Petrobras é vítima do sistema financeiro internacional
"A quem interessa a privatização de ativos e a política de preços imposta à Petrobrás? Quem é beneficiado? Quem é prejudicado?", questiona o presidente da Associação de Engenheiros da Petrobrás (Aepet) e membro do Conselho Editorial do 247, Felipe Coutinho
A quem interessa a privatização de ativos e a política de preços imposta à Petrobrás? Quem é beneficiado? Quem é prejudicado?
Para que o petróleo e a renda petrolífera brasileira sejam transferidos para o sistema financeiro internacional, é preciso construir a ignorância sobre a Petrobrás junto à Opinião Pública brasileira. São cúmplices nesta tarefa, desde antes da criação da companhia em 1953, os meios de comunicação comercial de massa instalados no Brasil.
O Brasil e a Petrobrás são autossuficientes tanto na produção de petróleo quanto na capacidade de refino e abastecimento do mercado brasileiro de diesel e gasolina. As refinarias da Petrobrás têm capacidade de produzir diesel e gasolina para abastecer todo o mercado brasileiro. São adequadas ao processamento do petróleo brasileiro; em 2019, o petróleo produzido no Brasil representou 91% do total processado nas refinarias da companhia.
As refinarias da Petrobrás, além de adequadas ao processamento do petróleo nacional, são modernas e produzem combustíveis de alto padrão de qualidade. As refinarias foram modernizadas com investimentos bilionários no tratamento de derivados para redução do teor de enxofre no diesel e na gasolina. Assim como para aumento de capacidade e adequação dos materiais ao petróleo brasileiro.
Entre 1965 e 2018, foram investidos US$ 328 bilhões no segmento de Refino, Transporte e Comercialização (RTC) da Petrobrás, representando 31% do investimento total. Entre 1997 e 2018, foram US$ 137 bilhões (24% do total). Os valores estão atualizados pela inflação e correspondem a dólares de 2019.
A ociosidade das refinarias, de até 30% de sua capacidade, desde outubro de 2016, é consequência da política de preços adotada, desde então, pela direção da companhia. Foi denominada Preço Paritário de Importação (PPI).
Estes preços relativamente altos viabilizam (tornam lucrativa) a importação de combustíveis, na maior parte produzidos nos EUA, que ocupam o mercado da Petrobrás com a consequente redução do processamento do petróleo nas refinarias brasileiras e ociosidade de até 30% do nosso parque de refino.
O atual presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, declarou que seu sonho é a companhia privatizada. Estivéssemos em período de normalidade institucional, sendo os dirigentes responsáveis pelo sucesso dos órgãos sob sua direção, tal desejo seria motivo para substituição do gestor. Talvez até um processo de gestor infiel.
Pretende-se, neste momento, privatizar oito refinarias que respondem por 50% da atual capacidade de refino. Já foram entregues a terceiros, estrangeiros, a subsidiária para a atividade típica de todas as petroleiras, a distribuição, BR Distribuidora, além de gasodutos, terminais, fábricas de fertilizantes, participação na petroquímica e na produção de biocombustíveis. A tudo isso se acrescenta a alienação de direitos de produção em reservas de petróleo e gás natural.
Ou seja, se promove um fim esquartejado da maior empresa brasileira. As privatizações e a consequente desintegração da Petrobrás estão na contramão da tendência da indústria internacional e da crescente relevância das companhias petrolíferas estatais. As estatais já são 19 entre as 25 maiores empresas de petróleo e gás natural, controlando 90% das reservas e 75% das produções mundiais.
As vendas de ativos da Petrobrás não se justificam pela redução do endividamento e estão em contradição com o aumento da integração vertical e da internacionalização das companhias de petróleo, inclusive as estatais.
O que pode ser atribuído à venda de ativos limitou-se a 25,65% da redução da dívida líquida, entre o final de 2014 e o final de 2018. Cerca de três quartos (74,35%) desta redução teve origem na geração operacional de caixa da Petrobrás. Ou seja, a atividade rentável e eficiente da Petrobrás que está reduzindo o endividamento.
O somatório do lucro operacional do Abastecimento da Petrobrás nos anos de 2015, 2016 e 2017 registrou US$ 23,7 bilhões, em valores corrigidos para 2018, enquanto o E&P obteve US$ 9,4 bilhões no mesmo período, quando o preço do petróleo médio foi US$ 52,68 por barril.
As privatizações de refinarias, terminais, dutos e da distribuidora trazem prejuízos muito mais graves à resiliência e mesmo à sobrevivência da Petrobrás do que presumíveis benefícios pela redução dos gastos com juros, decorrentes da antecipação da redução da dívida.
Os ativos privatizados e o mercado brasileiro de combustíveis, de origem fóssil e de biocombustíveis, fertilizantes e petroquímicos estão sendo entregues às empresas e fundos estrangeiros que são controlados pelo sistema financeiro.
Os brasileiros pagam a conta, apesar de o país dispor de uma das maiores petrolíferas do mundo, ter grandes reservas de petróleo e capacidade instalada para refiná-lo no país com custos mais baixos que os Preços Paritários de Importação (PPI) adotados por decisão política inédita, a partir de outubro de 2016.
Mas o véu ideológico neoliberal impede que se veja e entenda o que se passa com esta empresa, orgulho dos brasileiros. Se você chegou até aqui, provavelmente resistiu aos argumentos apresentados porque não fazem parte do senso comum que é cotidianamente construído pelo capital estrangeiro e sua mídia.
Mas também é provável que se tenha desferido contra mim a falácia ad argumentum ad personam (ataque pessoal). Quando em vez de o argumentador provar a falsidade do enunciado, ele ataca a pessoa que fez o enunciado. “Se foi um engenheiro da Petrobrás que argumentou, trata-se de um corporativista, certamente é falso.”
“A verdade é filha do tempo e não da autoridade”, mas quanto tempo será necessário para revelá-la, e quantos de nós perecerão até lá?
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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