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    Jeferson Miola

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    Eles ainda estão aqui

    "Nossa democracia vive sob ameaça permanente da intervenção fardada", escreve Miola

    Presidente Lula e militares (Foto: Ricardo Stuckert/Pr)

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    Bolsonaro só chegou aonde chegou e o Brasil quase mergulhou numa ditadura feroz porque os militares criaram as condições para isso.

    Por um triz não houve uma mudança de regime; faltou muito pouco. Se a conspiração tivesse sido exitosa, o Brasil submergiria numa ditadura militar terrível.

    A trama golpista foi urdida no Planalto e na caserna, com envolvimento central de generais do Alto Comando do Exército e da alta oficialidade das três Forças. Não por outra razão 25 dos 37 indiciados inicialmente pela Polícia Federal são oficiais militares.

    O empreendimento golpista era um meio para o objetivo final – a concretização do projeto de poder militar acalentado pelas cúpulas partidarizadas das Forças Armadas, sobretudo por aqueles setores do porão do velho regime que nunca aceitaram a transição lenta, gradual e segura, e, tampouco, o fim da ditadura, porque desejavam um “regime eterno”, pois entendem que os paisanos são incompetentes, corruptos e incapazes de conduzir os destinos do país.

    A mobilização institucional em torno de tal projeto de poder remonta há pelo menos 10 anos, senão ainda mais, no contexto da desestabilização política que culminou no impeachment fraudulento da presidente Dilma.

    Não se deve esquecer que a candidatura de Bolsonaro para a eleição presidencial de 2018 foi lançada num mini-comício na AMAN, Academia de Agulhas Negras, em 29 de novembro de 2014, quando comandava aquela unidade o atual Comandante do Exército, general Tomás Paiva.

    Comandantes foram condescendentes com os acampamentos nas áreas dos quartéis e com os oficiais que bradavam pela intervenção militar. No mínimo prevaricaram diante das articulações golpistas, inclusive quando receberam a minuta do golpe.

    Estes mesmos comandantes abandonaram seus postos em 30 de dezembro de 2022 porque se recusaram a prestar continência ao presidente Lula, eleito pela soberania popular para ser comandante supremo das Forças Armadas.

    Um gesto de grave insubordinação. Em democracias minimamente funcionais, sediciosos são presos e expulsos das Forças Armadas.

    Mas hoje, contudo, estes comandantes são incensados, considerados heróis salvacionistas que protegeram nossa democracia, embora se saiba que a objeção de Washington ao golpe produziu fissuras no Alto Comando do Exército, fator que quebrou a unidade institucional em torno do empreendimento golpista – “cinco [generais] não querem [o golpe], três querem muito e os outros, zona de conforto. É isso. Infelizmente”, contabilizou um coronel.

    A despeito deste retrospecto, contudo, a mídia uníssona destaca que Bolsonaro “planejou, articulou e liderou a tentativa de golpe”.

    É uma narrativa conveniente para os militares, porque descarrega toda a responsabilidade criminal nos ombros do ex-presidente, enquanto oculta a atuação intelectual e orgânica da instituição militar e de seus altos comandos hierárquicos no projeto golpista.

    O descarte de Bolsonaro e de alguns militares como bodes expiatórios estava no horizonte do planejamento militar; era apenas questão de tempo e oportunidade. E este momento chegou.

    A provável condenação e prisão de uma parte daqueles militares golpistas é um fato inédito na vida republicana, e possui enorme valor histórico.

    Isso, apesar de relevante, ainda é insuficiente para acabar com a ameaça permanente que os militares representam à democracia. Ao arvorarem um “Poder Moderador”, eles tutelam a política e impõem o que o poder civil deve –e pode– fazer.

    O poder de tutela dos militares não acabou com o fim da ditadura. Eles ainda estão aqui, dando as cartas e mandando no jogo.

    Na saída da ditadura, impuseram a Lei da Anistia para ficaram impunes e aumentaram o mandato de Figueiredo, o último ditador, para seis anos. Garantiram uma transição conservadora e controlada, impediram as Diretas Já e impuseram a eleição indireta para presidente no Colégio Eleitoral.

    Na Constituinte, impuseram a dubiedade do artigo 142 na Constituição, que serve de pretexto para a intervenção militar.

    Conspiraram com Temer a derrubada da Dilma e mandaram o STF prender Lula, deixando livre o caminho para a eleição da chapa militar Bolsonaro/Mourão.

    Fracassados no intento de golpe, escolheram para ministro da Defesa do governo Lula 3 um fiel representante dos seus interesses.

    E, agora, estabeleceram um cordão sanitário limitando as condenações de apenas alguns golpistas, não todos, inclusive integrantes do Alto Comando, para livrar a responsabilidade institucional das Forças Armadas, sobretudo do Exército.

    Nossa democracia vive sob ameaça permanente da intervenção fardada – desde, pelo menos, 1889, quando do nascimento da República por meio de um golpe militar.

    Como alerta o professor Manuel Domingos Neto, enquanto os militares não forem governados por quem é eleito pela soberania popular, eles continuarão governando quem não lhes governa.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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