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    Elisabeth Lopes

    Advogada, especializada em Direito do Trabalho, pedagoga e Doutora em Educação

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    Nem sempre é, se lhe parece

    Numa sociedade conservadora e patriarcal, em que a mulher é vista como cidadã coadjuvante, ser forte, aguerrida e corajosa não cai bem

    (Foto: Reprodução)

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    Resultados favoráveis no campo político progressista em algumas pequenas cidades nesse primeiro turno das eleições municipais, tanto para as prefeituras, quanto para as câmaras legislativas suscitam certo alento, frente ao avanço expressivo da extrema direita no país. Jovens candidatos progressistas estreiam ou renovam seus mandatos nos diversos municípios do país com proposições de defesa dos direitos socias, de diminuição da desigualdade social, de políticas de inclusão, de pensar organicamente a cidade com a adequada destinação do orçamento público, priorizando o desenvolvimento sustentável dos bairros periféricos, onde vive a maioria da população pobre. 

    Em Porto Alegre, o resultado do primeiro turno na eleição para a prefeitura nos sinaliza, entre outros aspectos, o quanto o reforço reiterado de falsas narrativas em torno de alguém pode metamorfosear a sua verdadeira face. É o caso de Maria do Rosário, que ao contrário do que pensam, não é a favor de bandido, sua defesa é sobre direitos humanos, é assegurar a preservação da dignidade e integridade das pessoas, independente de raça, cor, gênero, nacionalidade, religião, classe social, além de outros direitos fundamentais do ser humano.

    Maria ao posicionar-se sobre o conflito no oriente médio, manifestou a busca da paz. Em declaração feita na câmara federal em 17/10/2023, suas palavras foram coerentes com sua prática parlamentar de defesa dos direitos humanos. Referiu: “Subo a esta tribuna com dor, a dor de quem vê a guerra e não se conforma, a dor dos pacifistas, dos que acreditam e das que acreditam que a vida deve vencer. Semana passada, ocupamos a tribuna para denunciar a violência que foi praticada contra Israel. Sofremos com o povo daquela nação pelos sequestros e ataques. Hoje, uma semana depois, ocupamos esta tribuna para sofrer juntos com os palestinos, com quem se encontra na Faixa de Gaza, porque não há como fazer uma ação que defenda a vida selecionando uma vida como mais importante que outra”. Em suas palavras não podemos identificar qualquer discriminação de um povo em detrimento do outro, como tentam convencer a opinião pública no sentido de angariar sobre ela, mais rejeições (para consultar a íntegra do discurso acessar a página da Câmara dos Deputados Sessão: 207.2023, Hora: 17:48, Fase: BC, Orador: Maria do Rosário, PT-RS).

    Numa sociedade conservadora e patriarcal em que a mulher ainda é vista, em farta medida, como cidadã coadjuvante, o fato de ser forte, aguerrida, independente e corajosa em seus enfrentamentos políticos não cai bem entre as mentes hipocritamente retrógadas. 

    No primeiro debate do 2º turno em 10/10/24, promovido pela rádio Gaúcha, Sebastião Melo, como era de se esperar em seu devaneio bolsonarista, atacou a sua adversária chamando-a de deputada agressiva, bem comum a um comportamento misógino, machista e de má fé. Por não abaixar sua cabeça e ir à luta pelo que acredita e defende, Maria é taxada pela mediocridade desumana como persona não grata. 

    Assim é vista por alguns, a concorrente de Melo à prefeitura. Maria sofre uma rejeição injusta e absurdamente insana por parte de uma parcela de porto-alegrenses conservadores e apegados a falsos mitos que se perpetuam pela repetição mal intencionada da mídia corporativa, da direita e da extrema direita. 

    Manoela D’Avila ao fazer parte da candidatura de Fernando Haddad à presidência do país, em 2018, foi alvo de ataques brutais dessa mesma fração da população porto-alegrense, formada por pessoas obscuras, preconceituosas e, em certa medida, cultivadoras de um sadismo embrutecedor que lhes retira a condição de ser autenticamente humanas. Atacaram sua família, sua pequena filha, sua trajetória íntegra e vitoriosa como mulher na política, que ousou enfrentar os movimentos reacionários e extremistas de direita, a violência de gênero que a ameaçou, por verem nela uma potência progressista de incansável luta contra as injustiças socias.  

    Outro fenômeno difícil de entender diz respeito à expressiva votação, no dia 6/10/24, de um prefeito que não cuidou da cidade e de seus moradores, como deveria em razão de suas obrigações administrativas. Sebastião Melo falhou em inúmeros serviços, como na saúde e as visíveis filas diárias de usuários em busca de tratamentos especializados, junto às unidades de saúde, sem nenhum êxito. Melo prevaricou na pasta da educação, marcada por escândalos de corrupção. Melo esqueceu de realizar melhorias no transporte público coletivo usado por um enorme contingente populacional, sem esquecer de sua grave falha, ainda viva na memória dos porto-alegrenses, referente a inexistente manutenção do sistema de proteção da cidade contra enchentes e alagamentos, que racionalmente não se devem apenas às mudanças climáticas, como estamos cientes.

    Com tantas desconsiderações às necessidades da população, reeleger o atual prefeito de Porto Alegre para continuar ocupando a cadeira de gestor municipal é, no mínimo, gostar de sofrer.

    Como recuperar uma escolha consciente e lúcida do povo, acerca de quem deverá merecer a missão de representá-lo? Qual candidato vai desenvolver, com afinco, projetos de desenvolvimento que repercutam na melhoria da qualidade de vida não somente com relação aos bairros em que vivem as classes mais abastadas, mas aos localizados na periferia, mais carentes de cuidados vitais básicos. 

    A título de exemplo, o abastecimento de água nos bairros pobres já deveria ter sido um problema superado. Nos fortes verões que assolam Porto Alegre, com temperaturas atingindo níveis intoleráveis, a falta de água é recorrente no Morro da Cruz, entre outros bairros não assinalados na agenda de Melo que mantém sua atenção onde circula as classes alta e média, enquanto o povo pobre e periférico agoniza, recebendo alguns carros pipa com água de baixa qualidade, quando a situação insustentável fica visível na mídia. Como viver sem água? 

    Durante as enchentes de abril, deste ano, vários bairros foram atingidos, inclusive os de moradores abastados. Entretanto, o que parecia ser um vetor de revolta como era de se aguardar não vingou, pois as mazelas foram logo resolvidas pela prefeitura. Dentre os 49,72% de votos válidos recebidos por Melo (MDB) no primeiro turno, certamente figuram os votos destes moradores privilegiados que jamais votariam nas adversárias de esquerda, Maria do Rosário (PT) e Juliana Brizola (PDT). 

    É certo que o restante de parte da população engrossou essa enorme votação para o Melo com seu chapéu de palha e seu jargão de campanha, deixa o homem trabalhar. Muitos destes eleitores perderam suas casas e seus familiares na tragédia de 5 meses atrás pela falta de manutenção dos diques e demais mecanismos refreadores dos alagamentos. 

    Contudo, enganados pela presença forçada do prefeito em seus bairros nos dias mais críticos da tragédia e durante os meses da campanha eleitoral, ironicamente parte do povo não consegue responder à pergunta: o que o homem de chapéu de palha deixou de fazer, ou de trabalhar nos últimos quatro anos?

    Por mais difícil que seja analisar as contradições mencionadas nos parágrafos anteriores deste texto e pelo revelado gosto nas urnas de significativa parte da população da capital em querer voltar a agonizar pelos maus tratos que recebeu na gestão Melo, resta referir alguns pontos para reflexão dos eleitores que compareceram às urnas e daqueles 31,51% que se ausentaram.

    Toda vez que temos a oportunidade de manifestar a escolha de quem irá nos representar é oportuno lembrar do direito ao voto negado às mulheres por muito tempo. Somente em 1932 esse direito foi assegurado pelo Decreto nº 21.076 do Código Eleitoral Brasileiro. 

    É importante assinalar, que essa vitória se deveu à luta de mulheres de várias gerações do mundo, a partir do século XX com o fim precípuo de auferir o mesmo direito que sempre foi concedido aos homens. Foram intensos e continuados movimentos, que não se encerraram ao direito ao voto. Há imprescindíveis reivindicações na pauta das bravas mulheres que continuam na luta para eliminar, de uma vez por todas, a totalidade de discriminações e crimes de que ainda são vítimas. À guisa de exemplo, a aprovação da Lei 14.022 que alterou a Lei nº 13.979 e trata, dentre outras medidas, sobre o enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher, decorreu de um do Projeto de Lei n° 1291 de iniciativa da deputada federal Maria do Rosário (PT/RS), entre outros de sua autoria em direção à defesa de direitos humanos, tema que essencialmente move sua atuação como parlamentar.

    Nessa perspectiva de lutas justas empreendidas por mulheres e homens no esforço da máxima proteção à dignidade humana, é necessário refletir, com toda o empenho possível, sobre o compromisso de jamais desperdiçar a importância de nossa escolha junto à urna, mediante o voto consciente e despido de qualquer preconceito, considerando que nem sempre é, se lhe parece.  

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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