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    Emir Sader

    Colunista do 247, Emir Sader é um dos principais sociólogos e cientistas políticos brasileiros

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    O shopping center, a utopia neoliberal

    "Esse é o tipo de sociabilidade que propõe e que conquistou grande parte do mundo"

    (Foto: Reuters/Mark Makela)

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    O shopping center chegou quando as cidades se tornavam inseguras. Surgiu como um espaço público de gestão privada.

    Os shopping centers são projetados para que os consumidores percorram a maior extensão possível para se deslocarem de um lugar a outro e ficarem expostos a um número grande de lojas e vitrines. Os cinemas são desenhados de forma que o público tenha que passar pelas lanchonetes antes de entrar nas salas em que os filmes são projetados. Na China, por exemplo, inaugura-se, em média, um multiplex por dia.

    O consumo de pipoca acaba condicionando também a produção de filmes em Hollywood. Filmes dirigidos aos jovens, os maiores consumidores de alimentos, não têm duração longa, para que haja mais intervalos entre as sessões.

    "Quanto mais pessoas logramos fazer passar pela pipoca, mais dinheiro ganhamos", dizia Edward Epstein em seu livro O Grande Filme: Dinheiro e Poder em Hollywood. Frédéric Martel afirma que "os donos de cinema sabem o que estão fazendo: sabem que são ‘vendedores de pipoca’." "Qualquer dono de cinema precisa, antes de mais nada, encontrar um bom lugar para vender pipoca, e depois construir um multiplex em volta", escreveu em seu livro Mainstream, a Guerra Global Entre as Mídias e as Culturas.

    Ao lado de aeroportos e hotéis, os shopping centers têm uma uniformidade imposta pela globalização, que se caracteriza pela ausência de toda referência concreta, diversificada, com tempo e espaço precisos. É o que se caracteriza como “não-lugares”.

    A seletividade do ingresso, sem qualquer mecanismo formal que o exerça, é o poder de compra. O que interessa ao shopping center não é o indivíduo, mas o consumidor. Daí que seja um espaço público-privado, na realidade totalmente mercantilizado, com acesso formalmente aberto, mas com mecanismos de constrangimento suficientes para que seja seletivo, dirigido a quem interessa – os consumidores com grande poder aquisitivo.

    A própria China, que consegue resgatar várias centenas de milhões de pessoas da pobreza, com um desempenho nunca antes conseguido na história da humanidade por nenhum outro país, adota um estilo de consumo baseado nos shopping centers, muito maiores que os ocidentais e mais bonitos.

    Esse é o tipo de sociabilidade que propõe e que conquistou grande parte do mundo. Assim, mesmo vítimas do modelo neoliberal e críticos dos EUA, referendam o estilo de consumo norte-americano, expressando a hegemonia desse modelo, no sentido clássico que Gramsci atribui a esse conceito. Formas de sociabilidade distintas, como o islamismo ou o evangelismo, são muito conservadoras para disputar com a hegemonia norte-americana. Por isso, os shopping centers são a utopia neoliberal.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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