O mundo em chamas: os EUA e a guerra perpétua
Norte-americanos dão a impressão de que se habituaram a conviver com a guerra perpétua
Num opúsculo de especulação filosófica, A paz perpétua, Immanuel Kant imaginou uma situação, posta no futuro, quando a humanidade deixaria os seus conflitos e viveria sem guerras. Durante a queda do sistema soviético, alguns teóricos releram a sua sucinta obra e apostaram em suas previsões, diante de um mundo unipolar, marcado pelo entendimento.
Os Estados Unidos, pensavam, haviam ganho a corrida e se impunham como vitoriosos, podendo se afirmar no planeta praticamente sem rivalidades. Uma das ironias da história se traduziu na concessão do Prêmio Nobel da Paz a Barak Obama, por ocasião da sua posse, algo que divertiu o próprio laureado, já que seu país se achava envolvido em duas contendas, uma no Afeganistão e outra no Iraque. Isto para não mencionar, depois, escaramuças na Líbia, Paquistão, Somália e Iêmen, nas quais também se arriscaram.
No seu discurso, na Academia de Ciências da Suécia, o dirigente afirmou, não invadido pelo pudor: “Não trago comigo hoje a solução definitiva para o problema da guerra. Há de se aceitar a dura realidade. Não encerraremos nunca o conflito violento em nossas vidas.” É possível que Kant haja ficado longe da realidade, mesmo tantos anos mais tarde. No entanto, andamos parecendo demais com o Dr. Fantástico, de Stanley Kubrick, frente às possibilidades de um holocausto, uma vez que as partes interessadas dispõem de vastos artefatos nucleares e vivem se espicaçando. Antecipando-se às disputas na Ucrânia e as estimulando, Washington participa delas com armamentos, mercenários e ameaças, faltando pouco para se colocar diretamente nos negócios do governo de Kiev. Se não houve avanços no que diz respeito a uma paz perpétua, não restam dúvidas de que a guerra permanece nos prognósticos. Graças a ela, experimenta-se a criatividade em dispositivos bélicos e se movimentam recursos em quantidades inigualáveis, ao mesmo tempo em que não se fala em fome, praga cada vez mais impossível de debelar.
Em plena campanha eleitoral, na atual gestão Biden, o assunto não ganha, como devia, as atenções, além de rápidos comentários de Trump em torno de suas propostas para a Ucrânia e, menos, muito menos, para Israel. O escândalo e as agruras a que se submetem as populações sujeitas às batalhas, em Kursk ou na Palestina, não se mostram suficientes para interromper os esforços.
Norte-americanos dão a impressão de que se habituaram a conviver com a guerra perpétua e não se inclinam a estancá-la em quaisquer circunstâncias. É como se a economia daquela sociedade necessitasse da indústria e da comercialização dos seus produtos mortais, onde os estiverem empregando. Nem a hipótese plausível de, por um rastilho de pólvora, caminharmos para desinteligências nucleares, lhes faz cessar o gosto. Afinal, desde Hiroshima e Nagasaki, a Casa Branca não usufrui da sensação de eliminar de cena duas cidades inteiras para seu próprio prazer. Nós, desde lado do mundo em chamas, estamos cansados. E não há um chá de bom senso para que aquela gente desperte de tais alucinações. Ficaremos no limite ou chegaremos lá?
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