Manifestos que não exijam a devolução dos direitos políticos de Lula e a reparação pelo golpe de 2016 não são democráticos
"Faz sentido construir um manifesto pela democracia sem que Lula, líder da oposição, seja chamado a opinar sobre seus termos? Ou sem convidar a ex-presidente Dilma Rousseff, vítima de um golpe recente, a assiná-lo? A meu ver, não", diz o jornalista Leonardo Attuch, editor do 247
Todos os democratas do Brasil hoje são contra Bolsonaro, correto? Sim, correto. Jair Bolsonaro faz agitação constante contra as instituições democráticas e, segundo seu ex-ministro Sergio Moro, pretendia armar a população para promover rebeliões armadas contra governadores e prefeitos que defendem medidas de isolamento social contra o coronavírus. Se não bastasse, Bolsonaro também explicita suas inclinações autoritárias por meio de símbolos nazistas, como o "dog whistle" com seu copo de leite, e citações literais do líder fascista Benito Mussolini.
Não há mais espaço para a dúvida – como, aliás, jamais houve. Bolsonaro representa uma ameaça concreta não apenas para todos os brasileiros, como para a própria humanidade, dada a importância do Brasil no contexto global.
Dito isso, é preciso agora questionar como Jair Bolsonaro se tornou presidente da República? Os brasileiros, que eram apontados por pesquisas internacionais como o povo mais feliz do mundo e mais confiante no futuro, dormiram democratas e acordaram fascistas? Ou será que esse processo foi construído meticulosamente por setores da elite brasileira que dilapidaram as bases da democracia e hoje pedem adesões a manifestos de união nacional?
Todos os brasileiros que têm um mínimo de discernimento já são contra Bolsonaro. Mas isso não significa que todo e qualquer manifesto seja democrático apenas por criticar seu projeto autoritário.
Mais do que nunca, é importante questionar como se chegou até aqui? É fundamental buscar a causa e as origens do problema. Sem o golpe de 2016, que afastou a presidente honesta Dilma Rousseff e instalou no poder a gangue de Michel Temer, haveria Bolsonaro? Sem o processo de lawfare que retirou artificialmente os direitos políticos de Lula, antes da eleição presidencial de 2018, haveria Bolsonaro? Todos sabem que não.
Por isso mesmo, é impossível restabelecer a democracia no Brasil sem curar as feridas centrais do País. Se não é possível devolver o mandato que as elites subtraíram de Dilma, por meio de um impeachment fraudulento, que ao menos reconheçam seu erro – e não o façam apenas com 50 anos de atraso, como aconteceu com a Globo em relação a 1964. Se querem a democracia de volta, que coloquem no manifesto a devolução dos direitos políticos de Lula.
Manifestos que não exijam a devolução dos direitos políticos de Lula e a reparação pelo golpe de 2016 não são democráticos. Alguns dirão que o mais urgente agora é combater o projeto autoritário de Bolsonaro e deixar para resolver as diferenças lá na frente. Mas faz sentido construir um manifesto pela democracia sem que Lula, líder da oposição, seja chamado a opinar sobre seus termos? Ou sem convidar a ex-presidente Dilma Rousseff, vítima de um golpe recente, a assiná-lo? A meu ver, não.
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