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    Denise Assis

    Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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    Nem tudo o que é bom para os EUA é bom para o Brasil

    A jornalista Denise Assis alerta para "a morosidade da Justiça" com Jair Bolsonaro

    Donald Trump (à esq.) e Jair Bolsonaro (Foto: Alan Santos/PR via BBC)

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    Nem tudo o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil, como na frase do embaixador brasileiro em Washington, Juracy Magalhães (1964 a 1965), usada por décadas para ironizar os “entreguistas” da direita e da extrema-direita no Brasil. Dessa vez, o que os estadunidenses consideraram bom a ponto de querer repetir a dose – estamos falando da eleição de Donald Trump, para mais um mandato à frente da Casa Branca -, nos fez muito, mas muito mal mesmo.

    Com a morosidade da Justiça (que no Brasil, além de ter os olhos vendados, é lerda), o inelegível e ex-presidente Jair Bolsonaro, vai “atenuando” a indignação contra ele e mais 16 pessoas, envolvidas no suposto esquema de falsificação de vacinas, no qual foram indiciados em março de 2018 e toda a enfieira de crimes em que está sendo investigado. Não bastasse a sua desenvoltura durante as eleições municipais, quando viajou, subiu em palanques, fez carreatas e cumpriu agenda de chefe de partido, influindo escancaradamente em algumas praças.

    Agora, com a eleição de Trump, como já foi fartamente comentado, ele se sentiu à vontade, fortalecido, para colocar a cabeça de fora e se pronunciar em um espaço em que pisa em ovos: a mídia. Em busca da pauta que persegue desde que subiu naquele caminhão de som, em fevereiro deste ano - e nós deixamos -, Bolsonaro só pensa em anistia. Mesmo não tendo ainda a menor ideia do que vem pela frente nos processos a que responde, e nem sequer tenha sido condenado. E pela generosidade dos espaços a ele concedido, sua simpatia por Trump (ninguém sabe se a recíproca é verdadeira, mas por via das dúvidas, melhor “prestigiar”), o ex-presidente tem vindo às páginas e telas “desenrolar”, como se diz na linguagem dos marginais, o seu passado recente.

    E, já que mencionamos o jargão, vamos também observar a técnica da sua argumentação. No “desenrola”, a bandidagem pega o que lhe está sendo imputado, vira do avesso junta “cacos”, como no teatro, e usa como base da sua própria defesa. Vamos aqui resgatar, por exemplo, a entrevista dada ao jornal O Globo, publicada na sexta-feira (08/11). Há pérolas desse método em cada frase em que tenta escapar, ou imputar a outros o que lhe cabe.

    “A minha preocupação é com quem vai me julgar. Tem de aplicar a lei. Eu não estava no Brasil no dia 8 de janeiro, Eu estava fora. Se eu estivesse no Brasil, acho que estaria complicada a situação, né?”. Aqui o cinismo transborda, porque ele usa o próprio plano, para contra-argumentar. Notoriamente, sua viagem teve exatamente essa intenção, como todos sabemos, a de servir de álibi. 

    Na mesma resposta, Bolsonaro traz o Capitólio, onde aponta: “No Capitólio morreu gente. Tentaram colocar a culpa no Trump” – para deixar claro que lá foi mais grave ainda e Trump ficou impune. Também transparecer uma proximidade que talvez não tenha, mas faz efeito, por aqui.

    Mas é nesta outra resposta, um tanto longa, mas vale a pena ler de novo, é que ele se entrega. O que descreve é o seu malogrado plano golpista. Límpido como água da bica, porém ele o descreve para argumentar que não deu certo. Quem lê o seu “passo a passo”, saberá os caminhos percorridos por ele e sua turma, rumo ao 8 de janeiro:

    “Não estou assumindo que discuti ou não – a minuta do golpe. Estou questionando. Quem autoriza o decreto de estado de sítio é o Congresso. Eu falava para os ministros que estavam ao meu lado: ‘Vão buscar os remédios dentro da Constituição. Entendo que a Constituição é o remédio para os conflitos institucionais. Agora, falar que eu estava preparando um golpe, pô, pelo amor de Deus. Você não vai (dar um golpe) depois que o TSE anunciou o resultado. Ninguém vai contigo. Quando o chefe do Executivo não é reeleito, 80% dos seus ministros desaparecem. Somente 10% ficam em cima do muro. Não tem como fazer mais nada. Se convidar para um churrasco, de 23 ministros vão aparecer três, pô. Como vou dar um golpe num clima desses?”

    Está aqui, descrito pelo próprio, o plano e o real motivo pelo qual o golpe não se viabilizou. Bolsonaro ficou com a minuta embaixo do braço. Sua ignorância vai a ponto de ele ter pensado que um decreto de estado de sítio poderia ser um ato autocrático. Ao saber que havia “rito”, e os militares por não querer aporrinhação no pós-golpe não iriam com ele, viu que o buraco era mais embaixo. E tão fundo que deu margem ao comandante tentar posar de herói e ministro da Defesa se aproveitar do fiasco para defender tese, com veemência, em favor do Comando que quase embarcou. Sobrou chance de um “desenrola” para todo mundo. Até para a mídia, que agora restaura a foto do inelegível, a bordo de uma eleição do outro lado do Atlântico.

    É esperar para ver se, ou quando, o PGR enfim resolver agir, a cobertura vai ser pró ou contra. Vai ter cobertura de Bolsonaro sendo preso? Vai ter Bolsonaro preso? Vou pedir ao Papai Noel...

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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