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    Rodolfo Fiorucci

    Doutor em História pela UFG, docente no Instituto Federal do Paraná – IF Jacarezinho

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    O “novo" MEC - A velha educação básica e a nova educação profissional

    A educação brasileira entre perdas e ganhos

    Lula (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil | Marcos Oliveira/Agência Senado)

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    Só existe um caminho para um país subdesenvolvido como o Brasil avançar: Educação. Isso não é opinião, é fato! Há vários exemplos na história recente: Finlândia, Coreia do Sul, China, Canadá etc. 

    A vitória do Presidente Lula trouxe de volta a esperança de finalmente alguém tratar a Educação com fundamentação, prezando a qualidade e não apenas a quantidade, executando uma educação para o futuro e não continuar a reproduzir esse sistema curricular-pedagógico fracassado que é o modelo educacional brasileiro. Ledo engano. 

    Ainda que as nomeações para o MEC tenham nomes de excelência, como o da Reitora da UFRJ, Denise Pires de Carvalho que, embora não apresente em sua formação estudos e pesquisas diretamente ligados à educação, tem uma carreira longa dentro da universidade e experiência de gestão, o que a qualifica para a Secretaria de Educação Superior/MEC; e Getúlio Marques Ferreira, para a Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC), nome ligado à História da Educação Profissional e à criação dos Institutos Federais, é inegável que em alguns setores o novo governo deixou (muito) a desejar, como por exemplo na nomeação de Kátia Schweickardt, ex-Secretaria de Educação de Manaus, na gestão de Arthur Virgílio Neto (PSDB). Katia já chamou professores de criminosos, incentivou a política manauara de diminuição de oferta do ensino noturno, o que é um acinte ao direito universal à educação e está intimamente ligada às fundações que estiveram por trás da Reforma do Ensino Médio, essa aberração pedagógica implementada ainda no governo do golpista Temer. 

    Sendo a revisão dessa reforma um dos elementos fulcrais para a construção de uma certa normalidade no país em médio e longo prazo, a indicação de Katia para a Secretaria específica de Educação Básica é um contrassenso abissal, eu diria inexplicável. Todos sabemos que é um governo de coalizão e que é preciso ceder em vários aspectos, mas na educação é o pior campo para isso. É quase uma prova de que o PT não aprendeu que não basta dar comida à população, mas que é preciso educá-la de verdade e não apenas passar conteúdo e emitir um diploma. Educar é muito mais que isso. E educação é a principal carestia do Brasil.

    Mas já que as esperanças em um avanço na Educação Básica brasileira estão intensamente estremecidas, quero focar na Educação Profissional, Científica e Tecnológica (EPCT), a menina dos olhos da educação nacional. A Rede Federal EPCT está entre os 10 melhores sistemas de educação do mundo, de acordo com o PISA. É sim um dado a comemorar, mas não resolve o problema. Primeiro porque o PISA é um programa de avaliação internacional focado em conteúdos com vistas ao mercado; segundo, porque ainda que seja o melhor sistema no Brasil, ainda está preso na velha, carcomida e ultrapassada organização curricular-pedagógica focada em conteúdos e resultados imediatos. 

      Getúlio terá o desafio de modernizar a EPCT para que ela efetivamente sirva de impulso para a modernização da economia e da sociedade brasileiras. A Rede Federal EPCT atua no presente, com estruturas do passado e sem considerar o futuro (que é cada vez mais presente). Estudos no mundo inteiro trazem a urgência de se modificar os currículos e concepções educacionais, e não há terra mais fértil para isso do que a Rede EPCT. Com milhares de jovens e altamente qualificados professores e técnicos, em estruturas modernas e preservadas (resultado das gestões anteriores do PT), a Rede Federal e em especial os Institutos Federais, podem e devem ser o motor de transformação educacional brasileira. É daí que se dará o salto para o progresso, mas para isso o novo Secretário da SETEC terá desafios imediatos como:

     a) Formar os servidores para a compreensão real da missão da Rede EPCT, algo até hoje cambaleante por conta de concursos mal feitos;

     b) Retomar a política de inclusão, permanência e êxito, o que só ocorrerá com a recomposição e reajuste do orçamento dos auxílios estudantis;

     c) Recompor os orçamentos das instituições, defasados e insuficientes desde 2015;

     d) Trabalhar para a revogação da Portaria 983/2020 – MEC, que transforma os docentes da Rede em aulistas;

     e) Repensar a estrutura dos cargos e funções, pois como está hoje sobrecarrega a gestão, em especial os coordenadores de ensino e equivalentes que têm uma carga enorme de trabalho e recebem uma FG1, o que é pouco estimulante para tal função. Educadores não fazem trabalho voluntário, são profissionais qualificados. E há cargos que exigem reconhecimento financeiro. 

     f) Trabalhar para a instalação total, com estrutura, cargos e funções das unidades já existentes, antes de abrir novas;

     g) Incentivar mudanças curriculares a partir de diretrizes científicas e experiências de sucesso, dando autonomia às unidades para modernizar seus currículos de acordo com as necessidades locais/regionais/nacionais;

     h) Trabalhar para que a Rede EPCT funcione realmente como uma rede, com diretrizes, metas e objetivos claros para todos;

     i) Ouvir com atenção os servidores e gestores da Rede EPCT e considerar as demandas de quem executa o trabalho na ponta;

     j) Lutar pela recomposição salarial dos servidores que colocaram o Brasil entre os 10 melhores do mundo em termos educacionais e que estão marginalizados há anos com perda brutal de poder de compra.

     k) Repensar a carga horária e atribuições docentes que, por falta de servidores técnicos administrativos, precisam se dedicar imensamente às atividades burocráticas, muitas vezes mais que às atividades educacionais;

     l) Desburocratizar a gestão da Rede EPCT, algo que tira o foco da missão fim da educação.

     

     No caso da modernização curricular, a Rede EPCT conta com um exemplo reconhecido nacional e internacionalmente, executado no Campus Jacarezinho do IFPR, com um sistema que foca na aprendizagem e não no conteúdo. Ao contrário do padrão curricular brasileiro, no Campus Jacarezinho o objetivo final do processo pedagógico não é cumprir conteúdo, mas aprendizagem; o conteúdo é meio e não fim. 

     Não se divide estudantes por idade, mas por interesses, potencialidades e dificuldades. Um currículo cujo funcionamento não se dá pelo tempo-escola, mas pelo tempo-aluno. Cada um avança de acordo com sua possibilidade, pois não se tem a ilusão de que todos vão cumprir o mesmo caminho, na mesma velocidade, mas que todos vão caminhar. Nesse modelo, ainda jovem, oferta-se uma educação de fato para todos, pautada no protagonismo e no desenvolvimento de múltiplas habilidades cognitivas e motoras, em consonância com os modelos educacionais mais avançados do mundo.

     Um modelo sem igual no mundo, produção genuinamente brasileira, pensada, organizada e executada completamente por servidores públicos dentro do setor público. 

     Enfim, o MEC não brilhou aos olhos do campo progressista na educação em vários aspectos, mas os quadros qualificados ficam com a missão de resistir e oferecer ao país uma nova educação, uma educação que emancipará o Brasil. E Getúlio Marques tem a nobre e dura missão de fazer essa já admirável Rede EPCT se tornar ainda melhor, mais moderna, mais focada e com vistas para o futuro.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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