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    Luis Cosme Pinto

    Luis Cosme Pinto é carioca de Vila Isabel e vive em São Paulo. Tem 63 anos de idade e 37 de jornalismo. As crônicas que assina nascem em botecos e esquinas onde perambula em busca de histórias do dia a dia.

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    Feminismo para machos

    Ele dizia não sem abrir a boca e ela, amedrontada e muda, obedecia

    Feminismo para machos (Foto: Luis Cosme Pinto)

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    Sou homem de sorte. Minhas filhas e minha namorada me ajudaram e continuam a estender as mãos. Conversam, dão livros, mostram filmes e eu, na plenitude dos meus 63 anos, começo, finalmente, a entender. 

    Feminismo não significa uma multidão de mulheres iradas querendo ser homens. 

    Feminismo não é sinônimo de larápias a surrupiar o emprego dos homens. 

    Feminismo não é mulher x homem. 

    Feminismo é a busca por direitos iguais.  

    Com paciência e amor, as três me ensinam mais: Feminismo é para mulheres e homens, porque Feminismo é caminho para uma sociedade mais justa. Isso melhora o mundo e o universo.  

    Sei que não serve de consolo, mas já foi muito pior. Quando minha mãe, a Therezinha, nasceu, em 1930, as mulheres não votavam. As brasileiras só começaram a ir às urnas em 1932. E, claro, votavam em homens. Não havia candidatas. 

    O pai dela, meu avô, proibia, sem dizer palavra, apenas com o olhar, que Therezinha fosse ao baile, que namorasse, que mostrasse os joelhos. Não era só ele. Naquela época, a maioria das moças não contestava ou argumentava, tinham medo. Medo dos machos, de seus olhares, de seus poderes.

    Hoje as mulheres falam mais e falam bem. É o que ouço aqui e ali.  

    Birinaites, Catiripapos e Borogodó, de Luis Cosme Pinto
    Birinaites, Catiripapos e Borogodó, de Luis Cosme Pinto(Photo: Reprodução)Reprodução

    **

    Duas amigas entram no restaurante por quilo. O celular toca, está no viva voz. 

    - Oi.

    - Querida, já sabe se vai ao show?

    - Ainda não. É daqui a dez dias, né? 

    - Resolve logo, porque se você não for vou convidar outra pessoa. 

    - Isso é convite ou ameaça, Éverson?

    - Convite. 

    - Parece chantagem. Chame quem você quiser. Tchau.    

    ** 

    As mulheres às vezes nem estão na cena, porém a voz ecoa, como esta semana na feira aqui do bairro. Entre espinafres e chicórias, dois marmanjos relembram um casamento despedaçado.

    - Ela repetia: Armando, pra que o banco de couro? O carro já é novo. Por que não me perguntou, a gente decidia junto. Aí no dia das nossas bodas de prata você me dá um jogo de panelas porque tá sem dinheiro. Armando, aprende, vai na minha.

    - Você ia, Armando?

    - Não. Se eu fosse na dela, aí que a Joelma ficava cheia de razão. E eu não podia admitir, né?

    - Não sei. 

    - Uma vez, a gente discutiu indo para Mongaguá. Ouve a frase dela: “Você tá torcendo para o caminho que eu escolhi dar errado para depois dizer, eu falei que não era por ali. E aí repetir: Joelma você é um fracasso.” 

    - Ela tava certa?

    - Tava, mas nunca dei o braço a torcer. Acha que eu sou trouxa?

    - E agora?

    - Sei lá. Faz um ano que a gente não se fala.

    **

    Na livraria, o casal, ali pela casa dos 50, toma café expresso.

    Ele é escritor, lançou um livro que virou filme. É quase famoso. 

    - Gostou do conto que mandei pra revista, Alice?

    - Mais ou menos, o início é divertido. Depois fica saudosista demais e – não leve a mal - o fim é previsível.

    - Eu imaginava que teria mais apoio e menos reclamação. 

    - Você quer uma companheira ou uma fã?

    - Você só critica.

    - Aproveita enquanto é tempo.

    **

    No balcão da padaria, mãe e filha em frente a pães na chapa com pingados. 

    - Rita, e o trabalho?

    - Difícil, mãe. 

    - O que te incomoda?

    - Cliente mala. O cara vai todo dia ao restaurante e sempre me chama de “Irrita”. Daí eu falo: meu nome é Rita. E ele:

    - Então, “Irrita”, esse prato do dia só serve no dia?

    - Sim.

    - Por quê?

    - Porque se for todo dia não é do dia.

    - Não achei graça. Presta atenção: quero que você troque o acompanhamento do peixe. Em vez de legumes, quero risoto e no lugar da salada verde, quero o bolinho vegetariano. Não quero que passe muito e nem que demore.

    - Mãe, o grosso só fala “quero, quero”. Depois, olhando o meu decote, disse que ia me esperar na saída para gente se divertir um pouco. 

    - O que você fez, filha?

    - Contei ao gerente. Ele me trocou de mesa e botou o cliente pra fora. Diante do segurança, o mal educado pediu desculpas e se mandou.

    Ouvi o “Tum, Tum” quando mãe e filha brindaram duas vezes com as xícaras fumegantes.

    **

    Somos testemunhas: o Feminismo está vivíssimo em cada esquina. Sem medo e com um pouco de humildade, nós, os machos, temos muito a aprender e a ganhar. 

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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