Os problemas não acabaram com a demissão de Silvio Almeida
"Se não houver provas, o caso muda de figura", avalia Alex Solnik
Talvez por ter sido divulgado também pelo portal Metrópoles, achei que o caso Silvio Almeida-Anielle Franco tem algumas semelhanças com o contencioso Dani Calabresa-Marcius Melhem.
Não os fatos em si, que no caso dos ministros não têm ingredientes tão eróticos, mas por serem amigos, terem afinidades, trocarem mensagens carinhosas e de repente alguma coisa acontece, os amigos viram as costas um para o outro, até que tudo desemboca num escândalo federal.
Tanto a Globo quanto o governo (o governo mais rapidamente) afastaram o acusado antes da conclusão do inquérito policial, para se livrarem da batata quente. Algum tempo depois, a vítima também foi afastada pela Globo. A emissora jamais vai admitir que foi por causa do escândalo, mas o fato é que nem Melhem, nem Calabresa trabalham lá.
Lula não podia deixar de demitir o ministro. Estava num beco sem saída. Numa sinuca de bico. Numa saia justa. A pressão foi tamanha, dentro e fora do governo, que, se ele não demitisse seria chamado de conivente de uma agressão sexual; tal como, ao demitir, foi acusado de ignorar a presunção de inocência.
O que precipitou a decisão do presidente foi a reação do ministro. Em vez de se defender como pessoa física, ele usou a estrutura do ministério para atacar a ONG Me Too Brasil, quer dizer, envolveu o governo num caso estritamente pessoal. A única forma de tirar o governo do caso seria limar o ministro a jato, que foi o que Lula fez.
Isso não quer dizer que seus problemas acabaram.
Do que se sabe até aqui, por meio de mensagens de WhatsApp trocadas entre eles, que estão circulando na internet, apesar do segredo de justiça, Annielle e Silvio eram bons camaradas, ambos petistas, ambos militantes de causas progressistas, ambos pretos, ambos jovens e bonitos, ambos ministros de um governo com que sempre sonharam.
A maioria das mensagens tem esse tom de cordialidade, camaradagem, admiração de um pelo outro, e impessoalidade, com exceção de uma, na qual Silvio escreve:
“Seu vestido é deslumbrante!”
É um elogio que extrapola os limites de uma relação profissional, mas também está longe de caracterizar alguma agressão, tanto é que Anielle não se sente agredida, ao contrário, agradece o elogio.
O ponto de ruptura da amizade, de acordo com o que se sabe até agora, foi uma reunião oficial, com mais de dez pessoas. Há uma foto. Anielle está sentada na cabeceira, à sua direita, Silvio Almeida e à sua esquerda o chefe da Polícia Federal, Andrei Rodrigues.
Segundo relatos de pessoas próximas a Anielle, ela teria lhes revelado que, a certa altura, Silvio teria colocado a mão entre suas pernas. Da boca de Anielle não se ouviu essa acusação.
Na matéria do Metrópoles que expôs o escândalo, o repórter Guilherme Amado, citando o relatório do Me Too Brasil, escreve ter havido “toque nas pernas”, além de mensagens e conversas libidinosas.
É evidente que uma ministra de Estado não abriria essa frente de batalha com outro ministro se não tivesse acontecido nada. Ou nessa reunião ou em outras situações. Não sabemos, só eles sabem. Tanto Lula, quanto eu, quanto a maioria dos brasileiros acreditamos no relato que ela fez aos amigos.
A Justiça, no entanto, não funciona assim.
A Polícia Federal já está no caso para investigar a notícia crime de importunação sexual. Assédio não é, porque Anielle não era subalterna dele.
A polícia trabalha com provas. Se não houver provas, não haverá condenação. E se não houver condenação, o acusado poderá processar sua desafeta por denunciação caluniosa.
Taí porque os problemas de Lula não acabaram com a demissão de Silvio Almeida.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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