TV 247 logo
    Sara York avatar

    Sara York

    Sara Wagner York ou Sara Wagner Pimenta Gonçalves Júnior é bacharel em Jornalismo, licenciada em Letras Inglês, Pedagogia e Letras vernáculas. Especialista em educação, gênero e sexualidade, primeiro trabalho acadêmico sobre as cotas trans realizado no mestrado e doutoranda em Educação (UERJ) com bolsa CAPES, além de pai, avó. Reconhecida como a primeira trans a ancorar no jornalismo brasileiro pela TVBrasil247.

    42 artigos

    HOME > blog

    O impacto perigoso de Elon Musk na propagação de ideias racistas nas redes sociais

    Musk reforça ideias equivocadas sobre genética humana, confundindo o público e sugerindo base científica para o racismo inexistente

    Elon Musk em Washington, EUA 13/11/2024 REUTERS/Brian Snyder/Arquivo (Foto: Brian Snyder)

    Nos últimos anos, Elon Musk tem se envolvido ativamente com uma conta de extrema direita no Twitter, que compartilha ideias profundamente racistas. Embora muitos o vejam como um visionário da tecnologia, suas interações com esses grupos têm levantado sérias preocupações sobre o impacto que ele pode ter na propagação de ideologias perigosas, incluindo o racismo científico. Racismo científico? Parece novo, ne?!

    Tenho pesquisado a transfobia científica enquanto conceito que se refere à discriminação e preconceito que se manifestam no âmbito científico e acadêmico em relação a pessoas transgêneras e de gênero não binário. A partir das minhas constatações, podemos entender esse fenômeno como uma série de crenças e práticas que perpetuam estigmas e desinformação sobre as identidades de gênero.

    Aqui estão alguns pontos-chave que podem ajudar a conceituar a transfobia científica:

    Crenças Negativas: A transfobia científica se baseia em crenças negativas e estereótipos sobre pessoas trans, que podem influenciar a pesquisa e a interpretação de dados. Quando na verdade negar parte da população já o é constante nos processos sociais e acadêmicos.

    Deslegitimação de Identidades: O truque "somos todos iguais", mas quem não é chamada para casamentos e batismos ainda somos nós. Muitas vezes, a ciência deslegitimou as identidades trans ao não reconhecer a diversidade de experiências e expressões de gênero, o que pode levar à exclusão dessas identidades em estudos e políticas.

    Pesquisa Tendenciosa: A falta de representação de pessoas trans em estudos científicos pode resultar em conclusões tendenciosas que não refletem a realidade de suas vidas e necessidades. Gosto de pensar nos trabalhos desenvolvidos com primatas por mulheres no início dos anos 1970. Como não havia mulher nas pesquisas, os cientistas* realmente descreveram o "macho-alfa" como o mais esperto do bando. Anos depois, as mulheres comprovaram serem fêmeas.

    Impacto em Políticas de Saúde: A transfobia científica pode influenciar a forma como as políticas de saúde são desenvolvidas, afetando o acesso a tratamentos e recursos adequados para pessoas trans.

    Recusa à Autodeterminação: Muitas vezes, a transfobia científica se manifesta na negação do direito das pessoas trans de se definirem a si mesmas, o que pode ter consequências graves em seu bem-estar psicológico e social. Seria como ser uma Pablo Vitar onde só se consideram cantoras Maria Bethania e Callas. Sem a percepcao inventiva de outros grupos, como sociologicamente, etnografá-los, por exemplo?

    Mas retornemos ao grande Elon Musk e seu brinquedo de manipulação de mentes.

    O ressurgimento do racismo científico

    O termo “racismo científico” se refere ao uso distorcido de dados científicos para justificar ideias preconceituosas sobre a superioridade de certos grupos raciais. Musk, ao retuitar e interagir com uma conta que promove esse tipo de conteúdo, contribui para a amplificação de ideias baseadas em pseudo-ciência.

    A conta em questão compartilha alegações racistas que argumentam que pessoas negras são “intelectualmente inferiores” por natureza, uma ideia amplamente desacreditada pela ciência há gerações. No entanto, esses grupos continuam a ser alimentados por figuras públicas influentes, como Elon Musk, que, com um simples retweet, dá visibilidade a tais noções, alcançando milhões de pessoas.

    A influência de Musk: de “paciente zero” a multiplicador de ideias racistas

    O impacto de Musk nesse cenário é notável. Ele foi descrito como “paciente zero” para a propagação de ideias racistas nas redes sociais, um termo que sugere que ele, ao interagir com tais contas, iniciou ou acelerou um movimento de disseminação dessas ideias.

    Musk, com sua enorme base de seguidores no Twitter, ao engajar com esses perfis, gera picos no número de seguidores dessas contas marginalizadas, amplificando suas mensagens nocivas. A simples resposta de Musk serve como uma espécie de validação, atraindo atenção para conteúdos altamente prejudiciais e permitindo que as ideias racistas se espalhem mais rapidamente do que teríamos em cena aberta.

    A armadilha das simples correlações

    Um dos métodos usados pelos defensores do chamado “racismo científico” é a manipulação de dados de QI (quociente de inteligência) para afirmar que as pessoas de origem europeia são, de alguma forma, intelectualmente superiores. Esses grupos utilizam gráficos simples e dados fora de contexto para reforçar suas alegações, distorcendo os fatos para promover um ponto de vista preconceituoso.

    Por exemplo, gráficos que comparam o QI de “americanos negros” com “americanos brancos”, apontando uma diferença de valores, são apresentados como prova de uma suposta diferença biológica entre as raças. No entanto, como apontam os principais críticos desse movimento, essa é uma falácia básica: correlação não é uma justificativa nessa causa. Ou seja, os dados de QI não explicam, por si só, as complexas questões sociais, culturais e históricas que influenciam esses resultados.

    O perigo do racismo disfarçado de ciência

    Embora Musk tenha acesso a informações científicas e tecnologias de ponta, ele tem sido criticado por alimentar essas ideias com base na “aparência” de que essas afirmações têm um respaldo científico. Como bem destaca o Dr. Sasha Gusev (que também segue atento as redes sociais), professor associado da Harvard Medical School, o conceito de raça não tem base biológica real. Já sabíamos desde o projeto GENOMA, lembram? O modelo evolutivo da diversidade genética é muito mais complexo do que as divisões raciais rígidas e isoladas que ainda são promovidas por esses grupos. A Dra. Edmea Santos, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, tem trabalhado na etnografia de vários movimentos sociais e em rede e garante que "tais movimentos são cíclicos e previsíveis, basta que voltemos a atenção à nossa história e memória".

    Para Gusev, quando Musk compartilha e dá visibilidade a tais conteúdos, ele reforça uma visão falha da variação genética humana, ao mesmo tempo em que confunde o público, fazendo-o acreditar que há uma base científica para o racismo, quando, na verdade, não há.

    O que está em jogo aqui não é apenas uma simples questão de desinformação; é a segurança e o bem-estar das pessoas, especialmente de grupos historicamente marginalizados. Quando figuras públicas de alto perfil como Elon Musk dão atenção a essas ideias, elas ganham uma legitimidade falsa. Isso cria um ciclo em que mais pessoas são expostas a essas teorias, mais dispostas a aceitá-las e a compartilhá-las.

    Além disso, os dados mal interpretados e os gráficos simplistas têm um apelo imediato e emocional, tornando mais difícil para o público em geral entender as complexas falácias científicas que estão sendo apresentadas. Isso pode levar a uma aceitação inconsciente de ideias perigosas, o que torna ainda mais urgente a atuação de especialistas para desmentir essas afirmações.

    A responsabilidade das figuras públicas

    A principal questão levantada é que as figuras públicas com grande alcance e influência têm a responsabilidade de questionar e refutar esses conteúdos, em vez de amplificá-los. Os cientistas que realmente entendiam de onde esses dados vêm e como ao serem distorcidos se engajam ativamente no debate para educar o público e combater a desinformação.

    Elon Musk, sendo uma das figuras mais influentes do mundo atual, tem uma enorme responsabilidade em suas ações e palavras. Ao apoiar ou dar visibilidade a essas ideias, ele não apenas amplia um discurso de ódio, mas também contribui para a normalização de teorias cientificamente falsas e racistas. A sua influência, em vez de ser usada para promover a inovação e o progresso, está sendo direcionada para a perpetuação de velhas ideias que deveriam ter sido deixadas no passado.

    A necessidade de crítica e educação

    É fundamental que todos, especialmente aqueles em posições de grande influência, compreendam o peso das palavras e das ações que tomam nas redes sociais. Ao espalharem conteúdo racista disfarçado de ciência, como tem ocorrido com Elon Musk, o que está em jogo não é apenas a liberdade de expressão, mas a saúde intelectual e moral da sociedade.

    A batalha contra o racismo científico e a desinformação nas redes sociais é longa, mas é um esforço coletivo que exige a participação de todos, desde especialistas até o público em geral. Só assim será possível evitar que ideias nocivas se enraízem ainda mais em nossa cultura e que as gerações futuras não caiam nas armadilhas do passado.

    Mas é isso que sabemos, os comportamentos preconceituosos nunca andam sozinhos: Quando nao transfóbico, racista, gordofóbico, aporofóbico, sorofóbico e tantas outras formas de sofrer e causar sofrimento ao/no mundo!

    Sigamos!

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

    ❗ Se você tem algum posicionamento a acrescentar nesta matéria ou alguma correção a fazer, entre em contato com redacao@brasil247.com.br.

    ✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no Telegram do 247 e no canal do 247 no WhatsApp.

    iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

    Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista: