Na etapa final, campanha de Lula deveria focar na desconstrução do antipetismo de forma mais eficaz
"A degradação do tecido social que foi agudizada a partir da Lava Jato e do golpe contra Dilma Rousseff mudou o foco do debate público", analisa Cesar Calejon
Por Cesar Calejon, para o 247
Na última semana, ao conversar com o motorista do Uber que me conduzia para uma gravação, fui questionado com uma indagação pertinente. O senhor, de 57 anos, me dizia que não gostava do Bolsonaro, mas votaria nele ainda assim para evitar a volta do “ladrão que roubou o Brasil”.
Ao argumentar que Lula foi inocentado das acusações feitas pela Lava Jato, que o STF considerou o ex-juiz parcial e que o antipetismo tem como base o elitismo histórico-cultural que visa fazer a manutenção da hegemonia das classes mais abastadas sobre as parcelas mais empobrecidas da nação, ele me olhou pelo retrovisor do veículo e questionou: “Por que, então, a campanha do Lula não explica tudo isso de forma mais clara para a gente?”.
De fato, boa parte da campanha petista esteve focada em salientar as conquistas socioeconômicas dos governos Lula, o que faz todo o sentido. Contudo, a degradação do tecido social que foi agudizada a partir da Lava Jato e do golpe contra Dilma Rousseff mudou o foco do debate público desta seara para o que se convencionou chamar de “pautas morais”.
Nesse sentido, atualmente, parece importar menos a própria qualidade de vida do que temas correlatos à moralidade e aos costumes que são percebidos como valores fundamentais pela maior parte da população brasileira. Na política institucional, o palco no qual os atores se apresentam é constituído de forma histórica e cultural. Ou seja, é preciso se adaptar conforme sopram os ventos em determinada época e em certo local.
A meu ver, portanto, nessa última semana antes do pleito presidencial, os esforços da campanha de Lula deveriam estar totalmente orientados para desconstruir o antipetismo.
Utilizando exemplos simples para demonstrar como a imagem do ex-presidente foi demonizada a partir de 2005, mas, sobretudo, entre 2013 e 2018, para que o maior líder que já ascendeu do proletariado nacional fosse retirado da cena política e medidas draconianas contra as classes trabalhadoras pudessem ser efetivadas sem a menor resistência, o que de fato aconteceu.
Uma metáfora eficiente seria resgatar o modelo escravocrata brasileiro e apontar como o antipetismo é a expressão contemporânea dos mesmos métodos que os senhores de engenho utilizavam no Brasil colonial para deslegitimar as lideranças dos escravizados que ascendiam nas senzalas.
De qualquer forma, desconstruir o antipetismo é a tarefa fulcral para toda a esquerda brasileira ao longo dos próximos anos com vistas a retomar as propriedades emancipatórias da política institucional e iniciar o projeto de reconstrução do país após a tragédia do bolsonarismo.
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