Depois da CPI, Lira não segura mais Bolsonaro
"O fato é que a CPI nem bem começou a funcionar e já está entulhada de informações que devem comprometer cada vez mais o presidente, cuja queda se mostra a cada dia mais próxima", escreve Ribamar Fonseca
Apesar das manobras de Bolsonaro e aliados para inviabilizá-la, revelando um medo exagerado das suas possíveis consequências, a CPI da Pandemia foi instalada no Senado por determinação do Supremo Tribunal Federal. Percebe-se, no entanto, que o medo maior dessa turma – verdadeiro pânico – é do relator Renan Calheiros. Já recorreram até à Suprema Corte para impedir o senador alagoano de permanecer na relatoria da comissão, apresentando as mais diferentes justificativas, mas ao que parece seus esforços serão infrutíferos porque não há clima para o STF interferir na estrutura da CPI. Na verdade, a CPI já aprovou o roteiro de trabalho apresentado pelo relator, que programou ouvir em depoimento primeiro os ex-ministros da Saúde Henrique Mandetta, Nelson Tech e Eduardo Pazuello, seguindo-se o atual ministro Queiroga. O depoimento mais esperado – e que mais preocupa o Planalto – é o do general Pazuello.
A julgar pela ação dos senadores governistas na CPI, empenhados em dificultar os seus trabalhos, há um temor incontrolável de que a comissão possa descobrir alguma coisa capaz de acelerar o impeachment de Bolsonaro, de onde se conclui que deve haver algo muito grave bem escondido. Tornou-se visível o desespero que se instalou no Palácio do Planalto, onde ninguém consegue esconder o nervosismo na cúpula do governo, cujos reflexos podem ser sentidos nas declarações de ministros e do próprio Presidente. As intimidações embutidas na fala do general Braga Neto, ministro da Defesa, quanto a uma possível reação militar no caso de afastamento de Bolsonaro, aparentemente produziram um efeito contrário ao esperado, pois ao que tudo indica ele deverá ser convocado pela CPI para dar explicações a respeito. Está claro que ninguém quer largar o osso e, por isso, naturalmente fica nervoso quando se vê ameaçado, o que explicaria toda essa movimentação no poder.
Outro depoimento que preocupa o governo é o do ex-secretário de Comunicação Wajngarten que, em recente entrevista à revista Veja, acusou o general Pazuello de incompetente à frente do Ministério da Saúde. A convocação dele ainda não foi aprovada pela comissão, mas tudo indica que ele será mesmo chamado a contar o que sabe sobre a gestão de Pazuello, inclusive quanto à compra de vacinas da Pfizer. Com esses primeiros depoimentos, antes mesmo da investigação tomar embalo, já se terá uma visão dos rumos da CPI e dos estragos que ela causará ao governo Bolsonaro que, apesar da fanfarronice com relação ao apoio das Forças Armadas, está a cada dia mais isolado da tropa, que já não esconde seu desconforto com as frequentes ameaças do Presidente. Se a situação continuar evoluindo nesse ritmo não vai demorar muito e o capitão pode acabar repetindo aquele velho apelo do então presidente Collor, no auge do processo de impeachment, quando disse: “Não me deixem só!”
O chefe da tropa de choque governista na CPI, senador Ciro Nogueira, declarou recentemente que “essa CPI não vai dar em nada”. Muito mais do que uma previsão, no entanto, a declaração revela um desejo, pois a verdade é que as nuvens no horizonte estão assumindo uma cara de tempestade, que se mostrou mais carrancuda após a descoberta de que sete requerimentos apresentados pelos senadores aliados na comissão foram elaborados no Palácio do Planalto, o que escandaliza a interferência do Executivo nos trabalhos do Legislativo. O pânico parece ter dominado completamente o centro do poder, onde não mais se preocupam nem mesmo em esconder suas tramas, revelando seu empenho em sabotar a CPI e impedir que ela alcance seus objetivos. A esta altura, porém, será muito difícil estancar a marcha das investigações, que serão adubadas com as descobertas do STF sobre o gabinete do ódio e a indústria de fake news. A coisa tá ficando feia para as bandas do Planalto.
O fato é que a CPI nem bem começou a funcionar e já está entulhada de informações que devem comprometer cada vez mais o Presidente, cuja queda se mostra a cada dia mais próxima. Acuado mas tentando mostrar confiança, recentemente ele afirmou que só Deus o tira da cadeira presidencial. É claro que tudo só acontece com a permissão de Deus que, assim como permitiu a sua eleição, também permitirá a sua destituição. Na verdade, muita gente dentro e fora do país estranha que ele ainda esteja no poder, com seu criminoso negacionismo, sobretudo depois das 400 mil mortes causadas pela pandemia. O jornal francês Le Monde, por exemplo, não esconde sua surpresa não apenas com a permanência de Bolsonaro no Planalto mas, também, com a passividade do povo brasileiro, que parece ter sido anestesiado pela covid-19. O periódico francês também se surpreende pelo fato de Bolsonaro ainda desfrutar de alguma popularidade, apesar do seu desgoverno, de mais de 14 milhões de desempregados, da falta de ações mais efetivas no combate à pandemia, etc. E atribui a sua presença no governo a acordos com parte do Parlamento mais preocupada com seus próprios interesses.
De qualquer modo, segundo observadores, Bolsonaro não chegará ao fim do ano como Presidente, pois afora o centrão e um punhado de seguidores fanáticos, não tem mais sustentação. Até os evangélicos, que era a sua principal base eleitoral, já estão divididos, assim como o partido que o elegeu, o PSL, e os militares, descontentes com o tratamento humilhante dado a alguns generais, como Pazuello, por exemplo. Para completar, o atual chefe da Casa Civil, general Ramos, confessou recentemente que se vacinou escondido de Bolsonaro, o que revela, no mínimo, que ele intimida seus auxiliares, os quais para não perderem os cargos preferem submeter-se aos caprichos dele. E com isso ele vai transformando velhos aliados em inimigos, conforme é possível constatar diante do comportamento crítico de ex-auxiliares, como o general Santos Cruz e Sergio Moro, entre outros. A esta altura dos acontecimentos, diante do atual panorama, Bolsonaro já poderia estar se preparando para voltar para a Barra da Tijuca, de onde nunca deveria ter saído. Afinal, depois dessa CPI, Arthur Lira não mais terá condições de permanecer sentado sobre os mais de 100 pedidos de impeachment que deram entrada na Câmara dos Deputados.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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