Impeachment ou Golpe? A semelhança dos dias de hoje com 64
São inúmeras as semelhanças do momento que vivemos hoje com o momento que preparou uma ação golpista que quebrou a legalidade e construiu no Brasil por diversos anos um estado de exceção com prisões sem justificativa, perseguição, torturas, mortes e desaparecimentos de pessoas que pensavam diferente
As eleições de 2014, sem dúvidas uma das mais polarizadas desde a redemocratização do Brasil, junto com a inconformidade do resultado das urnas, por parte dos setores derrotados, levaram o Brasil a um profundo impasse político e o crescimento de uma onda golpista, que se fundamenta em uma acusação insustentável (pedaladas fiscais e decretos de suplementação orçamentária) para pedir o impeachment da Presidenta Dilma Rousseff, e é bancado por um conjunto de parlamentares sem o menor compromisso com as causas populares, republicanas e democráticas, basta ver o circo dos horrores protagonizados por esses senhores durante a votação no dia 17 na Câmara dos Deputados.
O Brasil foi o primeiro país da história moderna a protagonizar um processo de impeachment, quando em 1992 os diversos setores e organizações da sociedade civil, em torno de um consenso e tendo um grande protagonismo da juventude, depôs o então presidente Fernando Collor de Melo em um processo que em nada se parece com o que estamos vivendo nesse momento.
O impeachment de Collor foi pedido quando apenas quando uma CPI que investigava as denúncias feitas pelo próprio irmão do presidente, Pedro Collor, produziu provas e a partir disso a sociedade civil sobretudo a UNE encampou diversas manifestações com pautas populares e republicanas, diferentemente desse momento em que a investida do impedimento surgiu no dia seguinte à derrota nas urnas, em 2014, com forte investimento midiático desde então, um caldo fascistas nas ruas e agora se apresenta como uma grande farsa golpista.
O momento que vivenciamos hoje se assemelha não a 1992, mas sim a 1964, com o governo enfraquecido em um parlamento extremamente conservador o presidente do congresso Auro de Moura Andrade, declarou em uma sessão extremamente conturbada, a vacância do cargo da Presidência da República com a acusação de abandono da sede do governo, acusação que não procedia, o então presidente João Goulart estava em solo nacional e não havia renunciado, em seguida Auro proclamou o presidente da Câmara, Raniere Mazilli, presidente da república e passou a governar com uma junta, autodenominada "Comando Supremo da Revolução", composta pelo general Artur da Costa e Silva, almirante Augusto Rademaker Grünewald e pelo brigadeiro Francisco de Assis Correia de Melo. No dia 15 de abril, entregou o cargo ao marechal Humberto de Alencar Castelo Branco.
Aqueles, assim como hoje em dia, foram tempos de muita luta para os setores progressistas que aspiravam por reformas de base para aprofundar a democracia e garantir mais direitos ao conjunto da população, mas a elite brasileira entreguista e falso moralista não gostou das medidas e postura adotadas pelo presidente que queria encampar um processo de transformação com a reforma agrária, garantindo a democratização da terra, reforma educacional garantindo a valorização do magistério e do ensino público, reforma fiscal para garantir mais arrecadação do estado com justiça fiscal, reforma urbana garantindo a democratização da cidade e outras.
O fascismo tomou as ruas com o discurso "querem cubanizar o Brasil", "com deus e em defesa da família", pedidos de intervenção militar, ataques violentos, a mídia reafirmava a todo momento que não se tratava de um golpe, assim como faz a Rede Globo, principal emissora beneficiada com a ditadura militar, a mesma Fiesp que hoje distribui filé mignon na paulista, fala que "não vai pagar o pato" e monta caixa de empresário pra financiar o golpe, foi também uma forte financiadora do golpe militar, a OAB Ordem dos Advogados do Brasil que recebeu com satisfação a tomada do poder pelos milicos, justificando ser uma medida emergencial, hoje também tem uma postura de ataque a legalidade apesar de milhares de advogados discordarem da opinião da entidade, organizações paramilitares atacavam pessoas de esquerda e sedes de partidos e entidades do movimento social, como aconteceu com a sede da UNE que foi incendiada em 64 e atacada novamente recentemente e outras entidades também, institutos e organizações anticomunistas foram criados e fortemente financiadas basicamente para elaborar e construir movimentações, panfletos, e propagandas contra o governo de João Goulart e seus aliados, como foi o caso do IPES (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais), que chegou a publicar um livro "UNE, instrumento de subversão", e nos remete a algumas organizações falsas, sem base real, que hoje atuam na mesma linha como o Movimento Brasil Livre, Revoltados Online e Vem Pra Rua.
Assim como hoje em dia a postura da UNE foi de defesa da democracia e dos avanços sociais conquistados, os parlamentares conservadores não deixaram por menos, caíram no ataque às entidades dos movimentos sociais. A UNE foi uma das principais atacadas: criaram uma fajuta CPI para apurar a "subversão" e um suposto "ouro de Moscou" que segundo uma cambada de difamadores era o que financiaria o movimento estudantil, mas o propósito era único da comissão garantir manchetes escandalosas à grande imprensa, e novamente se costura uma fajuta CPI da UNE, dessa vez protagonizada pelo pastor Marco Feliciano.
São inúmeras as semelhanças do momento que vivemos hoje com o momento que preparou uma ação golpista que quebrou a legalidade e construiu no Brasil por diversos anos um estado de exceção com prisões sem justificativa, perseguição, torturas, mortes e desaparecimentos de pessoas que pensavam diferente. A deposição de um presidente sem justificativa legal criou o cenário para o retrocesso democrático e quando o povo foi às ruas reivindicar as eleições que deveriam acontecer em 1965, mas a tempos eram adiadas, foi estabelecido o AI5 e o terror imperou.
Não vale a pena ver a repetição da história, dessa vez como farsa, que tem se montado a partir de um pedido de impeachment sem crime de responsabilidade, uma vez que se considerado a justificativa apresentada como plausível cairemos em um estado de insegurança jurídica com dezenas de pedidos de impeachment de prefeitos e governadores que também fizeram pedaladas e editaram decretos de suplementação orçamentária, justamente por não se tratar de crime.
É preciso continuar ocupando as ruas para combater esse sentimento de ódio e qualificar a justa crítica aos erros do governo, fazendo com que tenhamos perspectivas de mais avanços e conquistas para a melhoria da qualidade de vida e inclusão do povo, garantindo que todas as formas de opressão sejam combatidas.
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