O duelo final de Bolsonaro com Alexandre de Moraes
“Bolsonaro quer estar vivo até 2022”, diz o jornalista Moisés Mendes, que destaca: “se conseguir sobreviver e ir para o segundo turno em 2022, terá pela frente o ministro que tentou controlar desde 2020. Moraes presidirá o TSE durante a eleição”
Por Moisés Mendes, do Jornalistas pela Democracia
Alguns episódios nem tão recentes ajudam a entender como Alexandre de Moraes se transformou na figura com poder institucional que mais afronta e atemoriza Bolsonaro e o entorno que o protege, incluindo os militares.
No dia 19 de junho de 2020, uma sexta-feira, os jornalões divulgaram
com certa candura essa informação. Três ministros de Bolsonaro bateram na porta da casa do ministro Alexandre de Moraes em São Paulo.
Os jornais informaram que os quatro trataram, entre outros assuntos, de um processo sobre a indenização da União à indústria sucroalcooleira por perdas com os preços controlados do setor.
Quem quisesse que acreditasse que os ministros André Mendonça (Justiça e Segurança Pública), Jorge Oliveira (Secretaria-Geral da Presidência) e José Levi Mello do Amaral Júnior (Advocacia-Geral da União) teriam ido a São Paulo, numa sexta-feira, para tratar das controvérsias jurídicas de danos do tabelamento dos preços do açúcar e do etanol. Nem os escravos de coronéis dos canaviais acreditariam.
Os três foram ao encontro de Moraes 18 dias depois de outra visita. No dia 1º de junho, uma segunda-feira, o então ministro da Defesa, general Fernando de Azevedo e Silva, também esteve na casa de Moraes.
A imprensa noticiou vagamente que trataram da melhoria da interlocução do governo com o Supremo. Ninguém apresentou, ao contrário do que ocorreu quando da visita dos três ministros civis, uma motivação esdrúxula.
A verdade nem tão encoberta é que Bolsonaro estava tentando dar um bafo no ministro. As duas reuniões são decisivas para que se compreenda o que acontece na sequência e que acaba por transformar Alexandre de Moraes no mais bravo integrante do Supremo no enfrentamento das estruturas de poder que sustentam Bolsonaro, dentro e fora do governo.
Moraes foi visitado por um general comandante da Defesa e que havia assessorado o ex-presidente do STF Dias Toffoli. Logo depois, recebeu três civis fiéis e prestativos enviados por Bolsonaro. O que não deu certo ou precisava de melhor amarração depois da reunião com Azevedo e Silva?
Na época, Moraes estava fechando o cerco contra os operadores, patrocinadores e participantes dos atos pró-ditadura e dos esquemas das fake news, presidindo os dois inquéritos que corriam no Supremo.
Depois das reuniões, não houve nada que pudesse configurar um recuo, apesar da lentidão e frouxidão das investigações da Polícia Federal.
O que aconteceu há pouco, em outra direção, é que o ministro largou de volta no colo da Procuradoria-Geral da República a tentativa de sabotar os processos.
A PGR havia pedido que Moraes engavetasse o inquérito dos atos antidemocráticos, que envolve políticos com mandato, por falta de indícios e provas consistentes. O pedido foi atendido.
Mas o ministro juntou tudo num novo super inquérito, que continuará tratando das ações em favor do golpe, das fake news e do gabinete do ódio.
A Polícia Federal vai ter que trabalhar. O recado é que os casos são retomados de forma mais assertiva por Moraes. E agora, para complicar a vida de Bolsonaro, tudo o que for apurado sobre as facções das fake news será compartilhado com o Tribunal Superior Eleitoral.
É onde corre o processo eleitoral contra a chapa Bolsonaro-Mourão pelo esquema de disparos de notícias falsas, difamações e outras bandidagens na campanha de 2018.
São movimentos que acontecem enquanto Bolsonaro entrega os anéis, os dedos e tudo o que resta de joias e semijoias ao Centrão e se prepara para as batalhas finais ao lado de Braga Netto, Ciro Nogueira e Onyx Lorenzoni.
Bolsonaro quer estar vivo até 2022, do jeito que for possível. Terá de medir o preço e o grau de fidelidade dos que estão extorquindo o governo em troca de proteção, avaliar todos os dias o humor dos últimos generais (enquanto delira com um golpe com polícias militares e milícias) e tentar conter os estragos das manifestações de rua e da segunda etapa da CPI do Genocídio.
Se conseguir sobreviver e ir para o segundo turno em 2022, terá pela frente o ministro que tentou controlar desde 2020. Moraes presidirá o TSE durante a eleição. O que Bolsonaro irá armar para desafiá-lo e tumultuar a eleição e seus resultados?
Bolsonaro puxava e puxou conversas diretas com Dias Toffoli e Luiz Fux. Vai se atrever a tentar comer pizza com Moraes antes do processo eleitoral?
Quem será o próximo emissário a procurar o ministro para tratar do preço do açúcar, já que o golpe do voto impresso deixará de ser assunto, quando estiver sepultado como pauta no Congresso de ideias semipresidencialistas?
Alexandre de Moraes é, há um ano, o terror de Bolsonaro, porque decidiu não só vestir a toga, mas dormir de toga.
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