Pavão Bueno, um bicho difícil de engolir
É fato raro aquela criatura parar de matraquear. Sua verborragia é pedante e rasa. Haja tolerância! Dificilmente as palavras que lança ao ar poderiam ser chamadas de comentários. Os telespectadores são tratados como um magote de almas infantilizadas
É terrível que tenhamos de assistir aos jogos da copa por um monopólio televisivo privado, em canal aberto e, portanto, com acesso mais fácil para a ampla maioria do povo. A exclusividade da transmissão é obtida em negociações questionáveis com a FIFA e a CBF. Isso já suscitou muitas denúncias por corrupção e favorecimentos, além de sonegação fiscal milionária.
Por consequência, essa condição se torna bem pior quando temos de suportar os jogos serem narrados por uma espécie de boneco falante. Uma cria que resulta do casamento da caricatura com a cretinice, como diria Nelson Rodrigues. Esse o ponto que aqui será desenvolvido: a que grau chega o sacrifício para vibrar com a seleção brasileira?
É fato raro aquela criatura parar de matraquear. Sua verborragia é pedante e rasa. Haja tolerância! Dificilmente as palavras que lança ao ar poderiam ser chamadas de comentários. Os telespectadores são tratados como um magote de almas infantilizadas. É como se ele encarnasse um predestinado a direcionar os olhos, os ouvidos e os humores.
Um agravante é que suas vítimas não somos só os que assistimos às partidas. Como se incorporasse uma entidade mágica, ele distribui palpites e broncas, a torto e a direito para os jogadores, o juiz, e até para as torcidas presentes ao estádio!
Seu oráculo pode ir do protesto exacerbado ao elogio mais balofo. Da crítica irada à reconsideração. Depende de como, com quem e para onde a bola rola. Muitas vezes, suas invectivas são furadas; noutras, murchas.
Sua exaltação com a camisa amarelinha seria comovente, caso não forçasse tanto a barra para substituir o sentimento do torcedor.
Enfim, pode-se perguntar por que a sua presença privilegiada na telinha – sabe-se lá a que remuneração –, tem sido esticada por anos. O visual engomado e as banalidades que diz lembram um animador de auditório, sem graça.
Tais bobagens vêm com embalagem barata. Afrontam a inteligência. Tanto em relação ao futebol, quanto às outras encomendas que sua patroa lhe impõe. Obediente, o vistoso comentarista se esmera para inocular-nos em tom maior a sequência das novelas, os noticiários e outros produtos. Tudo entremeado com muitas emoções! No mesmo padrão global que o seu.
Recapitulando, essa estrela comunicativa transita entre a agitação melodramática e as frases vazias. Entre a mediocridade e o ridículo. A ostentação e o jogo baixo.
Se é assim, por que será que esse personagem falastrão – cuja fisionomia lembra a de um burocrata frustrado, se anônima fosse – foi escolhido para emprestar seu brilho a espetáculo de tamanha envergadura? Trata-se de uma dúvida cruel. O que acha disso o gentil leitor? A cordata leitora?
Ajustado em seus paletós engalanados, o campeão mal consegue disfarçar o deslumbramento consigo mesmo. Seus coadjuvantes são ornamentos. A vaidade e o tédio escorrem do vídeo.
Afinal, haja estômago para engolir esse pavão bueno.
Como o grande poeta Cazuza anunciava, visionário, "só não há perdão para os chatos"!
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PS.: Talvez a galvânica persona esconda outro lado da pessoa; algo como uma virtude camaleônica, guardada no banco. A ver.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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