Kakay fora!
"Uma missiva permeada de fogo amigo e de mexericos da Candinha, não ajuda em nada na luta contra o fascismo", diz Ricaro Nêggo Tom
Analisando o início da “carta” que o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, escreveu para alertar ao presidente Lula sobre os rumos do seu governo, fiquei com a impressão de estar lendo um artigo escrito para alguma coluna de jornal. Uma frase de Clarice Lispector como “prefácio”, e um título que endeusa a figura política do presidente, contradizem boa parte do conteúdo da missiva que, segundo o próprio Kakay, “vazou” de uma lista de transmissão entre amigos e foi parar nas mãos da jornalista Andréia Sadi, da Globonews, que a publicou em sua coluna ressaltando a proximidade do advogado com Lula e o campo progressista. Algo que sugere o descontentamento de um importante e histórico “aliado” com o atual governo, e municia a extrema-direita em sua artilharia pesada e desonesta contra Lula, o PT e a esquerda.
A “carta” é repleta de inconfidências introduzidas sob prosopopeias políticas como: “um dia alguém me disse”, “certa vez um passarinho me contou”, “ouvi de um canário que...”, e que pretendem justificar a exegese feita pelo autor com relação ao histórico político e pessoal de Lula e de seus governos anteriores. Kakay avalia que “por circunstâncias diversas, políticas e principalmente pessoais”, Lula é outro. Óbvio que sim. Até porque, política e socialmente falando, o país e o mundo mudaram muito de 2002 para cá. E do ponto de vista pessoal, Lula está prestes a completar 80 anos de idade, e é natural que enfrente um desgaste físico, mental e emocional. O que não o tem impedido de exercer a presidência ativamente. Sem contar que Lula ficou preso injustamente, é sempre bom que se diga, por mais de 500 dias, além de sofrer um sistemático ataque do PIG e das elites financeiras do país, desde que começou a fazer política.
Não que a “carta” de Kakay contenha apenas críticas vazias ou alfinetadas gratuitas. Pelo contrário, algumas ponderações e afirmações feitas por ele merecem ser avaliadas pelo governo, e principalmente pelo presidente Lula. Como, por exemplo, a crítica com relação à capacidade política de algumas pessoas do seu entorno, sobretudo, algumas que estão no alto escalão do governo. Kakay também parece se ressentir ao dizer que Lula “não recebe mais os velhos amigos políticos e perdeu o que tinha de melhor: sua inigualável capacidade de seduzir, de ouvir, de olhar a cena política.” Ok! Também entendo que uma das autocríticas que Lula e os quadros políticos mais antigos do PT precisam fazer, é sobre a percepção de que o cenário político brasileiro mudou. Não temos mais adversários políticos, cujo debate se pautava no campo das ideias e das convicções. Não existe mais direita no Brasil. O que existe é um fascismo militante que quer destruir a democracia e usa Deus acima de tudo e de todos para estabelecer a sua dominação.
Talvez, até mesmo a esquerda esteja se deslocando ao centro, sob a necessidade de uma frente ampla no combate ao bolsonarismo, acreditando que isso possa ser uma espécie de renovação. O que é bem problemático e denota um erro estratégico e de percepção da nova realidade. No entanto, o momento em que essa “carta” vem a público é, no mínimo, inoportuno. Basta observar a sanha do PIG em desestabilizar o governo, mesmo com os excelentes números apresentados até aqui. Lula trabalha muito, incansavelmente, visando o melhor para o país. Erra? Sim. Todo mundo erra, já dizia o poeta. Mas não merece ser vítima de fogo amigo e de trairagem de quem se diz aliado. Ou escrever que: “e nós temos o Haddad, o mais fenomenal político desta geração em termos de preparo. Um gênio. Preparado e pronto para assumir seu papel.”, não soa como trairagem e conspiração?
Haddad, em que pese sua competência e seu caráter ilibado, nunca será Lula e nem chegará perto. Não tem carisma e nem apelo popular para tal. Haddad é um burocrata, um político de escritório. Um isolado e capturado por força do ofício. E tudo bem que assim o seja. Não há demérito nisso. Porém, entender que ele seria uma alternativa imediata a Lula, é contradizer a própria preocupação exposta na “carta”. Haddad enfrenta resistência dentro do próprio partido e não tem toda essa capacidade de agregamento para as esquerdas. Diferentemente de Lula, como o próprio Kakay diz na carta, que sabe seduzir até mesmo adversários e trazê-los para o seu projeto. Caso seja o candidato em 2026, Haddad perderia feio para qualquer nome da extrema-direita. Iria reeditar o papelão feito por Marcelo Freixo no Rio de Janeiro, quando foi esmagado pelo desconhecido e irrelevante Cláudio Castro na disputa pelo governo do Estado, justamente por ser mais burocrata do que político. Além de ter abandonado algumas de suas convicções e as bandeiras que sempre defendeu, acreditando que seduziria “isentões”, indecisos e bem intencionados.
Para piorar, Kakay finaliza sua “carta” dizendo que está "olhando o quadro e torcendo para o crescimento de uma direita civilizada". E arremata dizendo que, "com a condenação de Bolsonaro e a prisão, que pode se dar até setembro, nos resta torcer para uma direita centrista, que afaste o fascismo.” Ou seja, mais um tom de contradição em sua crítica, e falta de percepção do atual cenário político brasileiro. Não existe mais direita civilizada com força política no país. É esquerda ou barbárie. A barbárie que ele diz temer em sua “carta”, mas que acabou municiando com o seu disse me disse fora de hora e local. Se não for para ajudar, kakay fora!
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