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Ricardo Lodi Ribeiro

Foi Reitor da UERJ (2020-2022), onde é professor associado de Direito Financeiro

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De quem é a culpa do caos na UERJ?

"É chegada a hora da gestão atual assumir a responsabilidade pelas suas decisões", diz Ricardo Lodi Ribeiro

UERJ (Foto: Tomaz Silva/ABR)

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Circulam na internet textos de pessoas que apoiam a atual reitoria procurando me responsabilizar pela infame invasão do campus Maracanã da Uerj pela Polícia, a pedido da reitoria da UERJ. Dizem que estou por trás da ocupação que os estudantes promoveram em vários campi, em busca de um terceiro turno das eleições do ano passado, em razão do meu apoio à chapa que, segundo acusam, seria ligada ao governo do Estado.

Em primeiro lugar, cumpre ressaltar que não estimulei qualquer ocupação. Na verdade, nem estava no Brasil quando ela ocorreu. Aliás, vale registrar que a esmagadora maioria dos estudantes que participaram da ocupação fizeram oposição à gestão anterior e intensa campanha para a chapa 10, acreditando em suas promessas eleitorais de manter e ampliar as bolsas e auxílios instituídos na gestão anterior, durante a pandemia, mas cuja duração não era limitada a ela.

Também não é verdade que dei suporte jurídico à ocupação. Dei sim um parecer técnico, dentro da minha área de atuação profissional, a pedido do centro acadêmico da unidade em que estudei, dirigi e leciono desde que fiz concurso para a UERJ. O parecer atesta a existência de espaço orçamentário para o pagamento de auxílios e bolsas revogados pelo Aeda 38, e a incompatibilidade deste ato com a Constituição Federal, em especial com os princípios da proporcionalidade e da revogação do retrocesso social.

No entanto, apesar de não ter estimulado a ocupação e não ter prestado assessoria jurídica a ela, e de, ainda, ter ciência de que o movimento era integrado majoritariamente por estudantes que fizeram ferrenha oposição à nossa gestão, não hesitamos um momento sequer em apoiar a luta dos estudantes pela revogação deste ato autoritário, excludente, que retira o povo pobre da Universidade.

O Aeda da Fome, como os estudantes chamam, desestrutura ações que visam a dar maior efetividade às políticas de ação afirmativa que a Uerj tanto se orgulha de ter sido pioneira, e que se encontra em perfeita harmonia com o Plano Nacional de Permanência Estudantil instituído pelo Presidente Lula.

É arrogante a postura de muitos professores em sustentar que o movimento estudantil precisa ser sempre tutelado por um docente, a partir da visão equivocada de que eles não podem dar conta de seus próprios destinos e decisões. Não é, e nunca foi assim, apesar de muitos dos que hoje criminalizam o movimento estudantil terem tentado manipulá-los no passado recente.

É óbvio que quem entrou na UERJ a partir de nossas políticas de assistência estudantil não vai se conformar em sair, aceitando que seja inviabilizado o sonho de chegar à Universidade, muitas vezes pela primeira vez em suas famílias. E lutará por seus direitos sem a tutela de qualquer docente.

Acusam a gestão que implementou o maior plano de assistência estudantil da América Latina de ter se aliado ao governo do Estado. E apoiam uma reitoria que, em pouco tempo, em nome da austeridade seletiva e da recuperação fiscal, feriu a autonomia universitária, destruiu a permanência dos estudantes socialmente vulneráveis e suprimiu direitos de servidores docentes e técnicos.

Nossa relação com o governo do Estado sempre foi respeitosa e institucional, como deve ser para quem tem a responsabilidade de gerir uma universidade que depende de recursos estaduais para se manter. Por outro lado, uma rápida pesquisa na internet mostraria que nunca tive aliança eleitoral com o campo político dos atuais mandatários estaduais. No golpe contra a Dilma, ao contrário de alguns que posam hoje de democratas, fiquei do lado da legalidade, participando da defesa da presidenta no Congresso Nacional, no TCU e na Justiça Federal. Nas últimas eleições apoiei e fiz campanha intensa para os candidatos majoritários apoiados pelo meu partido, o PT, onde milito desde 1986, que foram Lula para presidente, Marcelo Freixo para governador e André Ceciliano para senador.

No entanto, nunca misturei minhas convicções partidárias com as responsabilidades exigidas pelo cargo de reitor, sobretudo diante da necessidade de manter uma relação administrativa produtiva com aqueles eleitos por outro campo político. Para quem é reitor, só pode existir um partido: a UERJ.

Acusam-me também de ter renunciado ao cargo de reitor para ser candidato a deputado federal, e depois ter voltado para apoiar o meu sucessor à reeleição. Vale o registro de que se tomei a decisão difícil de renunciar à confortável posição de reitor em uma gestão que dava certo, para encarrar a incerta e difícil missão de buscar integrar a bancada parlamentar do então futuro governo Lula é porque tinha duas certezas. A primeira era a de que todas as conquistas da pequena revolução da UERJ seriam mantidas e ampliadas pelo meu companheiro de chapa, Mário Carneiro, o que se confirmou até o último dia do nosso mandato. Segundo, porque acreditava que os grandes desafios da UERJ não estavam mais em nosso Estado. A partir daquele momento todos os nossos avanços esbarravam na legislação de recuperação fiscal, que condena os Estados devedores a não superar suas dificuldades de desenvolvimento social e econômico. Aqui, uma vez mais, penso que tinha razão, pois hoje não há quem duvide do grau de influência do tema sobre a vida de todos nós.

Dizem que fui derrotado nas eleições de 2022. Assim não considero. Na primeira eleição, tive quase 32 mil votos, sendo hoje o primeiro suplente da bancada federal do PT no Rio de Janeiro.

Tampouco creio que eu, o Mario Carneiro e o Lincoln Tavares tenhamos sido derrotados em 2023. Lutamos o bom combate, enfrentamos acusações levianas e defendemos o legado da pequena revolução da UERJ. Infelizmente, quem perdeu foram os estudantes socialmente vulneráveis, que ficaram sem as bolsas, os cotistas, que perderam o auxílio alimentação, e os servidores que não tiveram mais o pagamento dos auxílios saúde e educação.

É chegada a hora da gestão atual assumir a responsabilidade pelas suas decisões sem tentar empurrá-las à gestão anterior e ao governo do Estado. A crise atual não é orçamentária. A UERJ herdou da gestão anterior o maior orçamento de sua história. E a mobilização dos estudantes garantiu uma suplementação orçamentária de 150 milhões que deveria ter sido aplicada na regularização das bolsas e auxílios estudantis e dos servidores. Mas a reitoria atual, usando da autonomia universitária, está alocando os recursos em outras finalidades, tentando empurrar o ônus de sua decisão exclusiva para terceiros. No entanto, suas versões esbarram nos dados oficiais a que a comunidade universitária teve acesso recentemente.

Ontem, no dia da infâmia, com a invasão do campus e a prisão de estudantes, um jornalista e o deputado federal Glauber Braga, que merecem toda a nossa solidariedade, muitos parlamentares de esquerda que apoiaram a chapa vencedora nas eleições da UERJ, embora condenando a invasão, procuravam isentar a reitoria, responsabilizando o governo do Estado. No entanto, só existe um único responsável pela invasão do campus pela polícia. A atual reitoria da UERJ que solicitou a providência ao poder Judiciário. Este determinou a medida em uma ação de reintegração de posse, em que cinco estudantes vulneráveis e um servidor que não participava da ocupação foram pessoalmente criminalizados pela reitoria. E esta ainda pediu que os estudantes que participavam da ocupação sofressem a penhora online em suas contas pessoais, no valor de R$ 10 mil por dia, o que não foi deferido pela magistrada.

Falam em união e nos acusam de promover um terceiro turno nas eleições da reitoria. Perceba-se que é o mesmo argumento que os bolsonaristas usaram durante a pandemia diante das críticas da oposição. É uma tática própria dos governos que não toleram críticas e que não sabem conviver democraticamente com os que não os apoiam.

Quem parece querer promover um terceiro turno é uma gestão que, desde os seus primeiros dias, não perde uma oportunidade de atacar a administração anterior, apagar os seus feitos, cancelar os seus integrantes, perseguir os seus apoiadores, e a responsabilizar pelos muitos fracassos de sua atuação, que tantos prejuízos causaram e continuam causando a estudantes, técnicos e docentes, e à vida universitária em geral.

Essa Reitoria vai passar, e a comunidade universitária continuará sua luta incessante em favor desse projeto maravilhoso de universidade popular, inclusiva, de excelência, construída pelas lutas de várias gerações ao longo dos seus mais de 70 anos de existência. Mas vamos todos juntos, pois não podemos deixar ninguém para trás.

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