O “salto para os evangélicos” é uma ameaça gigantesca à democracia
"É um passo a mais na colonização das instituições do Estado por agentes perniciosos da extrema-direita que avança o projeto de hegemonização das Forças Armadas, das finanças, da política, do Congresso e do judiciário", escreve Jeferson Miola
Na sabatina no Senado, o tremendamente hipócrita André Mendonça disse que “Na vida, a Bíblia; no Supremo, a Constituição”.
Ele ostentava implante de cabelo. Talvez para desviar a atenção e camuflar seu real caráter de agente extremista de direita.
Bastaram, contudo, poucos minutos para Mendonça despir-se da fantasia ensaiada com mídia trainers e usada na pantomima na comissão de constituição e justiça do senado [em minúsculo].
Nos corredores do senado, cercado de familiares e evangélicos parlamentares, um Mendonça “genuinamente evangélico”, como se autodefiniu perante o colegiado, fez seu primeiro pronunciamento como ministro da Suprema Corte como se estivesse pregando na igreja presbiteriana Esperança, na Asa Sul, em Brasília, onde é um reconhecido pastor fundamentalista.
Nesta primeira pregação depois de já escolhido ministro do STF por 47 senadores/as, o pastor terrivelmente evangélico parodiou o astronauta Neil Armstrong e declarou que sua escolha “é um passo para um homem, mas um salto para os evangélicos”.
Na peroração de cerca de 5 minutos em que agradeceu sua escolha à Frente parlamentar evangélica e aos senadores evangélicos, Mendonça fez 7 menções a deus, 6 menções aos evangélicos e uma menção à bíblia, mas nenhuma menção à Constituição!
“Devo tudo da minha vida a deus”, disse ele, recheando o sermão com referências à família supostamente “tradicional” e a deus, sendo correspondido com “améns” dos fiéis que o acompanhavam na “marcha da vitória” pelos corredores do senado.
Na sabatina, entretanto, Mendonça mentiu sobre sua atuação como ministro bolsonarista que defendeu o emprego da Lei de Segurança Nacional para perseguir jornalistas, ativistas, críticos e opositores do governo.
Ele também mentiu quando tentou se desmentir que não havia dito que brasileiros não foram mortos na luta pela conquista da democracia no Brasil. Dissimulado, o pastor treinado por mídia trainers fez um falso pedido de desculpas às vítimas da ditadura e aos seus familiares.
A má escolha de Mendonça para o STF é uma unanimidade no mundo jurídico sério. Walter Maierovitch, por exemplo, sustenta que Mendonça não possui notório saber nem reputação ilibada.
Para Conrado Hubner, “a notória indigência jurídica e a reputação abaixo da linha da torpeza venceram outra vez”.
A nomeação de Mendonça como 11º ministro do STF representa uma ameaça gigantesca à democracia. É um passo a mais na colonização das instituições do Estado por agentes perniciosos da extrema-direita que avança o projeto de hegemonização das Forças Armadas, das finanças, da política, do Congresso e do judiciário.
O fundamentalismo religioso funciona como o cimento ideológico que confere à extrema-direita a base social de massas que abarca a classe trabalhadora, setores pobres, proletarizados e sub-proletarizados da sociedade brasileira.
O ramo da igreja evangélica que subverte os valores cristãos cresce espantosamente na América Latina e no Brasil. É preciso separar o joio do trigo pentecostal e neopentecostal.
Este setor nefasto – anticristão e anti-humanista, na realidade –, não é uma religião e, menos ainda, a representação de uma visão humanista de mundo, porque se caracteriza como um agrupamento político de extrema-direita que combina acumulação financeira com conquista de espaços de poder a partir da exploração da fé.
A escolha de André Mendonça pelo minúsculo senado é um passo perigoso que pereniza a presença deste facínora por quase três décadas na institucionalidade do país.
“O meu compromisso de levar ao Supremo um ‘terrivelmente evangélico’ foi concretizado no dia de hoje”, vangloriou-se Bolsonaro sobre Mendonça, considerado por ele “uma pessoa capacitada para a missão”, na linguagem militar
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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