Ednardo: 50 anos de canções
Uma noite única, completamente diferente das demais
As lojas já cerraram as portas. É noite no centro de Fortaleza. Os humilhados e ofendidos se abrigam sob as marquises que lhes servem de teto. São muitos. Inúmeros. A Praça do Ferreira, o coração da cidade, acolhe todos aqueles que durante o dia são invisíveis aos transeuntes, cujos olhares estão quase sempre voltados para o lado. Na rua lateral, uma fila se forma. Alguém serve sopa. Carros chegam. Pessoas descem apressadamente e caminham, quase correndo, em direção ao Cineteatro São Luiz. Haverá um show. Não há mais ingressos. A imponência do prédio construído por Luiz Severiano Ribeiro no ano de 1939 e inaugurado em 1958, quase nos faz desgrudar os olhos da fila da sopa.
A mesma noite que cai sobre “o feliz poeta” também cai sobre “o esfomeado”. “Ah, mundo tão desigual/tudo é tão desigual”. Os clássicos letreiros do Cineteatro anunciam o show: Ednardo: 50 anos de canções. Entramos. A arquitetura interna do prédio, com suas escadarias, pisos e lustres já é por si só um espetáculo magistral. Olho para trás, e pela porta de vidro ainda vejo umas crianças brincando com seus cachorros caramelos. O serviço de som do teatro avisa que é proibido fumar, comer, fotografar e filmar. Três avisos sonoros indicam que o show vai começar. As luzes se apagam. Abrem-se as cortinas. A banda já está a postos. Os primeiros acordes de Ingazeiras ressoam na mais bela casa de espetáculos de Fortaleza.
Andando lentamente, adentra ao palco o lendário cantor e compositor Ednardo, que é ovacionado de pé pelo público, o que se repetirá outras vezes durante o show. Enquanto canta Ingazeiras, atrás de si o telão mostra imagens da obra de Aldemir Martins (1922 – 2006), nascido no município de Ingazeiras, interior do Ceará. Outro ponto alto dessa relação entre música e imagens se dá quando o artista entoa Artigo 26, e imagens relacionadas à Padaria Espiritual, agremiação literária surgida em Fortaleza, em 1892, inundam a tela; assim como aquelas que mostram o autor de Pavão Mysteriozo caminhando pela Praia de Iracema ou ainda o artista plástico Ednardo no exercício da pintura.
Em uma hora de espetáculo, Ednardo cantou seus mais conhecidos sucessos, clássicos da Música Popular Brasileira. Cantou ainda canções de artistas que o antecederam, bem como a belíssima “De areia e vento”, composição em parceria com Tânia Cabral, composta nos anos 70, mas lançada apenas este ano. “Longarinas”, “Beira Mar” e “Terral” já são tão parte de Fortaleza como o sol e o mar, e foram cantadas em uníssono por um público encantado com o que via e ouvia. Ao voltar para o bis, Ednardo canta Enquanto engoma a calça. Em nós, um gosto de quero mais foi ficando. E a noite enfim findando, única, completamente diferente das demais. E nada mais.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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