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    Ângelo Cavalcante

    Economista, cientista político, doutorando na USP e professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG)

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    Dos bons amigos

    Já não me surpreendo com o amplo rol de bizarrices e que essa turma propagandeia por aqui e, de verdade, não os culpo por carregarem nos juízos um amplo amontoado de cacos políticos, éticos e morais da pior estirpe

    amizade, aperto de mãos (Foto: Ângelo Cavalcante)

    A imensa maioria dos meus amigos de infância se converteram em direitistas convictos; a maior parte daqueles amigos do futebol de rua, da arte na escola ou do grupo de jovens da igreja são hoje, militantes, imaginem isso, voluntários do liberalismo mais torpe e ortodoxo que se possa imaginar.

    Eles, os meus amigos, seguem gente boa! São bem humorados, pregam peças e possuem excelentes conversas. O problema é quando se lançam a falar de política, direitos humanos, socialismo, justiça social e termos afins, aí... O "caldo entorna".

    Mas me saem com cada uma de arrepiar os cabelos! Me lembro que teve um que defendeu com assustadora convicção que os "Sem-Terra" devem ser fuzilados em praça pública; outro me contou, todo choroso, de que o Brasil já é um país comunista e; um outro, muito querido, só vê saída para o país com a eleição de Bolsonaro.

    Procuro entender de onde veio tanto ódio; tanta mágoa e atraso político mas, confesso, que interpretar esse imenso caldo de reacionarismos não é tarefa fácil e, pior, analisar aqueles que nutrimos bons afetos é mais grave e difícil ainda.

    Mas, pensar é preciso, e quem são meus amigos de infância? Bom... Jamais tive amigos ricos, com exceção de um ou outro com melhores condições, todos são filhos de trabalhadores assalariados; de camponeses e; de trabalhadores informais. Normalmente oriundos de famílias numerosas cujas origens remontam os interiores do país, com destaque para Goiás e Norte/Nordeste.

    Linhas gerais, eram negros e mestiços; protestantes ortodoxos e católicos praticantes e jamais se envolviam de forma mais efetiva com questões políticas. Quase não me recordo de nenhum deles em grêmios estudantis ou em atividades culturais diferenciadas; Meus amigos?

    Meus amigos foram forjados em mundos muito patriarcais, de muita hierarquia, punição e carências materiais, sobretudo.

    Sempre que posso acompanho suas posições políticas nestas redes sociais. Já não me surpreendo com o amplo rol de bizarrices e que essa turma propagandeia por aqui e, de verdade, não os culpo por carregarem nos juízos um amplo amontoado de cacos políticos, éticos e morais da pior estirpe, da pior tradição e traição de classe, da mais nítida impiedade para com pobres e desafortunados desse país perverso e o mais estranho, reconheço que sigo gostando dessas "peças" da mesma forma!

    É convivência de difícil trato posto que respeito pressupõe reconhecer e mais ou menos silenciar ante ao absurdo alheio considerando que a partir dessa convenção social, o outro tem o "direito" de anunciar o que lhe convém e da maneira que lhe for mais oportuna.

    O que meus amigos se esquecem (se é que aprenderam isso algum um dia!) é que as liberdades de expressão, manifestação ou comunicação só podem ser, de fato, exercidas se promoverem o outro, a diversidade humana, os direitos humanos, a igualdade e a justiça.

    Toda essa parafernália de direitos e possibilidades ganha algum sentido real se somados a esforços históricos no combate a maldade humana, a violência contra pobres e despossuídos, a opressão e perversão contra a imensa maioria das pessoas desse planeta arrasado. Por isso existe o direito, para isso existem expedientes como o exercício da liberdade de posições políticas, religiosas ou intelectuais. Não é pra "ferrar" o que já está muito ruim mas é para dar alguma chance para a vida.

    Em outros termos, essas conquistas civilizacionais foram pensadas não para regredirmos como povo ou sociabilidade mas, ao contrário, para avançarmos em nossa difícil experiência de existirmos como seres humanos e que vivem com outros seres humanos.

    Mas, confesso, não os culpo. São expressões de um tempo, revelam um tempo e mais até... São, em si, um tempo de carências, violências e muita repressão.

    Seria estranho afirmar que essas formações mentais possuem relação direta com a trágica história brasileira? Com esse modelo econômico desumano e superado? Com esse tipo estatal classista e autocrático? Certamente que não! Amigos seguem importantes!

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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