É necessário reinterpretar Karl Marx
O cenário descrito por Marx no século 19 permanece atual no século 21. A pergunta necessária para o momento é: quando nos reconheceremos como classe e lutaremos contra o brutal avanço do neoliberalismo?
Que o neoliberalismo vem se alastrando e dominando áreas periféricas do globo nesse século 21, isso não é novidade para ninguém. Desde a década de 1980, quando Margareth Thatcher e Ronald Reagan propuseram a reinterpretação do liberalismo clássico, enxugando o Estado e atribuindo o mérito do desenvolvimento econômico à iniciativa privada, esse modelo economicista vem sendo usado como engodo à população latino-americana por parte das elites do mercado. De acordo com os intelectuais que defendem tal modelo, o crescimento da presença do Estado na economia entra em conflito com as liberdades individuais, criando assim grandes problemas para o progresso econômico das nações.
Porém, há de se levar em consideração que a lógica do mercado não é saudável nem humana com as classes menos favorecidas. O discurso neoliberal perpetua desigualdades sociais ao resgatar a nefasta ideologia do darwinismo social, propondo que o mercado seja virtuoso e o Estado corrupto, justificando a total entrega do patrimônio público à iniciativa privada, como se esta fosse isenta de corrupções, de arranjos e de conluios em prol do benefício individual. Países desenvolvidos seriam aqueles onde há liberdade de atuação das grandes corporações, enquanto os subdesenvolvidos seriam aqueles onde o Estado é o agente promotor de ações coletivas e assistencialistas, sendo corroído em suas entranhas por políticos corruptos e mal-intencionados. É preciso ressaltar que essa classificação é extremamente reducionista, sendo reproduzida por todos sem uma reflexão crítica sobre essa falácia.
Por vezes, caímos nesse discurso como patos e esquecemos que o Brasil é um país que, como diz o grande sociólogo e professor Jessé Souza, teve como berço a escravidão. Que a maior parte da sua sociedade é negra e pobre. Que os conflitos de classe permanecem imanentes à sua estrutura social e que o Estado precisa se ater a esses conflitos, promover ações inclusivas, ser agente promotor da democracia e do bem-estar social. O mercado não se importa com nada disso, já que sua áurea é o lucro e o individualismo. Por isso, o neoliberalismo condena o Estado, já que este seria seu maior rival na luta pelo domínio das sociedades.
É necessário percebermos que o Estado brasileiro, que deveria se ocupar de reduzir essas desigualdades, abre as portas e estende tapete vermelho ao mercado no governo golpista de Michel Temer. Como escrevi nesta coluna na semana passada, a Kroton Educacional vem "nadando de braçada" no balcão de negócios que virou a educação brasileira. Estatais vêm sendo privatizadas, como a Eletrobrás, sob o discurso de "ajuste fiscal". A reforma trabalhista sucateou ao máximo o trabalho formal, ampliando os poderes dos patrões sobre seus empregados, destituindo dos trabalhadores o poder de barganha, além de reduzir a atuação dos sindicatos a meros coadjuvantes nas relações empregado-empregador. A luta de classes permanece intensa e o trabalhador, neste momento, sofre as duras consequências da provisória vitória do projeto neoliberal.
Ontem comemoramos os 200 anos de Karl Marx, o pensador mais influente da era contemporânea e o que melhor soube interpretar o capitalismo. Marx revolucionou a esfera do pensamento crítico ocidental ao propor reflexões que até hoje são necessárias para compreender a estrutura das sociedades dominadas pelo capital. Foi ele quem denunciou a grande exploração do proletariado e a necessidade deste se reconhecer como classe e buscar se estabelecer no poder afim de abolir a dominação a ele submetida.
O cenário descrito por Marx no século 19 permanece atual no século 21. A pergunta necessária para o momento é: quando nos reconheceremos como classe e lutaremos contra o brutal avanço do neoliberalismo?
Não conseguimos entender o Brasil e o mundo sem reconhecer suas classes, suas relações e estruturas econômicas, assim como suas ideologias dominantes. Por isso, não conseguimos entender a realidade que nos rodeia sem conhecer as ideias de Karl Marx.
Em momentos de crises, como a que estamos vivendo, é necessário ler e reinterpretar os clássicos. Por isso, reler Marx nunca foi tão necessário e urgente.
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