Honestino Guimarães, presente!
"A diplomação de Honestino Guimarães é um ato simbólico a todos que sofreram direta ou indiretamente com arbitrariedades"
No dia 26 de julho de 2024, a Universidade de Brasília promoveu cerimônia de outorga do título póstumo de geólogo a Honestino Guimarães. Uma homenagem justíssima à essa liderança estudantil cuja breve trajetória foi interrompida pela barbaridade da ditadura militar que afetou nosso país.
Honestino Monteiro Guimarães nasceu em 1947 em Itaberaí, oeste de Goiás. Sua família foi uma das muitas atraídas pela construção de Brasília, para onde migraram em 1960. Entre tudo de promissor que uma vida na nova capital poderia oferecer, sua mãe Maria Rosa esperava que os filhos pudessem experimentar de uma educação de alta qualidade.
Essa era a promessa anunciada pela criação da Universidade de Brasília, ao final de 1961, que prometia influenciar toda educação oferecida na cidade. Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro idealizaram aquela que deveria ser a vanguarda absoluta da educação superior brasileira. Para isso, convidaram cientistas, artistas e professoresde todo mundo para viabilizar uma experiência inovadora de ensino público e qualidade. Tal projeto foi otimistamente construído ao longo dos meses seguintes. Infelizmente, o golpe militar de 1964 solapou esses esforços logo no início, o que provocou a demissão e evasão em massa de parte expressiva do quadro de professores.
Honestino teve a oportunidade de vivenciar essa experiência por completo. Foi aluno do Centro Integrado de Ensino Médio (CIEM), uma experiência pedagógica que funcionava como laboratório da Faculdade de Educação da UnB. E, ao ingressar no curso de Geologia na UnB em 1965, não teve a oportunidade de vivenciar aquela educação de excelência prometida no começo da década.
É nesse cenário que se configura sua militância. A oposição a um golpe de Estado e a luta por educação pública de qualidade; a defesa por um projeto universitário autônomo. Em sua atuação no Diretório Acadêmico e Geologia e na Federação dos Estudantes Universitários de Brasília, liderou esforços contra a influência estrangeira na educação nacional. Liderou também uma série de manifestações em busca da retomada democrática.
Só que naqueles tempos nebulosos, a Lei de Segurança Nacional proibia praticamente qualquer oposição ao governo golpista. Discursar em manifestações, distribuir panfletos, mesmo comparecer a manifestações; todas essas eramatividade passíveis de punição com prisão. Honestino havia sido preso em outras quatro oportunidades antes de 29 de agosto de 1968, dia em que a UnB foi palco de guerra. Sob justificativa de cumprir mandados de prisão de Honestino e outras lideranças, efetivo militar pesado foi acionado contra cerca de 500 estudantes.
Foi solto em novembro do mesmo ano, mas pouco tempo depois foi promulgado o fatídico AI-5, em dezembro de 1968. Esse ato foi a resposta da ditadura à crescente onda de protestos da sociedade civil contra a violência estatal praticada até então. Ciente de que tal ato suspendia garantias constitucionais, Honestino foi obrigado a entrar na clandestinidade para não se submeter às atrocidades do regime. Foi eleito presidente da União Nacional dos Estudantes em 1971 (a entidade também operava na clandestinidade) e conseguiu desenvolver atividades junto a movimentos estudantis em São Paulo e no Rio de Janeiro até outubro de 1973, quando foi preso pela Marinha.
Seu corpo nunca foi encontrado. Em 1996, foi reconhecido como desparecido político e sua família recebeu seu atestado de óbito, sem causa da morte. Apenas em 2014 foi reconhecido como anistiado político pelo Governo Federal, cujo Ministério da Justiça determinou a retificação do atestado de óbito para que constasse como causa da morte “atos de violência praticados pelo Estado”.
Não podemos jamais nos esquecer do quanto a ditadura militar foi prejudicial à sociedade brasileira. Não podemos permitir que o distanciamento temporal com os eventos faça com que naturalizemos o absurdo que foram os anos de chumbo. O autoritarismo ceifa sonhos, famílias, vidas. A tentativa de golpe no 8 de janeiro de 2023 é a prova de que é preciso lutar pela democracia, sempre e a todo custo.
A diplomação de Honestino Guimarães é um ato simbólico a todos que sofreram direta ou indiretamente com arbitrariedades nesse período nefasto. Sua luta representa o esforço contínuo pela democracia e por uma educação pública de qualidade, bem como reafirma a importância do ativismo estudantil como agente político. Que esse nobre gesto sirva de exemplo para que outras instituições possam honrar aqueles que deram a vida pela nossa democracia.
Como ex-estudante da UnB e tendo feito parte do DCE Honestino Guimarães, fiquei emocionado com a solenidade. Honestino é uma referência para todo movimento estudantil, tanto por sua liderança quanto por sua resistência. Lutou com as armas que dispunha e sempre acreditou no poder da união e da coletividade. Ainda que andemos sobre caminhos tortuosos, nunca nos esqueçamos daqueles que os abriram.
Para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça. Honestino Monteiro Guimarães, Geólogo; PRESENTE!
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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