Explorar a Margem Equatorial: sinuca de bico!
O questionamento das lideranças políticas é pensado nas cifras: a região tem o potencial de criar mais de 326 mil empregos formais, adicionar R$ 65 bilhões PIB
Tomou conta do jornalismo a notícia de que o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis), seguindo suas avaliações técnicas, manteve o veto à exploração e prospecção de petróleo e gás na Margem Equatorial brasileira – abrangendo quatro estados do Nordeste (Piauí, Rio Grande do Norte, Maranhão e Ceará, e dois do Norte (Pará e Amapá).
De acordo com o órgão (e é bom que se diga que no atual governo, retomou sua autonomia), ainda faltam informações que garantiriam a segurança e viabilidade para a exploração.
O questionamento das lideranças políticas é pensado nas cifras: a região tem o potencial de criar mais de 326 mil novos empregos formais, adicionar R$ 65 bilhões ao Produto Interno Bruto (PIB) nacional e acrescentar R$ 3,87 bilhões à arrecadação indireta no Brasil. Além disso, especula-se que o Brasil poderia voltar a ter que importar petróleo já em 2034, quando estima-se esgotar as reservas atuais do Pré-Sal.
Pois bem. A pergunta é: explorar ou não?
Enquanto biólogo e ambientalista, posiciono-me contrário à tal exploração, não apenas pelos riscos (que apesar de todas as precauções e cuidados, são reais), mas principalmente porque estamos lutando pelo fim do uso dos combustíveis fósseis, sendo urgente a transição para outras formas menos impactantes para o ambiente.
No entanto, entendo também a necessidade, inclusive da perda de nossa soberania e o risco que essa região sofre de ser explorada por capitais estrangeiros, como já ocorre na Guina com a presença predatória empresa estadunidense ExxonMobil (atuante sob as marcas Exxon, Mobil e Esso) que, desde 2015, se estabeleceu como líder na exploração de petróleo na região.
Sabemos que o “outro negro” e o gás natural ainda são as bases de grande parte da energia elétrica mundial (26%), sendo que este setor ocupa o 2º lugar em missões de gases estufa. E de acordo com a Agência Internacional de Energia, é previsto o aumento de 30% no consumo de energia elétrica até 2040, sendo os combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão mineral) responsáveis por mais de 50% de sua geração.
A utilização do petróleo e gás natural nos transportes – 4º maior emissor dos gases causadores das mudanças climáticas – ainda é uma realidade. No Brasil, o uso deles como matriz energética segue elevada, com previsão de serem responsáveis por mais de 44% até 2026.
Trago esses breves números para que sejamos racionais e tentemos chegar a uma decisão técnica e coerente. Afinal, o que desejamos?
A soberania energética, sem a qual a economia de forma em geral não se sustenta, é fundamental. No entanto, não podemos ser demagogos e apenas teóricos, principalmente quando defendemos em reuniões com lideranças mundiais a urgência de um mundo mais sustentável.
O uso do petróleo e seus derivados, talvez seja uma das maiores contradições do mundo atual. Uma sinuca de bico: explorar e garantir saúde financeira e econômica, mesmo que isso gere ainda mais gases de efeito estufa, colocando em risco não apenas os locais com possíveis acidentes, mas a própria sobrevivência do planeta pela eternizada dependência desses combustíveis? Ou encabeçar de fato a luta pela transição energética, a qual o Brasil tem um potencial enorme para ser vanguarda?
Alternativas como o investimento em políticas públicas verdadeiramente sustentáveis, não apenas com a substituição do petróleo e gás natural (sem falar no carvão mineral), mas também investindo em transporte público de qualidade, seriam importantes passos.
(Em tempo: engana-se que a venda e consumo de carros elétricos resolve o problema, afinal, além de toda exploração dos minerais em países ricos desses recursos naturais, mas empobrecidos e escravizados pelo capital, precisamos analisar a fonte da energia que recarrega essas baterias – ou seja, perde-se a ideia de “energia sustentável” quando usa-se combustível fóssil para recarregá-las).
É preciso promover a conscientização das pessoas, colocando todas as possibilidades e opções na mesa. O chamamento para o debate é fundamental. Isso promoveria não apenas a maior clareza das informações, mas fortaleceria a verdadeira democracia participativa – enfraquecendo a democracia burguesa. Seria a oportunidade também de confrontar o próprio agronegócio latifundiário que está entranhado no próprio governo (e pouco se fala que ele, além de não produzir alimento, poluir e intoxicar o ambiente e debilitar a saúde do país, é responsável direto por 70% das emissões dos gases causadores do efeito estufa, causadores de mudanças climáticas que incluem a falta de chuvas também nos reservatórios das hidrelétricas que, sem água, obrigam o acionamento das termoelétricas que queimam gás natural para geração de energia – poluindo ainda mais o ambiente, e encarecendo nossa conta de luz!)
Nessa discussão, entendo que tentar desmoralizar o IBAMA e seu corpo técnico e responsável, jogando a opinião pública contra o órgão (que ainda se recupera dos ataques e aparelhamento que o ex-presidente promoveu), não é a maneira mais correta de se conduzir a luta. Estaríamos sendo incoerentes e nos nivelando à postura abjeta que tanto condenamos durante o (des)governo passado.
Enfim, o debate está aberto. E espero que seja realmente feito sem qualquer decisão unidirecional, sem critério e com paixões partidárias deixadas de lado. Afinal, nessa sinuca de bico, o buraco é mais embaixo!
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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