Em Fortaleza, Luizianne sobe no palanque e reforça: Mulher não vota em André
"Com o apoio de Luizianne, o temor de uma gestão marcada pelo negacionismo, fundamentalismo e fascismo se dissipa", escreve Sara Goes
O termo alencarino se aplica a alguém natural do estado do Ceará e deriva do nome do escritor cearense José de Alencar, um dos maiores ícones da literatura brasileira. Marcelo Uchôa, advogado, professor e articulista do 247, prefere subverter esse significado. Para ele, alencarino deveria se referir à avó do romancista, Bárbara de Alencar, conferindo ao termo uma nova camada de simbolismo, ligada à luta revolucionária e ao espírito republicano que ela representava. Assim como os nordestinos conseguiram subverter seus próprios mitos — como Lampião, originalmente marcado pela violência miliciana, mas hoje visto como símbolo de valentia, e Maria Bonita, sua companheira sequestrada e violentada, que se tornou símbolo da força das mulheres nordestinas — o termo alencarino também pode passar por uma releitura nesse contexto. Eu topo. Essa subversão destaca uma figura política e histórica que valoriza figuras de resistência no Brasil, que curiosamente nunca alcançou a popularidade de seu neto. O fato de José de Alencar ter seu nome eternizado como o símbolo cultural do Ceará, enquanto sua avó revolucionária é menos lembrada, revela nuances com similaridades na política cearense atual.
Nas eleições municipais de 2024, a pesquisa Datafolha, divulgada no dia 10 de outubro, revela um cenário de empate técnico e, por pouco, um empate numérico, no segundo turno, com André Fernandes (PL) alcançando 47% das intenções de voto e Evandro Leitão (PT) 45%. Essa disputa acirrada reflete não apenas a força dos candidatos, mas também o papel crucial da militância alencarina, conhecida por sua capacidade de mobilização e experiência nas trincheiras da política.
De um lado temos na política local, o cirismo que já foi a força dominante no Estado, agora em queda livre, encolheu drasticamente de 67 prefeituras para apenas cinco em quatro anos. A figura de Ciro Gomes carrega consigo, um legado de machismo ao desqualificar publicamente lideranças femininas como Marina Silva, Dilma Rousseff, Luizianne Lins e mais recentemente a senadora Janaína Farias (PT), além de ter articulado contra a candidatura de Izolda Cela — um episódio que merece uma análise separada. A exclusão de seu candidato do segundo turno em Fortaleza evidencia essa decadência, algo que o próprio Ciro já admitiu. O problema de Ciro nunca foi ter ido a Paris em 2018, mas ter retornado para deixar um rastro de ódio. A prova disso está no fato de que, mesmo sendo vítima de sua truculência política, Izolda Cela enfrentou as consequências desse ressentimento, sofrendo múltiplas violências políticas em Sobral que culminaram em sua derrota. De outro lado Capitão Wagner, candidato pela União Brasil também embarcou para a terra mágica da neutralidade política, sem surpreender ou desapontar. Nessa conjuntura, as forças políticas começam a se mobilizar em diversos tipos de apoio: críticos, oportunistas e alguns realmente genuínos. Sobre este último, destaca-se o rápido e comovente apoio do PSOL, que organizou um evento com o candidato da legenda, Técio Nunes e partidários.
Dentro do PT Luizianne Lins (PT) sempre foi alvo de cobranças, como eu previ em outro artigo. A deputada foi insistentemente chamada a se posicionar no segundo turno, enquanto outros ex-prefeitos, Ciro Gomes e seu afilhado José Sarto, parecem ter a liberdade de se afastar do debate sem grandes repercussões além do casualismo. A divulgação da pesquisa Datafolha ontem (10) gerou uma repercussão animada da militância petista e Luizianne se viu obrigada a esclarecer, por meio de suas redes sociais, que naquele momento não havia ainda declarado pessoalmente apoio à Evandro Leitão. Já hoje (11), a deputada federal e ex-prefeita de Fortaleza confirmou com exclusividade ao Diário do Nordeste que estará presente no ato do partido ao lado do presidente Lula, na Praça do Ferreira, e explicou que sua decisão ocorre pelo “risco de Fortaleza ser governada por um fascista”. A exemplo das biografias de José e Bárbara de Alencar, fugir da luta parece ser um privilégio masculino.
As mulheres, que compõem cerca de 55% do eleitorado de Fortaleza, podem ser o maior obstáculo para o crescimento político de André Fernandes. Suas posturas misóginas, incluindo declarações violentas sobre estupro e feminicídio, têm gerado forte rejeição. Durante o programa Roda Viva de ontem (10), Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva, destacou que as mulheres desempenham um papel crucial nas eleições, equilibrando disputas entre candidatos progressistas e de extrema direita. O PT e a militância, cientes dessa dinâmica, intensificaram a campanha “Mulher não vota em André”, relembrando nas redes sociais os momentos mais problemáticos do candidato.
A questão que se colocava até então é se o PT no Ceará, já marcado por divisões internas e sua própria cota de violência política de gênero, conseguiria mobilizar sua base e impedir uma vitória da extrema direita, pois caso falhasse a derrota não será apenas do partido, que já recebeu uma amarga lição de Luizianne Lins, mas também um golpe contra a própria civilidade e mais um golpe contra as alencarinas. Com o apoio de Luizianne o temor de uma gestão marcada pelo negacionismo, fundamentalismo e fascismo se dissipa.
Assim como os nordestinos releram e transformaram figuras históricas, o cearense também tem a habilidade de realizar novas leituras no presente. Neste caso, pode muito bem transformar o até então desconhecido Evandro Leitão em um verdadeiro petista, conferindo-lhe uma nova identidade política. Fortaleza, com sua militância aguerrida composta por tantas Bárbaras de Alencar, enfrenta mais um desafio decisivo e, como sempre, será essa força coletiva anônima e predominantemente feminina que determinará o desfecho da eleição.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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