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    Valério Arcary

    Valério Arcary é historiador e membro da Coordenação Nacional do Resistência/PSOL.

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    Construir nas ruas em março uma muralha para deter a escalada neofascista

    O historiador Valério Aracay avalia que o mês de março será decisivo para a definição da conjuntura: "Chegou a hora de dizer basta. Vai ser nas ruas a medição de forças. E podemos vencer. Temos que chamar às ruas com vontade de vencer"

    O elemento chave que define o novo momento da conjuntura foi a decisão de Bolsonaro de se unir à convocação de manifestações de massas contra o Congresso e o STF. Esta iniciativa significa um desafio frontal às instituições do regime, portanto, uma medição de forças com a maioria dos partidos de direita e centro-direita no Congresso que garantiu, até agora, a aprovação dos principais projetos do governo, como a reforma da Previdência, além de um desafio ao Supremo Tribunal Federal (STF).

           O conflito em torno da possível derrubada na Câmara dos Deputados do veto de Bolsonaro ao orçamento impositivo foi somente o gatilho do novo momento político. Se foi assim, sejamos claros. A situação é tão reacionária que a chave do novo momento é uma disputa entre um governo de extrema-direita e a maioria de centro-direita que, para o fundamental, garantiu que os projetos do governo Bolsonaro fossem aprovados. Não se trata de um enfrentamento de Bolsonaro com a oposição de esquerda, com a resistência popular, mas um conflito de reposicionamento de forças dentro do bloco que apoia o projeto de recolonização.

           A questão central para a esquerda é saber se há ou não um perigo real de um autogolpe em construção, ou de um golpe dentro do golpe. Se ela obedece a um plano calculado, minuciosamente, ou foi um improviso, se será sustentada até o fim ou haverá recuo, não podemos saber. Mas é, de qualquer forma, muito sério. O projeto estratégico da ala neofascista de Bolsonaro é uma subversão autoritária do regime democrático-liberal, tal como foi consolidado, nos últimos trinta e cinco anos.

            Existe um plano contrarrevolucionário que é, para a ala neofascista, indivisível das transformações econômico-sociais que estão em marcha com os ajustes dirigidos por Guedes. A tática de se apoiar na mobilização de massas para abrir o caminho e conquistar plenos poderes desafiando as instituições do regime não é um blefe. Poderão ou não recuar desta iniciativa do próximo 15 março, dependendo da força da reação, mas não deixarão de testar até o limite máximo a possibilidade de levar seu projeto adiante.

            Haverá uma inescapável medição de forças com a ala neofascista no próximo mês de março. Esta é a questão central de máxima gravidade para todos os partidos da esquerda brasileira. Desde 2015, tem prevalecido uma subestimação da audácia das forças da extrema direita. Esta desvalorização do perigo só pode ser explicada como consequência de uma triste e catatônica adaptação ideológica às instituições parlamentares do regime eleitoral. Evidentemente, a esquerda deve chamar todos os que têm algum compromisso com as liberdades democráticas a sair juntos às ruas. Ma não serão Maia, Toffoli ou Celso de Mello quem irão deter Bolsonaro. Sem mobilização popular de massas Bolsonaro e seu governo não serão derrotados. Mais uma vez o perigo de um “inverno siberiano” bate nas nossas portas.

           Sempre que ocorre uma mudança brusca na situação política é natural que se precipite alguma crise, em maior ou menor grau, nas organizações de esquerda. Em algumas mais do que em outras, mas ninguém é poupado de debates, polêmicas, discussões. Porque é necessário explicar os fatores que a provocaram, a nova dinâmica, seus possíveis desdobramentos, os cenários previsíveis. E, sobretudo, se coloca o problema chave do que fazer. Porque a análise deve ser boa ciência, mas o ajuste da tática política exige um pouco de arte.

           Análise é ciência porque deve estar ordenada por um método. Separar os elementos do todo, considerar a evolução da dinâmica anterior, avaliar qual é o maior perigo, ponderar se os inimigos conseguiram agrupar mais forças ou perderam aliados, identificar quem está se fortalecendo, enfim, estudar os distintos terrenos em que a luta se dará, e tentar prever os desdobramentos, os próximos movimentos e iniciativas, antes de decidir o que fazer.

             A política envolve sempre a decisão de correr riscos. Eles devem ser bem calculados, mas será fatal se não houver uma resposta à altura nas ruas dias 8, 14 e 18 de março. Existe crise na esquerda porque há uma acomodação política que se alimenta da ilusão de que as instituições do regime, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal serão capazes de frear a fúria bonapartista. Subestima-se o grau de apoio que Paulo Guedes conquistou na burguesia brasileira. A tarefa de encabeçar a resposta a Bolsonaro cabe à esquerda e é intransferível. A esquerda deve exigir de todos os partidos que se posicionem, inequivocamente, contra a ameaça neofascista.

           Chegou a hora de fechar os punhos e se preparar para a luta. Chegou a hora de dizer basta. Vai ser nas ruas a medição de forças. E podemos vencer. Temos que chamar às ruas com vontade de vencer.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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