Nicarágua cobra que Brasil apresente ato formal de expulsão do embaixador bolsonarista do país
País da América Central afirma que Breno Dias da Costa não foi expulso e diz que o Itamaraty anda mudando de versões sobre o episódio
Segue sem esclarecimentos a suposta expulsão do embaixador brasileiro em Manágua engendrada dentro do Itamaraty e vazada, como gatilho de uma crise diplomática, para a Folha de S.Paulo. A notícia, gerada obviamente sem dar voz ao governo nicaraguense, deu margem à expulsão "em reciprocidade" da embaixadora nicaraguense em Brasília.
Ouvida, a Nicarágua afirma que o embaixador brasileiro no país, Breno Dias da Costa, não foi expulso e desafia o Brasil a apresentar um documento chamado ato formal de expulsão, essencial e rotineiro para oficializar esses casos extremos.
Questionado por este jornalista, o Itamaraty, depois de certa insistência, acabou por recusar-se a apresentar o ato, alegando que houve, sim, comunicação formal da Nicarágua, mas que tal comunicação não pode ser apresentada, pois, segundo afirma a chancelaria, "as correspondências diplomáticas formais entre governos são invioláveis". A resposta do Itamaraty recorre a uma convenção de Viena para não tentar pôr uma pedra sobre o tema.
O governo da Nicarágua tomou conhecimento dessa alegação do Itamaraty e deixou saber que o Brasil anda mudando de versões sobre o episódio: primeiramente falou que o embaixador "foi mandado embora" por não ter ido às comemorações públicas do dia 19 de julho em Manágua, a data nacional que celebra a vitória da revolução sandinista contra a ditadura de Anastácio Somoza, apoiada pelos Estados Unidos.
Depois, diz Manágua, o Brasil fez saber que a Nicarágua havia pedido que o Itamaraty retirasse o embaixador.
Expulsar ou pedir a retirada são duas medidas diferentes em diplomacia, explica a fonte nicaraguense. Acrescenta que nenhuma das providências foi solicitada ao Brasil. Houve, sim, um chamado do embaixador para adverti-lo por sua ingerência nos assuntos internos da Nicarágua por meio de sua colaboração com elementos oposicionistas.
E acrescenta: Nicarágua não ordenou nem pediu ao Brasil a retirada do embaixador brasileiro, nomeado por Jair Bolsonaro e Ernesto Araújo. E conclui: a Nicarágua sempre publica suas notas diplomáticas.
Segue, portanto, a suspeita de que o governo Lula tenha cedido à conspirata da ala bolsonarista do Itamaraty, da qual resultou a expulsão, essa sim oficial, da embaixadora nicaraguense em Brasília, Fulvia Matu, heroína da revolução, "em reciprocidade". Uma retribuição estranha, na eventual inexistência do ato original nicaraguense. A anotar ainda a coincidência de o atrito provocado com a Nicarágua ocorrer em paralelo à ofensiva do Brasil para ingerir nas eleições da Venezuela.
Nos mandatos petistas anteriores, tanto de Lula como de Dilma, o Brasil alinhou-se com Venezuela e Nicarágua, opondo-se às diversas iniciativas de sabotar os governos dos dois países, sempre insufladas, quando não realizadas diretamente, pelos Estados Unidos.
Agora, de distintas maneiras, o Brasil de Lula entra em colisão, ao mesmo tempo não apenas com a o governo de Daniel Ortega, herdeiro da revolução sandinista, mas também com a revolução bolivariana da Venezuela. Seria mera coincidência ou indício de uma mudança de alinhamento maior.
Em ação conjunta com a mídia pro-Washington, a ala bolsonarista do Itamaraty vem criando fatos consumados e ditando condutas diplomáticas ao próprio Palácio do Planalto. Isso se dá, ainda que à revelia do próprio Partido dos Trabalhadores, cuja Executiva Nacional se apressou em reconhecer a legalidade da reeleição de Nicolás Maduro mantendo distância dessas guinadas intrigantes.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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