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Alex Solnik

Alex Solnik é jornalista. Já atuou em publicações como Jornal da Tarde, Istoé, Senhor, Careta, Interview e Manchete. É autor de treze livros, dentre os quais "Porque não deu certo", "O Cofre do Adhemar", "A guerra do apagão" e "O domador de sonhos"

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Eu queria ser Washington Olivetto

Mas minha turma demonizava os “filhos de Goebbels”

Washington Olivetto (Foto: Divulgação via G1)

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Tomei um susto ao saber que Washington Olivetto morreu. Eu tinha para mim que ele estava vivendo uma doce vida em Londres, de onde escrevia para “O Globo”, sem compromissos, sem agenda e sem preocupações, a não ser como gastar a fortuna que ganhou em sua brilhante carreira de publicitário de fama mundial. 

Eu o imaginava nos melhores restaurantes, visitando museus, cumprimentando astros do rock no camarim, passeando em iates, essas coisas de quem não tem o que fazer.

Pode-se dizer o que quiser de Olivetto, mas nenhum publicitário brasileiro teve (e suspeito que jamais terá) a sua projeção internacional e isso não se deve à propaganda que fazia de si próprio e que virou piada que um dia contei a ele e perguntei se era verdade. 

O cara era um dos maiores frasistas do país, seja nos comerciais, nas entrevistas ou nas conversas do dia a dia. Não gastava palavras à toa. Usava-as como um esgrimista. 

Eu o entrevistei várias vezes, tínhamos amigos em comum, mas nunca convivi com ele a ponto de confessar que eu tinha uma profunda inveja dele. 

Eu queria ser Washington Olivetto.

Tal como ele, eu sonhava em fazer anúncios. Certa vez, aos doze anos, acho, “fiz” um “jingle” para a Brahma, uma coisa tosca que terminava com o slogan “tome Brahma e deite na cama”, que nunca, é claro, mostrei para algum publicitário. 

Anos depois, já perto dos vinte, fundei com mais três amigos uma produtora de comerciais, batizada, por ideia de um deles, meu grande amigo Roman Stulbach, de “Sobreimpressão”. Não tinha como dar certo com um nome como esse. E não deu mesmo.

Eu tinha outra coisa em comum com ele, também morei no bairro da Lapa, mas seguimos por veredas diferentes, minha turma de amigos demonizava publicitários, rotulava-os “filhos de Goebbels”, estávamos na ditadura militar, então eu não podia ser publicitário e pertencer à turma, e enquanto isso, na mesma idade, Washington, que ganhou esse nome porque seu pai era fã do presidente Washington Luís, e ele também tinha Luís no nome, mas escondia, já começava a despontar como uma promessa, sem ligar para demonizações e estereótipos. 

Naqueles que foram os anos de ouro da propaganda brasileira, não tinha para ninguém, ele não escrevia comerciais, criava personagens que entravam na vida dos brasileiros, sempre surpreendentes e inusitados, ele inventou um rapaz meio afeminado que vendeu esponja de aço como água, uma adolescente que obrigou todas as meninas da sua idade a usarem o primeiro sutiã, um cãozinho que fez a fama de amortecedores! Vai ser criativo assim em Cannes! E ele foi. Era o “papa-prêmios” do maior festival publicitário do mundo. 

Depois de usar e abusar de seu talento, entrou com tudo no mundo dos negócios, deu o primeiro passo desligando-se de sua nave-mãe, a DPZ, não sem ressentimentos dos patrões, e daí em diante associou-se às maiores agências internacionais, até fundar a sua W/Brasil, que ganhou até um samba de Jorge Ben: “alô, alô, W/ Brasil”. 

Uma das frases que me lembro de ter ouvido dele foi nessa fase da sua vida. Ele disse, numa entrevista, que gostava de pagar bem seus funcionários, para poder conviver com eles de igual para igual. E não de cima para baixo. 

Nem uma nem duas vezes imaginei que ele me convidaria para trabalhar com ele. Cheguei a pedir à sua secretária para me chamar caso pintasse um frila. Mas nunca pintou. 

Reza a lenda que, certa vez, Washington passou a noite toda falando de si mesmo a uma linda moça que tentava conquistar. Até que, a certa altura, disse:

“Chega de eu falar de mim! É a sua vez de falar de mim”.

Verdadeira ou não, o que importa é que a história é boa.

Ele adorava contar piadas. E sabia contá-las como ninguém.

Um homem entra num bar estrelado de Nova Iorque. É um cara alto, simpático, cabelo grisalho, pinta de bem sucedido, de smoking. 

No balcão, senta ao lado de uma nova-iorquina típica, chique e deslumbrante, trinta anos, com quem engata um papo romântico, até que, tudo mais ou menos encaminhado, a moça pergunta:

“No seu loft ou no meu?”

E ele, rápido:

“Se é para discutir, não quero mais”. 

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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