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    Rubinho Giaquinto

    Ex-covereador da ColetivA-BH, guitarrista, escritor e professor. Graduado em Licenciatura Educação Musical (UEMG). Foi assessor da Coordenadoria para Assuntos da Comunidade Negra da Secretaria Municipal de Direitos de Cidadania de Belo Horizonte. Coordenou o “Movimento dos Sem Palco”, articulando artistas do Hip-hop, rock, literatura e samba da periferia de Belo Horizonte. Coordenador dos Fóruns Pró-Trabalho na questão racial, pessoas com Deficiência e Juventude do Ministério do Trabalho.

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    É o meu guri!

    "Meu guri com cara de fome e de craque de futebol. Tinha as pernas tortas. Olhei e disse: vai ser camisa 9 da seleção brasileira, igual ao Ronaldo Fenômeno"

    (Foto: Ricardo Flaitt)

    Era um dia chuvoso e melancólico. Estava sozinha no meu quartinho, que era no fim da rua e perto do córrego. Naquele dia só tinha um pão dormido, um terço, um patuá e o dinheiro contado do ônibus para ir até a maternidade pública, que ficava do outro lado da cidade. E o pai do meu guri ainda me bateu, falando que o filho não era dele. Não deixei barato e rasguei lhe toda a cara do safado. O estrago foi tanto que ficou jogado atrapalhando trânsito por horas no beco da viela do seu Raimundo sapateiro. 

    Meu guri com cara de fome e de craque de futebol. Tinha as pernas tortas. Olhei pra ele e disse: vai ser camisa 9 da seleção brasileira, igual ao Ronaldo Fenômeno. 

    Ele cresceu rápido e virou meu companheirinho. Nunca gritou comigo ou fez alguma malcriação. Ao contrário, era um bom guri. A gente foi levando juntos. Ele e eu. Ele um dia me disse:

    - Mamãe, um dia chego lá! 

    Eu gritei toda alegre:

    - Na seleção brasileira! Quero comemorar seu gol, meu filho amado! 

    Era trabalhador pra caramba. Chegava suado todo dia do batente. Que guri da hora, meu Deus! Obrigada, meu são Sebastião. Obrigada, meu Oxóssi. Nunca chegava de mãos abanando. Sempre trazia um presente. O último presente foi um bolsa muito da chique e bonita. E o melhor de tudo, a bolsa já estava com tudo dentro: chave, caderneta, uma bíblia, uma simpatia pra arrumar namorado e até um celular, desses mais modernos. O meu guri é espetacular!

    Não parava em casa, nem um minuto. Sempre no batente. Nunca mais comi sem carne e verdura. Ele trazia até fruta. Trazia uva e fruta do conde, que eu adorava comer depois do almoço. Domingo sempre tinha churrasco ou frango assado e minha cervejinha gelada que era de “lei”. 

    Uma vez, ele ficou mais de um mês fora. Chegou muito alegre e sorridente. Disse que foi fazer teste em um time de futebol do interior. Chegou com a cabeça raspada e uma camisa branca com um número esquisito atrás. Já trouxe a compra do mês e com uma surpresa junto de presente: um relógio de ouro. Disse que foi o presidente do time que deu pra ele, e ele me deu. Olha aí, meu guri! Homem feito e trabalhador. Disse que iria ficar mais um mês fora para tentar outro time. Um time grande. Eu peguei a rezar pra ele. Fiz até promessa. 

    Num sábado de manhã, o moço que vendia jornal no bairro me trouxe o jornal de graça, com meu guri estampado na capa e vestido com a camisa do Flamengo, caído na grama bem verde e alta, sorrindo e de óculos na cara, que tampavam todo o seu rosto. Eu não entendo essa gente, seu moço, fazendo alvoroço demais.

    - Olha aí, moço! Olha aí, moço! É o meu guri! Ele disse que chegava lá!  Ele chegou! É o meu guri! 

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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