Depois da cadeirada
"É bom não esquecer que golpes de Estado não caem do céu, mas costumam ser preparados através de provocações e pequenos incidentes", escreve Paulo Moreira Leite
Numa agressão mais violenta do que parecia a princípio, a cadeirada que atingiu o deputado Pablo Marçal (PRTB-SP) durante uma luta-exibição entre candidatos à prefeitura da maior cidade do país não pode virar folclore eleitoral.
Atirada pelo apresentador José Luiz Datena, constitui uma agressão política inaceitável, de particular relevância neste momento.
Para ir direto ao ponto: num país que já atravessou 20 anos sob as botas e fuzis do regime militar de 64, é bom não esquecer que golpes de Estado não caem do céu, mas costumam ser preparados através de provocações e pequenos incidentes, aparentemente casuais, que ajudam a desmoralizar sistemas democráticos para criar um ambiente de desgaste e desconfiança, capaz de abrir caminho para uma virada de mesa.
Foi assim no 31 de março de 64 e não há nenhum motivo para imaginar que, 60 anos depois, quando não faltam sinais de turbulência fascista noa conjuntura, o cenário seja essencialmente diferente.
Está em jogo, mais uma vez, a questão fundamental dos regimes políticos -- o respeito pela soberania popular, alvo permanente do imperialismo e seus súditos locais.
Como se vê hoje na Bolívia, no Peru, no Chile, toda nação possui particularidades de imensa importância -- mas a energia fundamental, que diz respeito aos direitos e reivindicações do povo, possui a mesma relevância em toda parte.
Em 2002, na disputa pelos governos estaduais do país, o fascismo pretende recuperar terreno perdido em pleitos passados, para construir bases estaduais e ganhar fôlego para tentar virar o jogo mais tarde, aproveitando-se das franquias democráticas sem lealdade nem pudor, como sempre.
Numa observação que seria tolo encarar como profecia, mas tem grande utilidade como reflexão sobre o presente, não custa lembrar que o golpe de 64 foi um movimento militar -- sustentado por um triângulo de governadores reacionários de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Todos civis.
Também vale recordar que, pelo mesmo caminho, a luta que levaria a democratização fez o percurso de volta, combinando a denúncia da ditadura nas campanhas pela Anistia com gigantescas lutas de trabalhadores no ABC e outras regiões do país.
Essa duradoura realidade política oferece um novo componente às campanhas pelos governos estaduais de outubro-novembro -- e só não vê quem não quer.
Alguma dúvida?
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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