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    Luis Felipe Miguel

    Professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB). Os textos reproduzidos nesta coluna são postados originalmente no Facebook do autor

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    O golpe foi um golpe

    "Reparação oficial a Dilma Rousseff incomoda a imprensa. Por quê?", questiona o cientista político Luis Felipe Miguel

    Presidente Dilma Rousseff na tribuna do Senado durante o Golpe de 2016 (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)

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    (Publicado no site A Terra é Redonda)

    Noticia-se que o governo está pensando em promover uma reparação simbólica a Dilma Rousseff, agora que o Poder Judiciário confirmou que o pretexto usado para derrubá-la – as “pedaladas fiscais” – não se sustenta.

    É o correto a ser feito. Não só em relação a Dilma Rousseff, embora só isso já fosse suficiente. É importante, para a história do Brasil, deixar registrada essa tautologia: o golpe foi um golpe. Com consequências que foram muito além da retirada ilegal, de seu cargo, de uma presidente eleita.

    O golpe marcou a ruptura, de vastos setores da classe dominante brasileira, com o princípio do respeito às regras do jogo. Inaugurou um período de vale-tudo na política brasileira, com incerteza quanto à vigência das normas constitucionais, marcado pela permanente queda de braço entre os poderes. Afinal, deslanchado por Eduardo Cunha e impulsionado pela Lava Jato, o golpe não poderia deixar de assinalar o triunfo do gangsterismo político.

    O rompimento dos consensos sobre valores democráticos e igualitários básicos, alimentado pela direita tradicional, PSDB à frente, abriu espaço para o crescimento de uma aberração como o bolsonarismo.

    Os líderes do golpe em 2016 e aqueles que se reuniram em torno de Jair Bolsonaro, que no script inicial estavam destinados a ser meros coadjuvantes, se irmanavam, porém, no projeto de redução do Estado e desmonte das proteções oferecidas à classe trabalhadora.

    Em suma: o golpe nos legou desorganização institucional, violência política e ampliação da desigualdade.

    Mas a Folha de S. Paulo publicou ontem um editorial furibundo contra o possível desagravo a Dilma Rousseff.

    É um texto cheio de ódio. Diz que a ideia de Lula, de oferecer uma reparação a Dilma Rousseff, é um absurdo: “não bastou a sinecura internacional com que a presenteou”.

    A Folha julga que Dilma Rousseff não tem competência para ser presidente do Banco do BRICS? Que apresente seus argumentos. Em vez disso, prefere lançar acusações ao vento.

    Mas o central, anunciado já no título, é que “não foi golpe”.

    O que o editorial diz é que “a lei dos crimes de responsabilidade […] é flexível a ponto de permitir o enquadramento de virtualmente qualquer governante”. Em seguida, assume que “Não foi a tecnicalidade das pedaladas fiscais […] que de fato derrubou Dilma Rousseff”.

    Ela caiu por conta de sua “política econômica” e de sua “inapetência [sic] parlamentar”.

    (Está certo que a péssima redação dos editoriais da Folha é lendária, mas este se superou.)

    Em suma: o jornal reconhece que a presidente foi retirada do cargo sob falso pretexto. Mas não podemos chamar de golpe mesmo assim.

    A mídia corporativa brasileira foi cúmplice do desmonte da Constituição no Brasil, patrocinando a Lava Jato, apoiando o golpe, aplaudindo as práticas autoritárias do governo de Michel Temer, normalizando o bolsonarismo.

    Depois, quando o fedor neofascista do governo passado começou a ficar forte demais, quis se fazer de paladina da democracia. A Folha ainda mais que seus concorrentes.

    Sem nem sombra de autocrítica, é claro. Se é incapaz de se arrepender por ter colaborado com a tortura de opositores da ditadura, porque iria fazer mea culpa pela simples participação coadjuvante numa trama golpista?

    O editorial de ontem só confirma que ela segue nesse caminho.

    (Publicado originalmente nas redes sociais do autor.)

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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