Dessa vez é
Durante muito tempo se atribuiu a alguma doença psíquica os modos pessoais e o comportamento político do nazista que ocupa do Palácio do Planalto. Injustiça com as doenças desse campo, mas, talvez, a explicação mais simples para o absurdo que se apresentava despudorado, pornográfico. Ou, ainda, escape possível para olhar de frente o nazifascismo explícito, recusado até mesmo pelos que conheciam o fenômeno por meio e dedicação aos estudos sérios sobre o assunto ou vivência do fato.
Entretanto, dessa vez um acontecimento recente justifica a percepção de que há algo para além do que transita na esfera comum do considerado normal. No encontro que comemorou a aprovação do nome do ‘terrivelmente evangélico’ para assumir uma das onze cadeiras do Supremo Tribunal Federal, instância máxima do judiciário nacional, um elemento da família que preside a república militarizada do Templo de Salomão protagonizou a manifestação do distúrbio psicopatológico da Glossolalia.
Seguido ao instante em que a TV anunciou o placar de 47 votos a favor da nomeação pelo Senado, com 32 contra, uma fala embolada tomou conta do recinto completo por mulheres e homens de terno, todas e todos irmãos e irmãs unidos na igreja que tem por missão declarada ver o Reino de Deus estabelecido em toda a terra. Saltitando em fervor religioso, a mulher expressou-se na língua desconhecida tida de origem divina.
Glossolalia é um fenômeno de psiquiatria e de estudos da linguagem, em geral ligado a situações de fervor religioso, em que o indivíduo crê expressar-se em uma língua desconhecida, por ele tida como de origem divina. O verbete do dicionário Aurélio assim define Glossolalia: “fenômeno que pode ocorrer em situação de exaltação religiosa, caracterizado pelo comportamento de certos indivíduos que começam, espontaneamente, a falar línguas desconhecidas, tidas como frutos de dom divino, mas que, geralmente, são línguas inexistentes” Na psiquiatria, a glossolalia é identificada como um distúrbio de linguagem observado em certos doentes mentais que creem inventar uma linguagem nova constituída por neologismos e por uma sintaxe deformada.
Nada disso teria importância se a glossolalia não estivesse penetrando nas instituições públicas até então organizadas para servir ao funcionamento do Estado laico, que fala a língua conhecida por todas e todos, cidadãos e cidadãs que formam o conjunto da sociedade. A glossolalia só se dirige e se comunica com que possui o dom divino de compreende-la. No mais, é silêncio.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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