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    Jeffrey Sachs

    Professor da Columbia University (NYC) e Diretor do Centro para o Desenvolvimento Sustentável e Presidente da Rede de Soluções Sustentáveis da ONU. Ele tem sido um conselheiro de três Secretários-Gerais da ONU e atualmente serve como Defensor da iniciativa para Metas de Desenvolvimento Sustentável sob o Secretário-Geral da ONU, António Guterres.

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    O nono aniversário da guerra na Ucrânia

    Este é o 9º aniversário da guerra. E isto faz uma grande diferença

    (Foto: Valentyn Ogirenko/Reuters)

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    Artigo de Jeffrey D. Sachs originalmente publicado no site do autor em 28/2/23. Traduzido e adaptado por Rubens Turkienicz com exclusividade para o Brasil 247

    Nós não estamos no primeiro aniversário da guerra, como os governos e as mídias ocidentais alegam. Este é o 9º aniversário da guerra. E isto faz uma grande diferença.

    A guerra começou com a violenta derrubada do presidente ucraniano Viktor Yanukovych em fevereiro de 2014, um golpe que foi apoiado abertamente e clandestinamente pelo governo dos EUA. Desde 2008, os EUA empurraram a expansão da OTAN para a Ucrânia e a Georgia. O golpe de 2014 contra Yanukovych foi realizado à serviço da expansão da OTAN.

    Devemos manter em contexto este implacável ímpeto pela expansão da OTAN. Os EUA e a Alemanha prometeram explicitamente e repetidamente ao presidente soviético Mikhail Gorbachev que a OTAN não se expandiria “uma polegada para o leste” depois que Gorbachev dissolveu a aliança militar soviética conhecida como o Pacto de Varsóvia. Toda a premissa da expansão da OTAN foi uma violação dos acordos firmados com a União Soviética e, portanto, com a continuação com o estado da Rússia. 

    Os neocons empurraram a expansão da OTAN porque eles buscam cercar a Rússia na região do Mar Negro, assemelhando-se às metas da Grã-Bretanha e da França na Guerra da Crimeia (1853-56). O estrategista estadunidense Zbigniew Brzezinski descreveu a Ucrânia como o “pivô geográfico” da Eurásia. Se os EUA pudessem cercar a Rússia na região do Mar Negro e incorporar a Ucrânia à aliança militar dos EUA, contra a capacidade da Rússia de projetar poder no Mediterrâneo Oriental, no Oriente Médio e desapareceria globalmente – ou é assim que diz a teoria.

    Obviamente, a Rússia viu isto não só como uma ameaça geral, mas como uma ameaça específica de alocar armamentos avançados até a fronteira da Rússia. Isto ficou especialmente ameaçador depois que os EUA abandonaram unilateralmente o Tratado de Mísseis Antibalísticos de 2002, o que, segundo a Rússia, constituía uma ameaça direta à segurança nacional da Rússia.

    Durante a sua presidência (2010-2014), Yanukovych buscou a neutralidade militar, precisamente para evitar uma guerra civil ou uma guerra por procuração na Ucrânia. Isto foi uma escolha muito sábia e prudente para a Ucrânia, mas isto barrou o caminho da obsessão neoconservadora dos EUA com a expansão da OTAN. Quando se iniciaram os protestos contra Yanukovych no final de 2013, quando do atraso na assinatura do percurso de adesão à União Europeia, os EUA aproveitaram a oportunidade para escalar os protestos em um golpe, o qual culminou com a derrubada de Yanukovych em fevereiro de 2014.

    Os EUA intrometeu-se implacavelmente e clandestinamente nos protestos, incitando-os a avançar ao mesmo tempo em que os paramilitares nacionalistas ucranianos de direita entraram na cena. ONGs estadunidenses gastaram vastas somas para financiar os protestos e a derrubada final. Estes financiamentos das ONGs jamais foram desvelados.

    Três pessoas intimamente envolvidas nos esforços dos EUA para derrubar Yanukovych foram Victoria Nuland, então secretária-assistente de estado e agora subsecretária de estado dos EUA; Jake Sullivan, na época conselheiro de segurança do então vice-presidente Joe Biden e agora conselheiro de segurança nacional dos EUA para o presidente Biden; e o então vice-presidente Biden, agora presidente. Nuland foi famosamente pega falando ao telefone com o embaixador doa EUA na Ucrânia, Geoffrey Pyatt, planejando o próximo governo da Ucrânia e, sem permitir quaisquer reconsiderações por parte dos europeus (“Fuck de EU” [Foda-se a União Europeia], disse Nuland na sua crua frase registrada na gravação).

    A conversação interceptada revela a profundidade do planejamento de Biden-Nuland-Sullivan. Nuland diz: “Então, Geoff, sobre esta matéria, quando eu escrevi a nota para o Sullivan dar um retorno diretamente à mim, dizendo que você precisa de Biden e eu disse provavelmente amanhã para um ‘aí garoto’ e receber os detalhes para fazer valer. Assim, Biden querendo”.

    O diretor de cinema estadunidense Oliver Stone nos ajuda a entender o envolvimento do governo dos EUA no golpe, no seu documentário de 2016, ‘Ukraine on Fire’. Eu insto todas as pessoas a assisti-lo para ver o que é uma operação de mudança de regime dos EUA. Eu também insto todas as pessoas a lerem os poderosos estudos acadêmicos do Prof. Ivan Katchanovski, da Universidade de Ottawa, que revisou laboriosamente todas as evidências dos eventos da praça Maidan e descobriu que a maior parte da violência e matança não se originou das forças de segurança de Yanukovych, como foi alegado, mas sim dos próprios líderes do golpe, que dispararam sobre as multidões, matando tanto os policiais quanto os manifestantes.

    Estas verdades permanecem obscurecidas pelo segredo dos EUA e a subserviência europeia ao poder dos EUA. Um golpe orquestrado pelos EUA ocorreu no coração da Europa e nenhum líder europeu ousou falar a verdade. As consequências brutais se seguiram, mas, mesmo assim, nenhum líder europeu fala honestamente sobre os fatos.

    O golpe foi o início da guerra há nove anos. Um governo extraconstitucional, direitista, antirusso e ultranacionalista chegou ao poder em Kiev. Após o golpe, a Rússia rapidamente retomou a Crimeia após um rápido referendo e a guerra explodiu no Donbass, quando os russos no exército ucraniano mudaram de lado e se opuseram ao governo pós-golpe em Kiev.

    A OTAN começou imediatamente a despejar bilhões de dólares em armamentos para a Ucrânia. E a guerra se escalou. Os acordos Minsk-1 e Minsk-2, nos quais a França e a Alemanha deveriam ser cofiadores, não funcionaram; primeiro, porque o governo nacionalista ucraniano em Kiev se recusou a implementá-los e, em segundo lugar, porque a Alemanha e a França não pressionaram pela sua implementação – como foi recentemente admitido pela ex-Chanceler alemã Angela Merkel.

    No final de 2021, o presidente Putin deixou muito claro que as três linhas vermelhas russas eram: (1) a extensão da OTAN à Ucrânia é inaceitável; (2) a Rússia manteria o controle da Crimeia; e (3) a guerra no Donbass precisaria ser resolvida através da implementação do acordo Minsl-2. A Casa Branca de Biden se recusou a negociar sobre a questão da expansão da OTAN.

    A invasão russa ocorreu, tragicamente e erroneamente, em fevereiro de 2022 – oito anos após o golpe contra Yanukovych. Os EUA despejaram dezenas de bilhões de dólares em armamentos e apoios orçamentários desde então, duplicando a tentativa estadunidense para expandir a sua aliança militar na Ucrânia e a Georgia. As mortes e a destruição neste campo de batalha em escalada são horrendas.

    Em março de 2022, a Ucrânia disse que negociaria com base na neutralidade. Efetivamente, a guerra parecia estar próxima do seu final. Foram feitas declarações positivas tanto por autoridades ucranianas quanto russas, bem como pelos mediadores turcos. Nós sabemos pelo ex-primeiro-ministro israelense Naftali Bennett que os EUA bloquearam estas negociações; ao invés disso, eles favoreceram uma escalada da guerra para “enfraquecer a Rússia”.

    Em setembro de 2022, os gasodutos Nord Stream foram explodidos. As irrefutáveis evidências até esta data são que os EUA lideraram aquela destruição dos gasodutos Nord Stream. O relato de Seymour Hersh é altamente crível e não foi refutado sequer em um único ponto importante (apesar de ter sido fervorosamente negado pelo governo estadunidense). Isso aponta para a equipe Biden-Sullivan-Nuland como tendo liderado a destruição do Nord Stream.

    Nós estamos a caminho de uma escalada terrível, ou de silêncio, em muitas das mídias tradicionais estadunidenses e europeias. Toda a narrativa de que este é o primeiro aniversário da guerra é uma falsidade que esconde as razões para esta guerra e a maneira de termina-la. Esta é uma guerra que começou devido ao empurrão irresponsável dos neoconservadores estadunidenses pela expansão da OTAN, seguido pela participação dos neoconservadores dos EUA na operação de mudança de regime de 2014. Desde então, houve uma escalada massiva dos armamentos, das mortes e da destruição.

    Esta é uma guerra que precisa terminar, antes que ela engula a todos nós no Armageddon nuclear. Eu louvo o movimento pela paz pelos seus valentes esforços, principalmente em face das descaradas mentiras e da propaganda do governo dos EUA e do covarde silêncio dos governos europeus – que agem como totalmente subservientes aos neoconservadores estadunidenses.

    Nós devemos dizer a verdade. Ambos os lados mentiram, engaram e cometeram violências. Ambos os lados precisam recuar. A OTAN deve acabar com a tentativa de se estender à Ucrânia e à Georgia. A Rússia deve retirar-se da Ucrânia, Nós devemos atentar às linhas vermelhas de ambos os lados, de modo que o mundo sobreviva.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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