O terraplanismo da taxa de juros no Brasil
O debate em torno da elevada taxa de juros no Brasil (SELIC) ganhou corpo a partir da sensata manifestação do Presidente Lula, indignado com a situação vivida. O tema precisa ser debatido com equilíbrio para compreender e criticar os argumentos que sustentam a Selic no estágio em que está e para esclarecer à sociedade os impactos decorrentes de tal decisão, protegida como sendo eminentemente técnica. O primeiro destaque a fazer refere-se à necessidade de ressaltar, mais uma vez, que o nosso País ostenta a maior taxa de juros dentre os países relevantes na economia mundial. Infelizmente, apesar de toda publicidade dada ao tema, a política monetária do Banco Central (BACEN), encontra-se arraigada num terraplanismo teórico, que teima em não ver a realidade da situação econômica e social do país.
Diante das consistentes críticas de laureados economistas internacionais e das manifestações feitas por lideranças políticas, econômicas, industriais e acadêmicas do país, o BACEN se mantém impassível em sua cruzada de não ceder na revisão de seus postulados.
O BACEN tenta vender para a sociedade uma imagem de um órgão que se diz técnico em suas ações para se atingir as metas de inflação, porém cada vez mais aparenta sua fragilidade de narrativa, quando se observa que a totalidade de países centrais e emergentes que estão sofrendo processos inflacionários piores que os do Brasil como EUA (5%), México (6,9%), zona do Euro (6,9%) adotam taxas de juros muito inferiores aos do país.
A falta de transparência da chamada “análise técnica” do BACEN é gritante. Nas suas Atas apenas são divulgadas as explicações gerais do modelo econômico, mas não são disponibilizadas as variáveis usadas e as especificações dos parâmetros e critérios utilizados na construção de cenários projetados para validação e crítica da sociedade.
O modelo econômico desenvolvido pelo BACEN tem sido tratado como uma ciência exata, a qual não cabe críticas dos demais atores econômicos. Entretanto, todos sabem que a economia é uma ciência humana, na qual coexistem diferentes análises e modelos de projeção que levam a resultados distintos, de acordo com as premissas utilizadas. Pior ainda, é o que faz o Presidente do BACEN, além do chamado “Mercado” e de grande parte da grande mídia nacional, ao desrespeitarem os críticos da atual taxa de juros e rotulá-los como “hereges da ciência econômica”, fato que já demonstra o terraplanismo monetário a que estamos submetidos.
O COPOM nas suas atas de definição da taxa de juros, precisa obrigatoriamente apresentar qual o custo econômico e social do percentual de 1% a mais da taxa de juros da SELIC em relação à taxa de crescimento do PIB, do nível de desemprego, da distribuição de renda, do nível de investimento, da perda de industrialização, do aumento da dívida pública.
A manutenção da taxa de juros de 13,75%, aprovada na semana passada pelo COPOM, representa 4,1 pontos percentuais acima da taxa de juros neutra (aquela que não estimula nem desestimula a atividade econômica). Uma taxa de juros no patamar em que temos devasta a economia nacional e acelera a quebradeira no setor varejista, num cenário onde o endividamento dos brasileiros alcançou o maior nível histórico de 77,9% da população e a inadimplência entre adultos brasileiros atingiu um recorde em março de 2023, atingindo metade da população.
A Autoridade Monetária brasileira precisa acompanhar com urgência, sem antolhos, a realidade econômica e social do país e confrontá-la com pressupostos técnicos próprios e adequados à dinâmica econômica interna, abandonando a opção por “fórmulas econômicas importadas” já tidas como defasadas nos demais países do mundo. A sociedade brasileira – por meio de suas diferentes vozes - tem legitimidade institucional de cobrar uma nova postura do BACEN, contemplando o zelo no controle da estabilidade da moeda, mas associada à sua obrigação legal de atuar em prol do desenvolvimento econômico e social do país.
Caso o Presidente do BACEN persista em sua teimosia contra a realidade do cenário brasileiro, cabe ao Conselho Monetário Nacional (CMN), trazer luz contra as trevas do terraplanismo rentista que dominou o chamado “mercado”, revendo as irreais metas de inflação e definir claramente metas de desenvolvimento econômico para parametrizar a atuação do Banco Central.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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