Os inimigos da Educação
Parece bom que continuemos dispondo de um Judiciário superior com lucidez para colocar um freio no volume dos disparates
Educação e formação de jovens dizem respeito a conceitos modernos. Nem sempre foi assim. Na Idade Média, o saber se reservava aos mosteiros; portanto, a poucos, enquanto o resto da sociedade, incluindo os nobres, se conduziam de acordo com exigências de ordem prática. No século XVII, na França, os jansenistas realizaram a primeira gramática da língua, reservando-se igualmente a gestão do ensino de acordo com os princípios da filosofia cristã e o desejo dos pais. Logo depois, os jesuítas assumiram a tarefa para o bem e para o mal. Legaram ânimos exaltados entre antigos alunos que aceitavam qualquer coisa menos a lembrança do que haviam sofrido em suas mãos. Como consequência, a Assembleia Nacional, no decorrer da Revolução, trabalhou com a ideia unânime segundo a qual, tão séria representaria a questão do magistério que suas atividades deveriam dizer respeito ao Estado, cabendo a este fornecê-lo laico e universalmente.
Sabe-se que no Brasil, por influência dos positivistas, defendeu-se a instituição da escola pública e gratuita, com vistas a uma melhoria das condições do povo. Não conseguimos ainda, diferentemente de outras nações, trabalhar com o sistema dos horários integrais, com as crianças usufruindo pela manhã e à tarde nas instalações de educandários, numa espécie de formação e ocupação, antes que alcancem a idade adulta. Este era um projeto de Darcy Ribeiro e Brizola com a construção dos CIEPs, onde se fornecia, inclusive, dentista, além de diversão orientada e boa qualidade no saber. Em seus governos, Lula tratou do tema, convencido de que uma nação necessita de sistemas educacionais diligentes e aperfeiçoados.
Contestações a semelhantes visões emanam cada vez mais de setores da direita, gente para qual, os que sabem se revelam suficientes, e os que não sabem, que se danem. São contra tudo, de sistemas de cotas à administração e sustentação de institutos de ensino. Daí surgem os planos mirabolantes, de antemão destinados ao fracasso: da privatização das escolas às escolas cívico-militares, cada uma mais digna de contestação do que a outra. No caso das cívico-militares, fixam-se numa noção de disciplina, esquecendo-se de que soldados se formam para a guerra; civis, não. Estes se destinam a convivência pacífica entre pares, devendo munir-se sobretudo de conhecimento e instrumental teórico para que se saiam bem de suas tarefas. Quanto à hipótese da privatização, partindo de Tarcísio de Freitas ou de Ratinho Júnior, fecham os olhos para a exigência da educação para todos, sem distinção de etnia e de meios financeiros.
Diante de tais exageros da estupidez, parece bom que continuemos dispondo de um Judiciário superior com lucidez para colocar um freio no volume dos disparates. De outro modo, na corrida para o futuro, caminharemos para trás. Sabemos que a realidade nos anda fornecendo situações de arrepiar. Esperemos que uma experiência acumulada cerceie excentricidades prejudiciais. Caso contrário, a insensatez prevalecerá e nos contaminará a todos.
* Ronaldo Lima Lins é escritor e Professor Emérito da Faculdade de Letras da UFRJ.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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