"Deixa ele ser rico!"
"Nada mais cômodo para um sistema que quer exatamente isso: poucos ricos vivendo às custas de muitos pobres passivos", escreve Miguel Paiva
No Brasil, prolifera a categoria do pobre de direita. Depois que a educação política sumiu das nossas vidas, a direita assumiu um glamour especial que a esquerda não tem. Tudo que é coletivo não tem charme, não atrai a admiração das pessoas, não vira moda. Ser rico, não importa como, passou a ser a grande meta, o grande sonho de todos. Uma pessoa rica é a mais admirada. Não importa como o dinheiro foi obtido, se de modo desonesto, esperto ou enganando muita gente, é ainda mais admirado.
Em um país onde os avanços sociais, que continuam acontecendo, perderam a característica de conquista coletiva, a riqueza desmedida, a ostentação e a prosperidade assumem características individuais de talento, de escolha divina, de mérito planetário, de algo que você tem que continuar perseguindo, de preferência acreditando em Deus.
As prisões de Deolane Bezerra e Gusttavo Lima, ostentadores de primeira, mostram isso através da reação das pessoas. Os fãs foram para a porta do presídio onde a influenciadora foi detida para protestar. No caso de Gusttavo, nem foi preciso. Da sua mansão na Flórida, ele ficou sabendo da revogação da prisão. Ricos não vão presos e, segundo essas pessoas, nem deveriam. Afinal, o dinheiro os coloca em outro patamar, onde lhes é concedido o direito de opinar, mandar, decidir, governar e falar o que lhes vier à cabeça. Quem tem dinheiro tem tudo.
Esse destino que poucos alcançam, para essa gente, é um objetivo atingível, uma espécie de prêmio pela obediência e resignação. Fique quietinho que você será recompensado. Não proteste, não fale alto, não reclame e, sobretudo, não forme grupinhos na esquina para discutir a realidade. Depois, é só votar nesses ricos ou em quem os defende, e esse esquema será garantido.
A riqueza traz uma aura de sucesso, de realização, de capacidade que produz admiração ao invés de inveja. A admiração não gera qualquer reflexão. Ela provoca um estado de letargia que aceita o mundo como ele é. Se eu não consigo, é porque me falta alguma coisa ou Deus assim preferiu. Nada mais cômodo para um sistema que quer exatamente isso: poucos ricos vivendo às custas de muitos pobres sorridentes e passivos. Já vi isso antes e, se não fizermos algo para que a educação política volte, continuaremos a ver.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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