Dilma, primeira mulher a ocupar a presidência, foi e ainda é alvo da maior violência política da história do Brasil
Ex-presidente é atacada pela mídia, pela direita fascista, pelo "centro democrático" e até por setores da esquerda brasileira, aponta Leonardo Attuch
Num país ainda marcado pela desigualdade de gênero, a história segue manchada pelo golpe de estado de 2016 contra a ex-presidente Dilma Rousseff, primeira mulher a exercer a presidência da República no Brasil, eleita para o cargo em 2010 e reeleita em 2014.
Ex-ministra de Minas e Energia no primeiro governo Lula, Dilma teve papel decisivo na recuperação econômica, ao livrar o Brasil dos apagões legados por Fernando Henrique Cardoso e Pedro Parente. Após a demissão de José Dirceu, na crise do chamado "mensalão", Dilma assumiu a Casa Civil, liderou o Programa de Aceleração do Crescimento, coordenou grandes obras de infra-estrutura e preparou o Brasil para eventos internacionais, como a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016.
Escolhida como candidata em 2010, ela superou José Serra e chegou a alcançar níveis de aprovação de 70%, até ser alvo de uma violenta guerra híbrida, a partir das "jornadas de junho" de 2013, que visavam derrubá-la para que a renda do petróleo brasileiro fosse saqueada. Alvo de uma intensa campanha de ódio e desinformação na mídia dita profissional e também nas redes sociais, Dilma ainda assim conseguiu se reeleger em 2014.
Entretanto, o golpe de estado foi decretado no próprio dia de sua segunda vitória. O que se fez a partir daquele dia foi apenas a busca de um motivo que justificasse o estupro insticional, até que se construísse a farsa das "pedaladas fiscais". Pouco tempo depois, um parlamento dominado por corruptos e liderado por Eduardo Cunha festejava o "tchau, querida".
O que se viu desde o golpe foi um retrocesso gigantesco na luta das mulheres brasileiras. O papel da mulher passou a ser o da 'bela, recatada e do lar', simbolizado por Marcela Temer, que depois foi sucedida na posição de primeira-dama por Michelle Bolsonaro, hoje em destaque nos jornais por ser usada como laranja por um marido ladravaz no recebimento de propinas em diamantes. Um desclassificado que, no dia do golpe de estado, exaltou o torturador Brilhante Ustra, que seria o "terror" de Dilma Rousseff.
O que espanta na história brasileira é que Dilma ainda seja violentada não apenas pelos golpistas e pelos bolsonaros, mas até por setores da própria esquerda. Ainda não há uma resposta à altura para a fake news de que a recessão de 2015/2016 (que é dos golpistas, e não dela) foi tão profunda que até hoje não teria sido devidamente superada. Ou seja: ainda hoje, sete anos depois, os homens competentes estariam tentando resolver a suposta lambança legada por uma mulher na presidência. Fora isso, é também chocante ver como as agressões a Dilma ainda são repetidas até mesmo por mulheres em posições de poder na imprensa brasileira, que ascenderam nesta sociedade patriarcal e misógina prestando favores ao establishment econômico.
O que poucos dizem é que, desde a deposição de Dilma, o Brasil viveu o maior retrocesso econômico e social de sua história. Voltou ao mapa da fome, viu suas riquezas serem saqueadas e dilapidadas e vem sendo permanentemente estuprado, como no caso das duas maiores transferências de renda do andar de baixo da sociedade para a elite, que ocorrem com a taxa de juros do Banco Central e com os superdividendos da Petrobrás.
Com um estado falido, os retrocessos naturalmente também atingiram as políticas de proteção à mulher e não surpreende que os feminicídios tenham disparado na era Temer/Bolsonaro. Mas a violência contra as mulheres é resultado sobretudo da violência simbólica representada pelo maior estupro da história do Brasil, que foi o golpe de 2016. Se a primeira mulher a presidir o Brasil pôde ser derrubada de forma tão vil por homens tão canalhas, sem que tenha havido uma reação à altura contra os golpistas, toda e qualquer mulher ainda pode vir a ser colocada no seu "devido lugar".
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