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    Rodrigo Vianna

    Jornalista desde 1990. Passou por Folha, TV Cultura, Globo e Record; e hoje apresenta o "Boa Noite 247". Vencedor dos Prêmios Vladimir Herzog e Embratel de Jornalismo, é também Mestre em História Social pela USP. Blogueiro, integra a direção do Centro de Estudos Barão de Itararé.

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    Fatos e números: Bolsonaro não cai

    "Presidente está mais fraco, mas finca o pé entre os mais pobres, estreitando terreno do lulismo", avalia o jornalista Rodrigo Vianna

    Bolsonaro discursa em velório de soldado (Foto: Marcello Casal/Ag.Brasil)

    Todo jornalista tem direito a ter opinião e a explicitar suas posições políticas. Mais que direito, tem até a obrigação. Mas não pode brigar com os fatos, nem confundir realidade com desejo.

    O mês de junho termina com números e fatos com os quais não é recomendável brigar.

    Fato 1: Bolsonaro está mais fraco.

    O bolsonarismo, que ameaçava golpes e dizia que a ruptura era questão de tempo, mostrou-se um blefe. Queiroz foi preso, Wassef exposto, o acampamento dos 300  desmontado, o gabinete do ódio desossado, Weintraub colocou-se em fuga, e o capitão nomeou um novo ministro da Educação mais próximo dos militares do que do olavismo... Esse quadro mostra que a possibilidade de uma ruptura institucional não encontra aderência na realidade.

    Sim, já temos autoritarismo que autoriza barbárie policial, já temos 3 mil militares no governo, já temos o Golpe de 2016 e a cassação fraudulenta de Lula. Mas Bolsonaro não tem força para avançar mais no projeto fascista. Ele foi contido. Isso é um fato.

    Fato 2: Bolsonaro mantem um terço de aprovação, o que impede qualquer tentativa de removê-lo do poder agora.

    Se a tragédia da pandemia com mais de 50 mil mortos, somada à exposição de Queiroz/Wassef e à economia em frangalhos, não foi suficiente para destruir Bolsonaro, parece difícil que ele encolha de forma significativa até o fim de 2020 (ainda mais com o auxílio emergencial sendo prolongado até setembro/outubro).

    Não podemos brigar com os fatos.

    A pesquisa DataFolha, publicada nesta sexta-feira, mostra que a rejeição ao governo (ruim/péssimo) bate em 44% (era 43% há um mês). A avaliação ótimo/bom está em 32% (era de 33% em maio). Tendência semelhante foi indicada por outras pesquisas ao longo desta semana.

    Todas elas indicam que Bolsonaro despenca entre os brasileiros com mais escolaridade, mas avança no eleitorado abaixo de dois salários mínimos e que possui apenas o ensino fundamental.

    Na pesquisa Poder360, 63% dos que possuem nível superior avaliam Bolsonaro como ruim/péssimo; entre os que têm apenas o fundamental, 38% dizem que o presidente é ruim/péssimo, e 35% julgam que ele é ótimo/bom.

    A razão para isso seria o auxílio emergencial de 600 reais, dizem vários especialistas.

    Parece-me que não é só isso. Parte da população é sensível ao discurso da ordem e acredita na fala de que o “sistema” tem impedido Bolsonaro de trazer melhores resultados.

    É o que mostra a pesquisa feita pela Revista Fórum: quase metade dos brasileiros se declaram de direita ou centro-direita. Ou seja, há uma hegemonia conservadora na sociedade brasileira.

    A situação, no entanto, é extremamente frágil para Bolsonaro, porque esse discurso antissistema tende a se dissolver com a entrada do Centrão no governo. Apesar dessa contradição, o apoio das legendas conservadoras e dos militares parece suficiente para impedir qualquer avanço do processo de impeachment ou de cassação da chapa no TSE. Bolsonaro tem fôlego pra chegar até 2021.

    Então, temos dois quadros descartados: nem golpe/fechamento do regime, nem impeachment/derrota absoluta.

    Sobraria aquilo que o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), numa bela entrevista ao Boa Noite 247, chamou de “sarneyzação” do governo. Essa parece a tendência mais provável hoje.

    Bolsonaro seguiria aos trancos e barrancos, enfraquecido, sem gabinete do ódio, sem olavismo no centro do discurso: uma espécie de bolsonarismo desossado. Mas com a agenda liberal firme, passando a boiada. 

    Importante, também, é não brigar com mais um dado da realidade.

    Fato 3: Bolsonaro mantem os 30%, mudando de público e contando agora com os mais pobres, e ao fazer isso avança sobre um eleitorado que desde 2006 votava no PT.

    Quando se avaliam as opções eleitorais, o terreno hoje parece se estreitar  para a esquerda:

    - da classe média para cima, há forte adesão à antipolitica/antiEstado; esse eleitorado abandona Bolsonaro, mas não vai necessariamente embarcar num projeto de centro-esquerda; o mais provável é que migre para Moro ou algo parecido;

    - na faixa abaixo de dois salários mínimos, Bolsonaro finca os pés falando em ordem, porrada e "ajuda" aos que não tem carteira assinada.

    O país está hoje dominado pelo discurso da antipolítica + porrada e bomba. Esses sim são quase 70%! Não é à toa que a pesquisa Quaest mostrou que hoje Bolsonaro e Moro disputariam a ponta numa eleição presidencial (com Haddad e Ciro um pouco abaixo nas intenções de voto).

    Claro que Lula e a esquerda são ignorados na mídia, que incensa Moro e tenta construí-lo como alternativa pela direita. Mas o fato é que a situação é difícil para a esquerda.

    O que segura ainda o lulismo é a solidez do apoio no Nordeste – região que mais rejeita Bolsonaro.

    Parece-me que esse quadro indica um caminho claro: a esquerda precisa disputar de maneira vigorosa as periferias do Sudeste. Isso deveria ser prioridade absoluta na disputa municipal de 2020.

    Do contrário, o projeto de centro-esquerda ficará restrito a um núcleo limitado - ainda que sólido e respeitável.

    É o que mostram os números e os fatos. Melhor não brigar com eles.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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