acima da Nação, fracionam a unidade de um país e dificultam a própria governabilidade, pois o governo não tem como atender a todos de uma vez. 

    Os movimentos identitários só se apresentam como aspectos positivos do processo civilizatório quando não se superpõem a valores nacionais, no plano dos países, ou, no plano mundial, aos valores da própria humanidade. Do contrário, o extremismo religioso, o patriotismo fanático, o racismo invertido ou o partidarismo político cego dividem a sociedade em partes que só reconhecem a si mesmas, e não ao conjunto dela, como unidade superior.   

    No plano mundial, é o próprio sentido de consciência humana que está em jogo. Quando as sociedades colocam seus interesses próprios acima dos interesses do conjunto da humanidade, isso é reflexo de que consciência humana em si mesma está se degenerando. Vemos isso no caso do aquecimento global, provocado por indústrias poluidoras, e sua consequência dramática: as grandes mudanças climáticas que provocam tragédias jamais observadas na história do planeta. 

    Nos séculos XVI/XVII, um poeta inglês de extrema sensibilidade escreveu um poema que se iniciava com essas palavras: “Homem algum é uma ilha isolada. Cada homem é parte de um todo. Se um torrão é arrastado para o mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse o solar de teu amigo ou o teu próprio. Por isso, não perguntes por quem os sinos dobram. Os sinos dobram por ti”. Esta é a consciência de humanidade que está sendo perdida. Ninguém, hoje, sequer se pergunta por quem os sinos dobram em Israel, em Gaza, na Ucrânia, ou no Congo. Se alguém pergunta, não se dá conta que os sinos dobram por si mesmo!

    Tenho dúvidas extremas sobre a que nos levará esse declínio de consciência humana que se observa nesse século materialista, onde as pessoas se dedicam, obsessivamente, de forma quase exclusiva, à acumulação do dinheiro. É o mundo do neoliberalismo, do Consenso de Washington, do Forum de Davos; em suma, o mundo dirigido pelos ricos e pelos bilionários, que fomentam a miséria e as guerras, de onde extraem suas fortunas. O mundo que ignora os pobres e os desassistidos.  

    No caso brasileiro específico e atual, vejo, além do identitarismo negativo, outro fator que, pelo extremismo político, está trazendo várias consequências perversas para o futuro do país. Entendo que é hora de começar a pacificar politicamente a sociedade, e isso não está acontecendo. O presidente Lula tem feito um grande esforço nesse sentido, mas não vem sendo ajudado pelo PT e seus aliados partidários. Esses últimos estão parados  ideologicamente no 8 de janeiro. 

    A tentativa de golpe, ou a arruaça na Praça dos Três Poderes, devem ser encaradas, politicamente, como um fato de inigualável gravidade em nossa história, mas não pode ser um embaraço permanente para o futuro. É preciso começar a pensar no nosso destino comum como Nação, no qual todos os brasileiros precisam de viver com relativa harmonia. Não há sentido em viver permanentemente em guerra verbal por conta daqueles fatos deploráveis.

    Claro que não serão nem esquecidos nem perdoados. Nesse ponto, porém, o Supremo Tribunal Federal está desempenhando um papel  inigualável, com seus julgamentos sucessivos dos investigados pelos crimes, condenados com rigor. Mas não é necessário que políticos governistas subam à tribuna todos  os dias no Congresso para fustigar bolsonaristas e aprofundar divergências com eles. Isso distancia a possibilidade de acordos pontuais para aprovação de projetos importantes para o país. O esforço de reconciliação não pode ser só de Lula. Tem que ser de todos os governistas.

    Na verdade, se algo concreto divide o país é a política econômica. Os políticos governistas deveriam focar nisso: exercer uma pedagogia constante para explicar ao conjunto dos parlamentares a importância de uma virada na política econômica, como o próprio presidente Lula sinalizou, ao criticar a obsessão com o equilíbrio fiscal. Isso, de uma forma civilizada, poderia atrair pelo menos parte dos congressistas de boa vontade para uma nova política. E isso salvaria o país de um futuro tenebroso que repita a tragédia dos últimos dez anos, na qual a distância entre a indústria interna e  a mundial, a parte mais importante da economia, atingiu quase 50%!   

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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