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Ivan Guimarães

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Os “Terrenos da União” podem ser o início da reurbanização de nossas cidades?

É possível a partir da venda dos Terrenos da União resgatar uma face do projeto nacional sepultado pelo golpe militar? Como estaria nosso modernismo?

Masp (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

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Bolsonaro tentou e não deu em nada. Lula já anunciou três vezes e também nada aconteceu.  

A venda dos imóveis da União poderia ser uma grande fonte de recursos, de empregos e de uma nova vida para cidades feias, que foram vítimas de um urbanismo canhestro e sem sentido. 

Mas todas as tentativas trombam de frente com um inimigo invisível: o lobby da especulação imobiliária.  Ele atua em várias frentes e de várias formas. Dissimulado, descentralizado ou mesmo disfarçado. Está sempre onde precisa estar, do congresso nacional até as empresas e ministérios que possam interferir nos seus assuntos. 

Neste ponto da nossa história, onde somos obrigados a reconstruir o Rio Grande do Sul, devido aos nossos erros na sua urbanização, como a má ideia de ocupar as várzeas com prédios e asfaltos, temos o dever e a oportunidade de realizar a reurbanização do País.  Assim como as grandes cidades europeias se reinventaram após 1945 e a China fez da urbanização uma prioridade no seu ciclo de crescimento econômico, podemos aproveitar a urgência das mudanças climáticas para unificar nosso povo nessa ação que afetará a todos. 

O jornalista Raul Juste Lores, autor de “São Paulo nas alturas” exprimiu com clareza os efeitos dessa atuação sobre as cidades brasileiras. Focado em São Paulo, ele traça paralelos com a China de hoje e nos oferece uma visão do que fomos e do que nos tornamos. Nos anos 50 praticávamos um urbanismo modernista, inclusivo e democrático.  Como ele mesmo cita:  

“Na década dos 50, alguns imaginavam até que estaríamos assistindo ao nascimento de uma nova civilização nos trópicos, que combinava a incorporação das conquistas materiais do capitalismo com a persistência dos traços de caráter que nos singularizavam como povo: a cordialidade, a criatividade, a tolerância.” 

JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO E FERNANDO A. NOVAIS 

A ruptura democrática vivida em 64 destruiu nosso ainda novo modernismo e foi a genitora desse demônio que vem até hoje nos legando o pior da arquitetura e do urbanismo. Tchau FAU, oi POLI.  

Talvez o melhor exemplo desse contraste seja o parque do Ibirapuera, obra majestosa de Niemeyer e o prédio do Tribunal de contas do município TCM, sem dúvida inspirado no filme contatos imediatos de terceiro grau, que fez sucesso na mesma época. Uma nave espacial pousada nos jardins próximos ao Ibirapuera, sem nenhuma conexão com o local, do qual se mantem há dez metros de altura. 

E com os novos mandatários vieram também as novas ideias: prédios públicos grandes, exclusivos, financiados pelo erário, cheios de grandes vãos livres, como a sede do INSS na baixada do Glicério, a Fundacentro em Pinheiros, o campus da USP no Butantã e os edifícios do projeto Singapura. 

São provas vivas do que se tornou nossa arquitetura. De uma forma curiosa e pouco estudada, a geração de arquitetos que seguiu os modernistas dos   anos 50 (boa parte deles estrangeiros) não deu sequencia as suas ideias. As obras de concreto armado ganharam uma nova classificação, Brutalismo Paulista.  O MASP deixa o modernismo e se torna brutalista sem que nada tenha se alterado. 

 A construção de moradias em grandes conjuntos cada vez mais periféricos tornou as cidades em palco para viagens diárias de horas para se chegar ao trabalho.  

A nova Faria Lima representa bem esse ideal de segregação social, com edifícios suntuosos em que as janelas não se abrem e só tem acesso por carro, onde inexiste sequer um terreno destinado a moradia popular. Não há bancos, praças, cafés, arvores ou o que quer que seja. Somente pateos e saguões vazios, forrados de mármore e granito. 

Acredito que este tema é tao relevante que o Presidente deveria criar uma secretaria nacional exclusiva, que promovesse um diálogo entre arquitetos em busca de sentido para essa empreitada. 

E para começar bem, o primeiro terreno a ser posto no mercado seria no Itaim Bibi em São Paulo. Ao lado do parque do povo, esse terreno de 20 mil m2 (70% da Caixa e 30% do INSS) se for vendido deve render ao Tesouro até uns R$ 2 bi. 

Imagino quantos arquitetos gostariam de   participar de um concurso para um projeto de moradia popular nesse local. Um projeto do Minha Casa. Minha Vida singular. Há projetos inspiradores na China, em  Chongqing e Shenzhen, que nos mostram aquilo que já soubemos. 

Claro que confiar na Secretaria de Patrimônio da União - SPU – seria um erro. Afinal de onde menos se espera é que não seremos surpreendidos com algo de bom.  

Deveria ser uma coordenação com foco no sucesso da operação (estético, ideológico e financeiro) que  poderia mesclar metodologias tipo “solo criado” (CPACs), permutas e outros arranjos com o    apoio do governo municipal. 

Quando penso no papel do Estado na economia esse tipo de intervenção é a que me parece mais correta.

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