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    Moisés Mendes

    Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.

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    Mais uma encenação das farsas pacifistas, 13 anos depois

    Veto dos EUA à resolução proposta pelo Brasil na ONU repete com Lula e com outro presidente democrata uma situação semelhante à do acordo com o Irã em 2010

    Lula e Joe Biden (Foto: Ricardo Stuckert/PR | Reuters/Jonathan Ernst | Reuters/Mohammed Salem)

    Vamos relembrar uma farsa histórica para os que se frustraram com a decisão dos Estados Unidos de vetar a proposta de resolução que o Brasil apresentou na ONU, enquanto Israel destrói Gaza.

    A resolução não era um pedido de cessar fogo, mas para que o mundo assumisse o compromisso de socorrer e proteger civis durante “pausas humanitárias”. Não deu certo, como não havia dado uma tentativa pacifista envolvendo o Brasil 13 anos atrás.

    Essa é a triste história do teatro do acordo com o Irã. Em maio de 2010, Lula e o chanceler Celso Amorim vestiram seus melhores ternos e embarcaram para Teerã.

    Saíram em fotos espalhadas pelo mundo ao lado do então presidente Mahmoud Ahmadinejad e da testemunha do encontro, o turco Recep Tayyip Erdogan.

    Lula e Amorim haviam fechado as bases de um acordo nuclear complexo e inimaginável com os iranianos, envolvendo a troca de urânio enriquecido.

    Atuaram como uma espécie de emissários dos americanos, que impuseram as condições em detalhes. Foi no dia 17 de maio de 2010. Lula era o cara, assim definido por Barack Obama um ano antes. Amorim era um dos diplomatas mais admirados lá fora.

    Fizeram a pose com as mãos estendidas, os quatro sorrindo, e foram comemorar em Madrid, onde Lula participaria da Cúpula União Europeia-América Latina e Caribe.

    O Brasil diria aos europeus que havia conseguido: o Irã seria afastado da tentação nuclear. Tudo que fizesse nessa área teria fins pacíficos.

    Em Madrid, Amorim decidiu telefonar para a então secretária de Estado, Hillary Clinton, para detalhar o acordo. Hillary azedou a champanhe dos brasileiros.

    Disse a Amorim que não era bem assim, que o acordo não contemplava as expectativas dos Estados Unidos e que eles deveriam voltar a conversar.

    Enquanto os grandes jornais estampavam manchetes sobre o acordo histórico, Amorim repetia a Lula que não era bem assim. Os americanos não confiavam no Irã. Por que então montaram o teatro?

    O Brasil não havia levado adiante as bases de um acordo que Obama defendera em carta a Lula? O mundo todo não sabia que aquilo era o que americanos, europeus e até israelenses queriam? Pois é, mas não era bem assim.

    Celso Amorim contou, no final de 2010, em depoimento no Congresso, como um jornalista americano definia o que acontecera: no meio do jogo, os Estados Unidos mudaram o lugar das traves.

    Os detalhes sobre a repercussão do acordo, a euforia de Lula e o telefonema para Hillary foram contados pelo diplomata em palestra na Assembleia Legislativa, em Porto Alegre, oito anos depois.

    Esse era o resumo: o Brasil havia sido induzido a participar de uma farsa. Os Estados Unidos estavam certos de que o acordo seria rejeitado por Ahmadinejad.

    Mas poderiam dizer que tentaram a pacificação, usando como emissário não um mandalete qualquer, mas o cara aquele que Obama admirava tanto. Pois Ahmadinejad os surpreendeu e aceitou.

    Nunca ficamos sabendo do que Hillary pode ter discordado, se é que ela disse. Mas hoje não importa. A tentativa de acordo denunciava o que os Estados Unidos queriam mesmo. Manter acesa a faísca da desconfiança e do conflito. Assim como agora não querem paz e muito menos salvar civis.

    Por isso usaram como alegação para o veto que a resolução proposta pelo Brasil não assegurava a Israel o direito de se defender, o que na verdade significaria carta branca para atacar e massacrar de forma indiscriminada.

    Aquela cena em Teerã aconteceu em 2010. Depois, Lula foi preso pelo lavajatismo, o Brasil teve um presidente armamentista e genocida, o Itamaraty foi liderado por um terraplanista, Lula foi solto, elegeu-se presidente pela terceira vez, Celso Amorim agora é seu assessor especial para assuntos internacionais, Erdogan, que em 2010 era primeiro-ministro desde 2003, virou presidente em 2014, foi reeleito este ano e ficará no poder até 2028, o Irã pode entrar no conflito israelenses x palestinos e ninguém sabe por onde anda Ahmadinejad.

    Um democrata americano passou a perna em Lula em 2010 e outro democrata voltou a chamá-lo para um jogo em que a trave troca de lugar a todo momento, para que o mundo continue em guerra e alguns continuem acreditando que alguém quer a paz.

    Se há uma diferença hoje, a mais importante talvez seja a que denuncia Joe Biden como mais frouxo, mais medíocre e mais subserviente do que Obama.

    O resto é tudo igual. Também em 2010 ficou claro que Israel não queria acordo algum. Obama fez o que Biden faz agora.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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