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    André Lobão

    Jornalista do Sindipetro-RJ

    31 artigos

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    O 'xou' não pode parar

    Chama atenção a forma como a narrativa do seriado vem sendo construída, que é a demonização de Marlene Mattos, empresária da apresentadora

    Xuxa (Foto: Reprodução/TV Globo)

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    O documentário-seriado sobre a apresentadora Xuxa exibido pelo GloboPlay tem apresentado uma grande repercussão na opinião pública. Na TV aberta, no domingo (23/07) assisti uma participação de Xuxa no Domingão do Huck, programa da Globo. Como sempre, e bem, a Globo martela na audiência seus produtos para divulgação.

    Não conferi ainda nenhum episódio, mas devido a repercussão e críticas que tenho lido já dá para fazer algumas reflexões.

    A primeira passa pela apresentação dada pela produção do programa do Huck, uma coisa totalmente sem nexo, de causar constrangimento. Ao lado de Xuxa a produção convidou sua filha Sasha e o jornalista Pedro Bial, diretor do documentário.

    Antes do papo foi exibido um vídeo em que o personagem destaque não era Xuxa , e sim Pedro Bial. O vídeo tentou fazer uma relação da trajetória do jornalista e da apresentadora , mas não colou na intenção, causando constrangimento um nítido constrangimento entre os convidados. A carreira de Bial teve mais destaque com Cazuza aparecendo. Um verdadeiro desbunde jornalístico.

    Demonização programada

    O que chama atenção nessas entrevistas de Xuxa e Bial é a forma como a narrativa do seriado vem sendo construída, que é a demonização de Marlene Mattos, a empresária da apresentadora. Tanto Pedro Bial como Xuxa essa entrevista ao programa de Luciano Huck deram a entender que Marlene Mattos mantinha uma relação abusiva com a apresentadora.

    "Marlene construiu uma fortaleza em torno da Xuxa. Essa fortaleza com o tempo se transformou numa prisão" - disse Bial.

    Essa frase dá exatamente o tom da construção do documentário sobre Xuxa. A história de uma relação abusiva de um artista frágil e alienado, controlado e manipulado por seu empresário. A mensagem é exatamente essa.

    Mas será que Marlene Mattos é o verdadeiro demônio dessa história? Durante anos Xuxa era contratada da TV Globo, que certamente tinha pleno conhecimento dos abusos submetidos à Xuxa. Certamente essa omissão não deve ser abordada na produção. E como bom empregado, Bial tira o peso da responsabilidade da  emissora.

    "É uma história do show business, do entretenimento do Brasil e do mundo como não há outra. Numa época em que não havia diretoras mulheres na televisão. A Marlene era diretora superpoderosa num ambiente machista, num lugar onde não havia mulheres" - justifica.

    O "xou" da Xuxa

    Todo esse debate em torno do documentário sobre Xuxa me fez lembrar e recorrer ao filósofo francês Guy Deborg, pesquisador, autor do livro "Sociedade do Espetáculo", que se tornou uma teoria de estudo comunicacional contemporâneo.

    O centro do estudo de Deborg passa pela análise de que a  alienação é senão uma descrição de emoções ou um aspecto psicológico individual, sendo uma conseqüência do modo capitalista de organização social que assume novas formas e conteúdos em seu processo dialética de separação e reificação da vida humana

    Mas ao aplicar o conceito de Deborg ao estudo de caso de  Xuxa, após a consolidação de sua carreira como apresentadora infantil, e o consequente sucesso que se tornou, a trajetória do fenômeno midiático enveredou pelo caminho da espetacularização de sua vida pessoal. De alguma forma sua carreira parecia apresentar um esgotamento midiático na atuação apenas como apresentadora e cantora infantil.

    Seus relacionamentos, amores e vida pessoal se tornaram o conteúdo a ser consumido, e o centro do "xou". Quem não se lembra de publicações como a "Revista Caras", publicação indispensável nos revisteiros de consultórios médicos e escritórios, que quase sempre apresentavam a vida da "Rainha dos Baixinhos", com sua casa nova e  seu sonho de se tornar mãe. Um verdadeiro reality show que pauta nacional nos veículos de comunicação do Brasil. A exposição midiática teve seu auge quando o parto de Xuxa mereceu 10 minutos de cobertura em uma edição do Jornal Nacional, em 28 de julho de 1998.

    Afinal, quem ditou essa exposição, Marlene Matos, Xuxa ou Globo?

    O preço do  resgate

    Desde a consolidação do modelo de negócio de streaming de produções em vídeos , a Globo passa por um processo de reposicionamento no mercado de entretenimento em produção audiovisual. O grupo empresarial percebeu que a TV aberta e os canais de assinatura não são mais suas maiores fontes de arrecadação. Suas produções são agora voltadas pata consumidores do streaming, criou a plataforma Globoplay, percebendo que não resistiria com o surgimento de plataformas como o Netflix.

    Em 2022, Globoplay apresentou crescimento de 27% na base de assinantes e acima de 30% nas receitas no mesmo ano.

    Em dezembro de 2014 a Globo dispensou Xuxa após um vínculo de  quase 30 anos. A rainha dos Baixinhos não tinha mais audiência e perdia até para o desenho Pica-pau exibido na TV Record. Essa mesma Record a contratou e em 2021 a dispensou por falta de audiência, um fracasso reconhecido pela própria apresentadora.

    Agora, após anos de divórcio, Xuxa e Globo reatam uma relação que já  pode ser considerada um sucesso, visto que o documentário exibido no Globoplay aparentemente tem tido grande repercussão. Não se sabe ainda os resultados de faturamento e audiência do projeto, mas uma coisa é certa. O bode da sala e vilão da história é Marlene Mattos.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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