Pelo fim da Escala 6x1
Uma luta por uma jornada mais humana e o impacto na saúde mental dos trabalhadores, que buscam garantir o direito ao descanso e à qualidade de vida
Por Clóvis Girardi* e Nicolle Drudi**
O modelo de jornada de trabalho 6x1 — no qual o trabalhador atua seis dias seguidos para ter um único dia de folga, que pode ser em qualquer dia da semana, não necessariamente aos domingos — representa um modelo de exploração que vem sendo cada vez mais questionado por movimentos sociais e trabalhistas. É uma estrutura que, longe de promover o desenvolvimento econômico, apenas contribui para o esgotamento físico e psicológico dos trabalhadores e maximizar lucros de empresas.
Imagine o cenário onde um trabalhador que cumpre uma carga horária de 12h às 20h, de segunda a sábado, sem contar o tempo no transporte público. Ele tem apenas um curto período de tempo para cuidar da casa, dos filhos, da alimentação, dos estudos, e apenas o domingo, único dia completo para encaixar o lazer, autocuidado, tempo de qualidade com a família, ter o mínimo de vida social, sair e ver os amigos etc. Não seria essa 'folga' mais uma pausa forçada do que um verdadeiro descanso?
O movimento VAT (Vida Além do Trabalho) fundado por Ricardo Azevedo, nasceu de uma organização de base feita principalmente pela Internet e tem na PEC da deputada Erika Hilton (PSOL) a materialidade da luta com a revisão da legislação. Passado o pleito eleitoral deste ano, que por essência discute mais as questões locais, a pauta ganha força de novo em todo Brasil e tem potencial para ser a maior mobilização de luta do povo brasileiro deste século - superando, inclusive, as jornadas de junho de 2013.
Está em jogo, além da redução da jornada, um processo de reestruturação produtiva num contexto de redução exponencial de postos de trabalho, avanço das inteligências artificiais e da mecanização da atividade laboral. Não haverá, num futuro breve, emprego para todos e, diante desta encruzilhada, nossa proposta não pode continuar sendo a de maior exploração. O fim da escala 6x1 deve levar a um aumento de contrações. Mais gente empregada, mais renda distribuída e com alguma qualidade de vida.
A busca por uma jornada de trabalho mais justa é, na essência, uma luta que se entrelaça com os direitos humanos e a busca pela justiça social. O equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal, que parece tão simples, é um verdadeiro desafio para muitos trabalhadores, principalmente os de baixa renda, que acabam sendo forçados a abdicar de sua saúde e qualidade de vida para cumprir uma carga horária desumana.
A situação é alarmante e está diretamente relacionada aos dados sobre a saúde ocupacional no Brasil, que reforçam ainda mais a urgência de mudanças. De acordo com uma pesquisa realizada pela International Stress Management Association (Isma-BR) em 2021, o Brasil foi o segundo país com mais casos de burnout, ou síndrome do esgotamento profissional. Em 2023, o Brasil registrou 421 afastamentos de trabalhadores devido ao burnout, o maior número dos últimos dez anos, conforme dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Essa condição foi reconhecida e classificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2022 como como síndrome ocupacional crônica, afeta trabalhadores de diversas áreas e se manifesta por sintomas emocionais, como baixa tolerância à frustração, agressividade, impotência, esgotamento, sentimento de fracasso e baixa autoestima e sintomas físicos e psicossomáticos, como fadiga, dificuldade de concentração, dores de cabeça, insônia, hipertensão arterial, dores musculares e taquicardia.
E não se trata apenas de estatísticas; trata-se da vida real de milhares de brasileiros que sofrem as consequências de um sistema que os desumaniza. O debate sobre a escala 6x1 traz luz a necessidade de uma revisão na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com o objetivo de diminuir a carga horária abusiva e implementar alternativas que garantam um maior número de dias consecutivos de descanso, sem redução de salário. Isso permitiria ao trabalhador uma relação mais saudável e satisfatória com sua atividade profissional, além de destacar a importância de criar políticas de proteção ao trabalhador, como o direito a férias regulares, licença parental, limitação de horas extras, entre outras medidas que promovam a saúde física e mental dos empregados.
É tarefa nossa, do campo progressista, seguir na luta pela aprovação da PEC e no diálogo constante com trabalhadores e trabalhadoras. Assim como é tarefa do governo Lula não repetir os erros do governo Dilma em 2013, aliar-se à luta da classe trabalhadora e encontrar um caminho para que seja aprovada a PEC junto de um conjunto de medidas que possibilitem a transição da jornada.
*Clóvis Girardi é planejador territorial e vereador eleito pelo PT em Santo André.
**Nicolle Drudi é psicóloga clínica analista do comportamento.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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