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    Fábio Beserra

    Geógrafo, Doutor em Geografia e Professor do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

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    Lula e Amaniutuba entre memórias e reflexões

    "Amaniutuba é o retrato dos grotões do Brasil. De certo modo, algo capaz de lembrar um “Brasil profundo”, termo elaborado pelo geógrafo Itamar Vieira Júnior"

    Presidente Lula (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

    Amaniutuba, distrito de Lavras da Mangabeira, município distante 442 quilômetros de Fortaleza, capital do Ceará. Eram 8:47 da manhã de uma segunda-feira, 10 de março de 2025, quando comecei a observar a dinâmica do lugar. Do alto, na casa de familiares, a visão era bastante satisfatória. Dia nublado, as chuvas tinham iniciado e o lugar apresentava-se entre um misto de verde e terra molhada.

    Alguns ônibus escolares estacionados, antenas digitais e placas de energia solar fotovoltaica nos tetos das casas. Ali próximo uma rua era pavimentada. Amaniutuba fora apelidada de “Ouro Branco”. Reza a lenda que, em um show feito por Luiz Gonzaga, na década de 1960, no terreno da então Brasil Oiticica, o cantor demonstrou-se admirado ao ter cruzado muitas terras ocupadas pelo plantio do algodão. E proferiu: “Esse lugar deveria ser chamado de Ouro Branco, a verdadeira riqueza do Brasil”.

    Amaniutuba é o retrato dos grotões do Brasil. De certo modo, algo capaz de lembrar um “Brasil profundo”, termo elaborado pelo geógrafo Itamar Vieira Júnior, em seu livro “Torto Arado”. Naquele lugar estão presentes energia elétrica, água encanada, sistema de esgotamento sanitário e internet. Também se fazem presentes os agentes comunitários de saúde. Em uma conversa foi possível ouvir um deles relembrando a fórmula do soro caseiro, “uma colher de açúcar e duas de sal” e seu êxito no combate à diarreia, aliada às balanças mecânicas de gancho, em campanhas contra a desnutrição e a mortalidade infantil. Eram os anos 1990. Hoje os instrumentos são outros. Equipado por motocicleta, tablet e outros acessórios, a realidade de outrora parece um passado a não ser repetido.

    Em Ouro Branco o posto de saúde está atualmente sendo reformado. Há médico diariamente e uma equipe multiprofissional que garante o seu funcionamento. O posto de saúde localiza-se numa das extremidades do povoado. Próximo a ele estão localizados a praça principal e a igreja católica - devidamente ativa para o início dos festejos em comemoração ao dia de São José, padroeiro do estado.

    O domingo anterior marcou o início das festividades com uma cavalgada realizada por cavaleiros de toda a região, seguida por uma tarde ininterrupta de festejos. Naquele dia pude observar duas lanchonetes. Ao entrar numa delas indaguei até que horas ficariam abertos para encomendar pizza para o jantar. A resposta: “até meia-noite ou enquanto houver movimento”. E houve movimento! Pausa nos festejos para a realização da missa. Na saída, os devotos são tomados por um grande “toró”, termo popular utilizado para denominar chuvas torrenciais. A seguir, a chuva deu lugar aos paredões de som. Um encontro entre o sagrado e o profano.

    Da praça principal foi possível perceber que Amaniutuba cresceu e continua a crescer. Houve expansão de casas e comércios. Perguntei a um morador se havia casas financiadas pelo Programa Minha Casa Minha Vida ali, sua resposta foi negativa. Os imóveis são construídos por seus proprietários com recursos próprios. Ele fez questão de emendar: “Aqui é um lugar pequeno, mas que tem muito dinheiro. Todo dia tem gente nos bares, bebendo. As pessoas estão construindo para alugar. Tem muito carro novo. Não sei de onde o povo tira tanto dinheiro”. Mais tarde, um outro morador disse-me algo que, por instinto, acredito que tenha relação com o depoimento anterior: “Antes de Lula, a gente aqui passava fome. Hoje, hoje tem emprego. Lula dá dinheiro para quem tem fome. Fome aqui não é mais problema. É por isso que voto em Lula”.

    Precisei parar e refletir sobre essa mensagem: “Lula dá dinheiro para quem tem fome”. Obviamente fazia menção aos programas de assistência social dos Governos Lula e Dilma. Mas, o que me chamou a atenção foi o início, “Lula dá dinheiro...”. Um discurso difundido, sobretudo após a aprovação da PEC 478/2010, que estabeleceu direitos trabalhistas para empregados domésticos, a “PEC das Empregadas Domésticas”, pela classe média e os políticos da direita conservadora do país.

    Pensei em explicar para aquele morador que sua ideia não estava exatamente correta, mas, eu quem estava no lugar dele, na terra dele. Ali só cabia a mim ouvir atentamente e agradecer pelas conversas amistosas. Assim o fiz pela noite adentro, entre conversas, cervejas e aprendizados.

    Amaniutuba faz parte da minha vida desde a infância. Foi ali que meu pai, Austregésilo Clementino Beserra (in memorian) nasceu. Ao longo da infância, adolescência e em alguns poucos momentos da vida adulta, fui e voltei àquele lugar que para mim é tão fascinante.Aos 43 anos, ao retornar a Ouro Branco, ainda encontrei antigos prédios, como o da Cooperativa Agrícola e Industrial de Icó (responsável pelo beneficiamento do algodão da região, hoje extinta), o da antiga estação ferroviária abandonada e a casa de minha avó, a quem muitos chamavam carinhosamente de Dona Licô (in memorian). Mas também encontro o asfalto, a areninha, a praça da brinquedoteca para crianças e as cisternas instaladas pelo Programa 1 Milhão de Cisternas.

    Reencontrei tios, tias, primos, amigos que tecem comigo conversas que vão entre o cotidiano do lugar e a economia global, passando pela política e suas peculiaridades. Conheci gente nova, gente que retornou para lá pois conseguiu vencer na vida e considerava que era hora de descansar, gente que foi para lá pois queria um lugar tranquilo para morar.

    A terça-feira chegou e com ela a hora de retornar. No carro, as marcas da chuva e os presentes ganhos (doce de leite, “espécie”, queijo de coalho, siriguela... com direito a galinha caipira abatida pronta para cozinhar). Na memória, velhas lembranças que se renovaram, bem como um pouco da esperança.

    Durante a viagem não parei de pensar em Amaniutuba, Lavras da Mangabeira, Ceará e no Brasil. Em todas as transformações que vi e vivi. E em todas aquelas que ainda poderei presenciar. Dentre os muitos pensamentos que tive, o principal foi: Lula, sem sombra de dúvida, foi e é o melhor presidente desse país!

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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