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    Emir Sader

    Colunista do 247, Emir Sader é um dos principais sociólogos e cientistas políticos brasileiros

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    O maior enigma do Brasil

    "O enigma maior do país reside em que o Lula faz um bom governo, mas as pesquisas não lhe dão um resultado favorável", escreve Emir Sader

    Lula (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

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    A esquerda triunfou no Brasil, com a derrota do bolsonarismo, a eleição do Lula, e o bom governo que ele realiza. A economia voltou a crescer, o nível de emprego aumenta, há um processo efetivo de distribuição de renda, de diminuição das desigualdades e da miséria.

    O país segue vivendo problemas de pobreza, de gente abandonada nas ruas, de violência e de segurança pública. Mas conseguiu superar o pior momento, quando Dilma foi derrubada por um processo de lawfare – de judicialização da política –, assim como o Lula preso, o que permitiu que Bolsonaro chegasse à presidência do Brasil.

    Mas encara esses problemas e outros, desde uma situação mais favorável. Lula foi eleito novamente presidente do país, derrotando Bolsonaro, apesar de não ter maioria no Congresso e ter que fazer alianças com partidos de centro, além de ter herdado um presidente do Banco Central neoliberal.

    Este mandato do Lula, priorizando fortemente a implementação de políticas sociais, se caracteriza claramente como um governo antineoliberal. O governo tem estabilidade política, Lula se projeta externamente como o mais importante diplomata do século atual. E, internamente, se reafirmou como o maior dirigente político da história do país.

    O Brasil tem muitos desafios pela frente, mas além de contar com a força política e o prestígio de Lula, poderá, talvez, contar com a reeleição dele como presidente, permitindo que governe pelo que lhe resta deste mandato e mais um outro. O que seria fundamental, considerando que o país precisa ainda de um projeto estratégico que permita ao Brasil passar do antineoliberalismo ao pós-neoliberalismo, isto é, superar o período marcado pela hegemonia neoliberal a outro período histórico, que ainda não está claro como poderá ser. Passar do antineoliberalismo ao pós-neoliberalismo.

    Não significa que o governo tenha um programa que lhe permita enfrentar os grandes problemas que o país encara. O governo tem colocado em prática medidas antineoliberais, sem dispor de um projeto de mais longo prazo e de maior profundidade.

    A economia do Brasil continua tendo no capital especulativo sua espinha dorsal. Revela a atração que a ainda alta taxa de juros exerce, canalizando recursos para a especulação financeira e não para os investimentos produtivos.

    Essa situação bloqueia a possibilidade do país retomar um ciclo de crescimento e expansão econômica, apesar da superação da estagnação. A recuperação, pelo governo, do controle do Banco Central pode ser um elemento importante para elevar o ritmo de crescimento da economia.

    Porém, o enigma maior do país reside em que o Lula faz um bom governo, mas as pesquisas não lhe dão um resultado favorável, proporcional ao sucesso do seu governo no plano econômico. Bolsonaro está derrotado, mas o bolsonarismo sobrevive, sem que se entenda suficientemente as razões para isso. Nem o governo de Bolsonaro deixou uma herança positiva, nem o sucesso do governo Lula se reflete em um grau de aprovação amplamente majoritário na opinião pública.

    O resultado das eleições municipais reflete essa situação. A direita, entre o bolsonarismo, o Centrão e outras expressões da direita e da extrema direita, saíram vitoriosos ao longo de todo o país. O PT manteve resultados razoáveis, dado o previsível enfraquecimento do partido a nível nacional.

    Significa que o prestígio da liderança do Lula no país não se traduz amplamente em resultados favoráveis ao PT. Os resultados eleitorais municipais mostram que a esquerda não é mais maioria no país.

    Lula me disse no final do seu segundo mandato que a principal lição que havia aprendido no governo era que é impossível governar sem maioria. Neste momento, essas eleições revelam que a oposição – direita e centro-direita – são maioria hoje no Brasil.

    Antes disso, é indispensável decifrar esse enigma de como o prestígio do Lula e do próprio partido não se traduzem em um apoio nacional amplo e estavelmente majoritário. É indispensável decifrar esse enigma, como condição para a elaboração de um projeto político que permita à esquerda recuperar essa maioria, condição da construção de um novo projeto hegemônico no Brasil, de antineoliberal a pós-neoliberal, e de democratização radical do Estado e do conjunto da sociedade.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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