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    Camilo Irineu Quartarollo

    Autor de nove livros, químico, professor de química, com formação parcial em teologia e filosofia.

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    Luta contra o preconceito

    Não é a economia! É o preconceito idiota, antigo e arraigado

    (Foto: Marcelo Rocha/Mídia Ninja)

    No tráfico de humanos do século XIX surgem as mães de navio. Quem são? As meninas maiores que cuidam das mais novas. Pois no final do tráfico os navios traziam meninas para reproduzirem e aumentar a mão de obra da senzala. A mãe de navio e os laços de familiaridade nos tumbeiros eram espirituais e mais fortes que os grilhões. A distração para uma pequena chorosa compulsiva era a Abayomi, uma bonequinha bem rústica feita de laços das roupas, do barrado, e dada às inconsoláveis. Talvez o mar ficasse com a sua boneca, boiando livre no oceano Atlântico e voltasse à Àfrica, ela não (vide A ressurreição de Abayomi, deste autor ). 

    Atualmente, meninos de pais mortos no morro não têm nada além de um colo de vó, de um carinho, de uma liberdade, de um tambor de sonhos provisórios ou da homenagem do padre Júlio Lancelotti. O menino de quatro anos, Ryan da Silva Andrade Santos, órfão, foi morto no litoral paulista, no Morro São Bento, em confronto policial com uma bala no abdômen, e pasmem, apenas brincava na sua calçada. Será que seu riso era uma arma?! Vão dizer que estava no lugar errado e na hora errada?! Esse absurdo é dado meio como normal. De tão absurdas e maldosas essas Deep Web do ódio e de políticos destas, não me espanta se propuserem projeto de lei para estabelecer a escravidão.  

    Persiste o racismo do século XIX, mas multifacetado, cínico. Há um racismo disfarçado, não exatamente de cor, mas de classe, como bem descreve Jessé de Souza no livro A elite do atraso: “...o sadismo contra os pobres, o covarde ódio de classe que é o verdadeiro DNA da sociedade brasileira”. 

    Antes da abolição, os cafeicultores diziam que o Brasil não aguentaria manter a sua economia sem escravos! Aguentou, pagando aos assalariados imigrantes nas indústrias e aos brancos do Sul dando-lhes terras para cultivo. Nada aos cativos libertos! A estes a proibição pela Lei de terras, a qual os impedia de comprarem sua pequena propriedade familiar. Tudo para obstruir! Puro preconceito.

    A Elite do atraso dizia que a economia não suportava a abolição do trabalho cativo. Suportou. Então se diz que a economia não suporta o reajuste anual do salário mínimo, do décimo terceiro, do Bolsa Família, do BPC, da Garantia-Safra – para agricultura familiar e de outros. A desculpa requentada de sempre, e cínica, desde antanho. Não é a economia! É o preconceito idiota, antigo e arraigado.

    Quem não suporta são os avoengos que veem diarista “andar de avião”, a bela morena tanajura com seus trajes coloridos, exuberante, o filho de lavadeira fazer doutorado e usar cabelo estilo drede, tocar tambor e berimbau com a destreza do (a) capoeira, sarados e felizes. A economia aguenta sim. Querem é uma escala de trabalho forçada de 6X1 eterno, para o pobre não desfrutar de sua cultura própria, do lazer e do lúdico. A elite do atraso ameaça, mas não vai deter o processo histórico e o riso de Zumbi.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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