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    Fernando Castilho

    Arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada

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    Eles não estão pra brincadeira

    Não estar para brincadeira significa que Bolsonaro e seus aliados são capazes de tudo para voltar ao poder

    Ato bolsonarista na Avenida Paulista (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

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    1 – Bolsonaro quis uma foto de seus seguidores na Av. Paulista.

    Não havia como prever se a manifestação fracassaria ou seria um sucesso, mesmo assim, ele arriscou. E foi mesmo um sucesso.

    Mas, o que o ex-presidente pretendia com isso?

    Duas coisas. A primeira, demonstrar força junto ao Congresso e ao STF para sua pretensão em obter uma anistia e se livrar da cadeia.

    Segundo, manter acesa a chama de uma futura tomada de poder. Guardemos isso para o final.

    2 – A manifestação teve caráter religioso. A ex-primeira-dama, Michelle, defendeu publicamente a mistura entre política e religião, desrespeitando a Constituição no que diz respeito ao Estado ser laico.

    3 – Lula, em entrevista, além de reconhecer que a manifestação foi grande, afirmou que “eles não estão para brincadeira.”

    Não estar para brincadeira significa que Bolsonaro e seus aliados, sejam senadores, deputados, governadores ou bolsonaristas-raiz, são capazes de tudo para voltar ao poder. E entenda-se que “tudo” significa chegar a extremos que nem imaginamos agora, mas que podem nos surpreender no futuro. Rir e fazer memes das três idosas que acham que Israel é um país cristão ajuda a desopilar o fígado após assistir ao espetáculo macabro do domingo, porém há uma mensagem na fala delas que preocupa e muito: há um alinhamento irracional com Israel imune a qualquer argumento em contrário. E isso nada tem a ver com religião, mas sim, com o movimento a nível global pela direitização do planeta.

    4 – Lula ainda afirmou que essa onda extremista de direita está tomando a América Latina e a Europa, outra verdade.

    A extrema direita se fortalece cada vez mais e não está desorganizada. Muito pelo contrário. Todos os dias vemos o que Javier Milei está fazendo na Argentina.

    Donald Trump, apesar de ter feito uma tentativa de golpe nas últimas eleições nos Estados Unidos, por não ter se tornado inelegível, aparece com vantagem sobre Joe Biden, mesmo este tendo aumentado o poder de compra e reduzido o desemprego. A economia dos EUA, apesar de terem sido gastas fortunas com a guerra da Ucrânia, vai muito bem, mas Trump seduziu grande parte da população com seu estilo troglodita e isso não parece ter volta a curto prazo.

    No Brasil, parece acontecer coisa semelhante. Em apenas um ano de governo, Lula revigorou o Brasil, captou investimentos estrangeiros, reduziu o dólar, a gasolina, os preços dos alimentos, o desemprego, aumentou o Bolsa Família, o salário mínimo e retomou programas sociais como Minha Casa, Minha Vida. Porém, o canto da sereia de Bolsonaro continua a causar danos cognitivos em um terço da população.

    Vamos alinhavar.

    Dito tudo isso, é de se perguntar: afinal, o que a extrema direita pretende?

    Não, ela não está somente disputando poder com uma ideologia excludente e truculenta. Ela está aí para destruir a democracia.

    É disso que o livro Como as Democracias Morrem, de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt trata.

    É urgente que todos os democratas, sejam eles progressistas, mas também da direita civilizada que ainda não se deixou corromper pelas ideias fascistas, que trabalham com a política, sejam parlamentares, sejam membros do poder Executivo, intelectuais, jornalistas e sindicalistas, além de movimentos sociais, compreendam que a democracia quase que no mundo inteiro vem sendo corroída por dentro, através de gente que se elege utilizando-se dela.

    É assustador que o Estado brasileiro possa se tornar uma teocracia, como prega Michelle Bolsonaro.

    É assustador imaginar a possibilidade de um Silas Malafaia se eleger o primeiro presidente pastor e o que ele poderá fazer depois de eleito.

    É horripilante imaginar um ministério composto por Marco Feliciano, Magno Malta e Sóstenes Cavalcante.

    A Teologia da Libertação, que teve origem nos anos 60, praticamente não mais existe. A Teologia da Prosperidade, pregada pelas igrejas neopentecostais, só existe ainda porque rende muito dinheiro a seus pastores que se tornaram bilionários. Porém, uma nova doutrina, a Teologia do Domínio, evolução da corrente norte-americana do dispensacionalismo, começa a ser colocada em prática. Provavelmente coexistirá com a Teologia do Domínio.

    Essa teologia se propõe a, aos poucos, substituir o Cristianismo do Novo Testamento por figuras do Velho Testamento, principalmente o Rei Davi.

    Explica-se.

    Cristo dividia o pão e dizia que os ricos não iriam para o Reino do Céus. Era quase um socialista. Pregava ainda que devemos ser pacíficos e dar a outra face quando somos ofendidos.

    Isso sempre incomodou os pastores evangélicos porque expunha uma contradição com suas atitudes e comportamentos, embora os fiéis, em sua maioria, não se apercebam muito disso. Não ornava.

    Durante a campanha presidencial de 2018 vimos pastores ostentando fuzis e fiéis fazendo arminha com os dedos dentro de igrejas. Ficamos indignados com isso, mas era só o começo. Aos poucos as contradições foram diminuindo ao mesmo tempo em que as escrituras do Novo Testamento que nos ofereciam um Deus bondoso, foram sendo esquecidas nos cultos para darem lugar ao enaltecimento dos feitos do Rei Davi e outros líderes que serviam aos exércitos de Deus. O mal, então, passa a ser banal.

    Nada de caridade. Nada de dividir, nada de perdoar. Agora será preciso, cada vez mais, tomar aquilo que se julga de direito, ser individualista e seguir a linha do olho por olho e dente por dente.

    Certamente a Teologia do Domínio prega o que o próprio nome diz. O domínio consiste em subjugar no mais fraco ou o que não concorda com ele.

    Seria necessário que militares apoiassem a teologia?

    Não necessariamente, pois ela seria implantada aos poucos, passando primeiro pela eleição do maior número de parlamentares e governadores e, em seguida, pelo aparelhamento de instituições.

    Nenhum projeto coerente com essa teologia seria aprovado, o que algemaria o Executivo.

    Dominado o governo, seria o momento da destruição das instituições, do Estado Democrático de Direito, das eleições e da Democracia como um todo.

    Não sabemos se Bolsonaro tem plena consciência disso, afinal, ele não parece capaz de urdir, muito menos liderar, qualquer plano que dê minimamente certo. Portanto, é mais provável que esteja sendo manipulado por seu filho Eduardo, este sim, participante do movimento internacional que conecta o mundo todo, chefiado por Steve Bannon, o teórico da extrema direita.

    Teremos eleições municipais este ano e, certamente muita gente desse naipe se apresentará ao eleitor com a cara mais lavada.

    É para ontem fortalecer os movimentos sociais, esclarecer os sindicatos, contatar a imprensa progressista, enfim, toda a esquerda para iniciar a resistência a esse plano e, em seguida, o ataque a ele.

    Isso começa com o sufocamento de qualquer iniciativa de anistia aos golpistas.

    Começa também com o indiciamento e prisão dos financiadores e idealizadores do golpe, passando pelos parlamentares bolsonaristas que continuam o processo golpista.

    Além disso, sabemos que grande parte dos que acamparam nos quartéis e que estiveram presentes no dia 8 de janeiro de 2023, lá compareceram insuflados por pastores como Malafaia, Edir Macedo et caterva.

    Cabe ao Ministério Público mandar investigar os cultos cuja finalidade foi desviada, para prender esses pastores golpistas que enriquecem com dinheiro suado alheio e não pagam um centavo de imposto.

    Só assim, talvez, consigamos destruir o fascismo no Brasil.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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